Evitava caminhar sozinha, procurava os locais públicos em busca de abrigo na multidão. Não ousava encarar as pessoas e falava apenas o necessário. Mesmo assim vivia com mêdo. Entrou apressada em um elegante condomínio na Lapa . Turistas e cariocas haviam eleito o local da moda. Mas ela nunca saía .
 Cinco silenciosos anos a separavam do resto do mundo. 

Nem sempre havia sido assim, houve um tempo em que estava feliz e apaixonada. Casada com Marcos , viviam em Arraial do Cabo, uma cidade pequena na Região dos Lagos. Tinham as praias mais bonitas e a paisagem era deslumbrante. Todos os dias passeavam pela praia à noitinha, caminhando sem mêdo , fazendo planos e namorando . Marcos era bioquímico e trabalhava em uma grande indústria pesqueira local. 

Tudo começou quando percebeu que o marido estava diferente , ausente, olhos perdidos, quieto demais . Tentou conversar mas ele se esquivava, não saíam juntos nem faziam amor. O comportamento de Marcos estava irreconhecível. Começou a voltar muito tarde para casa e quando ela acordava ele já havia saído. Imaginou outra mulher mas soava tão estranho um homem trair a esposa aos 6 meses de casado, ainda em lua de mel. 

Passou a observar o marido com mais cuidado, ele usava a mesma roupa vários dias e depois jogava no cesto impregnando tudo com um odor horrível. Mudou a alimentação para latas de atum e doces em calda. Não comia nenhum alimento preparado por ela, começou a achar que ele estava louco. .
 
Um dia decidiu segui-lo na caminhada pela praia. Escondida nas sombras até ser arrastada em direção a beira mar. Estava com mêdo mas não conseguia emitir nenhum som. Imóvel aquele homem olhava o céu procurando alguma coisa , logo uma luz brilhante começou a sinalizar em algum código, ele reconheceu e ficou mais calmo. Pela primeira vez olhou a mulher e seus olhos eram duas bolas negras , ela estava paralisada, não consegui esboçar a menor reação, a cabeça doía e pensamentos estranhos começaram a surgir. Um pedido de desculpas, despedida, confusa demais, não suportou a pressão fortíssima na nuca e desmaiou. 

Acordou em um hospital bem equipado cheia de tubos e aparelhos. Uma enfermeira apareceu depressa e voltou a ser sedada. Semanas depois foi informada que estava em uma base militar que havia estado em quarentena mas estava fora de perigo. O marido havia sido enterrado em caixão lacrado sob várias camadas de concreto em lugar não revelado. Um vírus desconhecido havia sido a causa. Estranhamente ela havia sobrevivido. 

O helicóptero pousou no aeroporto onde foi deixada sem maiores explicações, tudo em sua casa havia sido destruído para descontaminar o local. Era uma mulher sem passado, fotos ou lembranças. Recebeu uma indenização muito alta do trabalho de Marcos e um cheque de mais de 1 milhão de reais do seguro de vida que não lembrava de terem feito. Dinheiro nunca mais seria uma preocupação. 

Meses depois havia comprado quatro apartamentos em lugares diferentes , inclusive fora da cidade. Irreconhecível com o cabelo bem curto, pintado de preto, sempre de óculos escuros só utilizava transporte coletivo ou táxi. Sua vida era uma mudança constante , não seguia nenhuma rotina, todas as suas casas estavam equipadas com equipamentos de segurança. 

Começou a receber emails com fotos do corpo do marido e cópias de laudos médicos. As fotos mostravam um homem envelhecido e disforme, a estrutura óssea deteriorada , nunca imaginou que um ser humano pudesse ficar de tal maneira, mas o pior ainda estava por vir. Documentos em papel timbrado das Forças Armadas relatavam que no dia da morte de Marcos uma chuva de meteoritos havia caído no local seguido de um apagão de 18 horas. Foram vistos milhares de objetos não identificados mas a mídia não relatou nada.
 
O último email avisava que sua vida corria perigo e era vigiada. Orfã e sem amigos conheceu Marcos no hospital onde era voluntária visitando pacientes terminais . Tão solitário quanto ela em poucas semanas estavam casados. A mudança para a casa de praia isolada e a proposta de emprego inesperada agora soavam estranho e oportuno. 

Era uma mulher sozinha, sem provas ou passado. Quem estava enviando as mensagens , qual a verdade sobre a morte de Marcos, por que estava sendo seguida ? Ela não sabia as respostas. Era um grande segredo e ela precisava sobreviver para um dia descobrir. Um segredo que corroía sua alma e tirava sua paz.
Giselle Sato
Enviado por Giselle Sato em 02/02/2008
Reeditado em 19/12/2008
Código do texto: T843887
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