A Matilha do Inferno

Era quase meia-noite, Herbert e os outros estavam no centro de computação esperando a ordem para atacar. Alguns jogavam em rede, aproveitando os poderosos computadores do instituto, outros colocavam a correspondência em dia e o restante simplesmente navegava pela internet procurando as bobagens de sempre.

Em 2792 praticamente toda a literatura estava digitalizada, somente algumas poucas obras em papel eram conservadas em museus. Uma vasta matriz de computadores interligados por redes de alta velocidade, com memórias quânticas de quartzo, armazenava todo o conhecimento humano.

As críticas eram ferozes, “a juventude está ficando burra, 92% dos jovens não sabe onde fica a capital da terra” diziam uns. O que esses críticos não percebiam é que estava ocorrendo um processo de formação de uma inteligência coletiva. A informação estava sempre disponível, e disponível para todos. Os sistemas de busca de informação eram , na verdade, sistemas de busca de conhecimento, que recuperavam informação estruturada, de forma jamais vista.

Herbert era um desses críticos. Ex consultor, especialista em sistema de armazenamento inteligente de informação, foi vítima de seu próprio trabalho; quase não conseguia serviços tal a eficiência dos sistemas que ele ajudou a desenvolver e implantar. Seu mentor, mestre Knutsen, também nutria os mesmos sentimentos. Knutsen era perito em teoria do caos, seus algoritmos computacionais permitiam previsões antes consideradas impossíveis.

O grupo, a Matilha do Inferno, do qual Herbert fazia parte e Knutsen era o chefe, se formou em uma comunidade do virtual life, mundo virtual holográfico de grande sucesso. Era um grupo anarquista radical, disposto a tudo para impedir o que eles chamavam de “maquinização do homem”.

Estavam ansiosos aguardando a decisão de Knutsen. Por medida de segurança, o ataque já fora programado e abortado várias vezes. Ninguém sabia ao certo quando ocorreria de fato.

Knutsen desenvolveu uma sequência de eventos (script) que causaria a queda do regime vigente, por meio do efeito borboleta. De acordo com a teoria do caos, o bater de asas de uma simples borboleta poderia influenciar o curso natural das coisas e, assim, provocar um furacão do outro lado do mundo.

Knutsen calculara que, nas condições iniciais corretas, alguns poucos eventos levariam à derrocado do regime como conseqüência de acontecimentos que se sucederiam em cascata. Os cálculos davam uns 85% de certeza, que era uma boa margem.

A idéia de Knutsen era penetrar nos sistemas de armazenamento e alterar alguns documentos chaves, entre eles a bíblia e a constituição da terra. Mudanças sutis, mas que levariam a outras. O sistema inteligente de busca iria se reconfigurar para levar em conta o novo “conhecimento” e assim ocorreria o efeito dominó. O alcance das alterações seria devastador já que o sistema jurídico legal seria afetado. Uma revolução virtual, com efeitos reais.

-­TRIMMMMMMMMM. O ringtone do século 20 tocou no IPFone.

­-Herbert falando.

­-A mariposa não vai voar hoje.

­-Pessoal, ainda não foi dessa vez! Vamos para casa.