O Imortal
Amacaballo comemorava seu 276º aniversário. Estava só em seu apartamento, um flat da 5ª idade, em um bairro nobre da cidade. Já perdera a conta do número de transplantes e implantes. A imortalidade era só uma questão de dinheiro. Isso, Amacaballo tinha aos montes. Empreendedor de sucesso tinha feito fortuna com neuro games. Mas isso foi séculos atrás.
Gerações de parentes e amigos, que não tinham dinheiro suficiente ou simplesmente não queriam viver tanto, se foram. Nas últimas décadas, o tédio começou a se acercar de Amacaballo. Praticante de XtremeSports, já tinha feito de tudo e morrera algumas vezes. Fora ressuscitado pela ciência.
Pensava em algo novo. Suicídio é bobagem; acidentes, já tive todos. Gostaria de ir para a guerra, mas não existem mais guerras. Até o crime acabou, depois dos implantes de chips nos bebês.
“No meu tempo não tinha isso Engraçado dizer no meu tempo”. Foram quase três séculos, de qual tempo estou falando?
A vontade de burlar, de cometer crimes, de ferir, prejudicar ou tirar proveito do outro foi extirpada do cérebro da pessoas, elas ficaram incapazes disso. Por outro lado, o suicídio é tão corriqueiro como se aposentar, é um direito do cidadão, ninguém questiona mais.
“E se eu virasse um criminoso?” Pensou. “Qual seria a sensação de morrer na cadeira elétrica? Será que daria para ressuscitar?”
As leis ainda existiam, assim como juizes e tribunais, embora só julguassem banalidades. E se eu matasse alguém? Foi dormir pensando no assunto.
No sábado o amigo ligou.
_Amacaballo, quero te convidar para a minha festa de despedida.
É. Esqueci de mencionar, a vantagem do suicídio é que podemos dar uma festa. É melhor que velório e sai mais barato. Além disso, a gente participa.
_Me deixa te matar, esse negócio de suicídio é bobagem.
_Você está louco? Está brincando comigo!.
_É sério, pode ser depois da festa.
Matou o amigo que ia se suicidar
Não havia mais detetives ou técnicas forenses. Fez uma denúncia anônima contra si mesmo, mas as autoridades classificaram como suicídio
Amacaballo se entregou à policia
Foi um choque para os juizes, achavam que aquilo não podia ser verdade. Um deles ponderou que, hipoteticamente, Amacaballo poderia ter matado o amigo, mas a revelação desse feito poderia trazer graves conseqüências aos bons costumes. Seria melhor abafar o caso. O ocorrido seria considerado um suicídio e Amacaballo seria internado como louco - sim a ciência ainda não conseguia impedir que o cérebro falhasse em algum momento da vida. Seria internado em uma instituição psiquiátrica.
_O que foi discutido aqui não poderá vir a público em nenhuma circunstância e nenhum de nós aprovará a alta de Amacaballo, nunca! Falou o juiz mais velho.
O tribunal julgou Amacaballo como louco e o condenou a internação em uma instituição psiquiátrica,.onde ele morreu de desgosto aos 311 anos.