Almíscar
O lugar estava lotado, mas o cheiro de almíscar era inconfundível, champanhas borbulhavam nas taças de cristal, sorrisos de quem tem muito tempo ocioso e muito dinheiro no bolso vestiam grifes importadas. Deu-se uma confusão, gritos, alguém fora assassinado. Ele não conseguiu ver muita coisa, as pessoas corriam e alguém estava caído ao chão, o salão de festas da mansão virara um caos. A casa fora interditada para as investigações de praxe. E como era de se esperar nada fora descoberto, ou quem sabe algo fora encoberto.
Naquela noite ele não conseguiu dormir. Ao amanhecer chegando na redação viu o seu chefe nervoso na frente do prédio, haviam arrombado a porta na noite anterior, nada fora levado, mas o escritório estava uma bagunça, o cheiro de almíscar era inconfundível. Sua cabeça era um turbilhão, alguém estaria atrás dele?
Assim como as lembranças somem como a fumaça no vento, o cheiro do perfume também sumiu. Os jornais daquele mês só falavam do assassinato na mansão, mas nada mais do que ele não sabia. E ele sentia um desejo intimo de saber mais.
Nada fora encontrado ligando o assassinato e o arrombamento da redação, nada além do cheiro que parecia que só ele sentia.
Passaram-se duas semanas dos acontecidos e ele estava sentado num pub da Rua 15, a prateleira de bebidas do outro lado do balcão parecia hipnotizá-lo ou talvez algo além de seus próprios pensamentos. O relógio na parede marcava 11 horas da noite e o lugar estava quase vazio, a não ser por um bêbado sussurrando analogias no balcão e uma velha senhora sentada sozinha ao fundo do pub, ela tomava um Martini duplo. Ele não estava bebendo nada, só mastigando incansavelmente os amendoins da tigela comum. Quando a atmosfera do lugar recendeu a um cheiro característico ele pareceu acordar. Ela entrou com passos demorados, parecendo desfilar, sentou-se ao lado dele e pediu uma bebida, o nome é indiferente. Os olhos dele injetados, os dela verdes dissimulados, ela deu-lhe um beijo, somente um, esvaziou seu copo em um só gole, saio do pub sem pagar e não disse uma só palavra, ele ficou lá sentando, ninguém entendeu nada, mas o cheiro de almíscar era inconfundível.
Loise Clemente
Em: 30/05/08