CIDADE DE NOÉ
A cidade flutuava tranquilamente há quase mil anos. Impavidamente situada a mais de 500 quilômetros acima da superfície terrestre. Ela mantinha seus habitantes em segurança e longe de um mundo que já teve o nome de Terra.
Seus construtores a chamaram de Cidade de Noé.
Houve uma época na história da humanidade em que a coexistência pacífica entre as nações se tornou impossível. Os conflitos humanos terminaram por caminhar em direção a uma conflagração geral e apocalíptica. A Terra terminou por tornar-se inabitável para a raça humana.
Quando se tornou claro que a vida na Terra teria seus dias contados iniciou-se a construção da grande cidade estelar. Mais de uma geração se passou até que esta ficasse pronta. Os poucos recursos existentes foram utilizados para construir aquela que seria a arca que abrigaria o que restou da humanidade.
Mil e quinhentas pessoas viviam em Cidade de Noé. Começaram com seiscentos habitantes e em algumas centenas de anos, mesmo com um rigoroso controle de natalidade, a população aumentou.
A cidade agora se encontrava no limite da sua capacidade de auto sustentar-se.
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Em quase mil anos o espírito criativo dos seres humanos foi, de alguma maneira, obliterado. Vivendo em um ambiente de gravidade artificial, cercados da mais alta tecnologia, regido por regras rígidas, que objetivavam sempre a manutenção e a sobrevivência da pequena comunidade, as pessoas terminaram por desenvolver um estado de apatia.
Pesquisas cientificas e criação de novos padrões artísticos e estéticos tornaram-se algo muito raro. O que restou da humanidade havia perdido o potencial empreendedor. A curiosidade que nos havia levado às estrelas e às profundezas do átomo perdeu-se. A criatividade que havia criado uma Nona Sinfonia estava adormecida em algum canto escuro.
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A cada cinquenta anos sondas eram enviadas à superfície terrestre para verificarem a possibilidade da existência de algum ambiente propício à vida.
Por volta do ano 987 da existência da cidade, um dos dispositivos enviados detectou e mapeou uma área situada no continente africano com forte possibilidade de ser compatível com a vida humana.
Um misto de alegria, ansiedade e medo instalou-se entre os habitantes da pequena cidade orbital. Era previsível que, para pessoas que nasceram em um ambiente artificial, que foram criadas conhecendo a história da Terra apenas por vídeos e fotografias, houvesse muito medo e insegurança. Eles deixariam um ambiente, pretensamente seguro, para viverem em um lugar onde os riscos eram altos e o imponderável estaria sempre presente.
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Após reuniões e assembleias com um forte caráter dramático os habitantes de Utopia decidiram que era hora de finalmente deixarem a cidade.
Inicialmente cento e cinquenta pessoas desceram à Terra. Estavam encarregadas de explorar a região e preparar toda a infraestrutura necessária para quando as demais chegassem.
Haveria um longo processo de readaptação a um ambiente natural. Medos e conflitos com certeza surgiriam. Muitos pensariam em desistir, outros ficariam pelo meio do caminho, porém a nova jornada teria que prosseguir.
Milhões de anos atrás a África foi o berço da civilização humana. Novamente seria no coração do continente africano que a humanidade iniciaria uma nova caminhada.