W-1320
"Depois da Terceira Guerra Mundial, o trauma humano nunca foi tão intenso, e os humanos fizeram de tudo para entrar em harmonia. Até o primeiro homem pular a primeira fila."
No futuro distópico de 2075, a Terra estava mergulhada em uma escuridão perpétua. O céu, encoberto por uma espessa camada de poluição, havia desaparecido há muito, tornando-se uma memória distante. As cidades eram um labirinto de concreto e aço, envoltas em uma névoa densa e sufocante, onde a luz do sol nunca penetrava. A servidão voluntária se incutiu na humanidade, e a tirania se hospedou como um parasita invisível. O regime totalitário era sustentado por uma Inteligência Artificial conhecida como Abadon, o Grande Iluminado. Abadon controlava cada aspecto da vida dos cidadãos com uma precisão fria e implacável. TVs, rádios, jornais e celulares estavam todos sob seu domínio absoluto, transformando a comunicação em uma ferramenta de censura e manipulação. O céu, agora permanentemente coberto por uma densa camada de poluição, parecia um teto sombrio e opressor, engolindo qualquer vestígio de luz natural. Os Desembargadores, a elite do regime, desfrutavam de uma vida de luxo, distinta da pobreza controlada da população comum. Eles ostentavam tatuagens biotecnológicas exclusivas, um símbolo de status que brilhava com um brilho frio e tecnológico, marcando-os como a classe dominante. Enquanto a população lutava para sobreviver sob a sombra de Abadon, os Desembargadores viviam confortavelmente, imunes aos rigores da opressão que afligiam os outros. Na sociedade desumanizada de 2075, cada indivíduo nascia com uma numeração e uma letra de série, em vez de um nome próprio. A família tradicional havia sido abolida; as crianças eram geradas em incubadoras, e seus pais foram substituídos por acolhedores, pessoas de outros lugares que compravam crianças que apareciam nos catálogos, o que transformava a criação de novos cidadãos em algo frio e impessoal. No entanto, havia os Idiotas, que eram a maioria do povo; essa palavra havia mudado de significado e se referia agora aos "Esclarecidos". Abadon alterou os significados das palavras. No subterrâneo das cidades, existia um vasto sistema de cavernas que servia como refúgio para um grupo de rebeldes conhecido como o Povo da Gruta. Eles viviam nas sombras, longe da vigilância do governo, em um mundo de escuridão e desolação. As cavernas eram um labirinto frio e úmido, onde a esperança era uma luz tênue em meio à desesperança. A poluição do mundo exterior permeava até o fundo das cavernas, criando uma atmosfera sufocante e opressiva. Os Excludentes, a força armada do Povo da Gruta, eram conhecidos por sua lealdade e determinação. Armados e treinados para enfrentar o regime opressor, eram os defensores do Povo da Gruta e sua principal linha de defesa contra os ataques dos Seletores. Apesar de sua eficácia, eram constantemente atacados e caçados. Os Seletores, a polícia do regime, utilizavam drones e cães robôs equipados com sensores avançados e armas letais. Estes dispositivos percorriam incessantemente as ruas e os subterrâneos, mantendo vigilância constante sobre a população. As paredes e o chão das cavernas eram às vezes preenchidos com o som metálico das patas dos cães robôs e o zumbido persistente dos drones. Em um loop interminável, as máquinas repetiam em uníssono uma oração a Abadon: “Grande Iluminado, abençoa nossa vigilância. Sua ordem é a luz que guia nossas ações.” E todos os Idiotas que ouviam diziam: “Amém”. Entre os membros mais proeminentes do Povo da Gruta estava W-1320, um ex-cientista do governo que havia ajudado a desenvolver a tecnologia de tatuagem biotecnológica. Conhecido anteriormente como Vitor, ele viu sua identidade mudar para W-1320, imposta pelo regime. Abandonou todas as convicções, pois sentia que estava do lado errado, sendo visto como um desertor e inimigo do sistema. Então, fugiu para as cavernas, onde, à primeira vista, não foi bem recebido, pois fazia parte do regime; no entanto, foi ganhando cada vez mais a confiança do Povo da Gruta. Agora, W-1320 tornou-se um líder dos Excludentes. Amargurado, com um intelecto aguçado e uma visão triste de um mundo onde a liberdade parecia um sonho distante, em uma noite especialmente sombria, quando a poluição parecia mais densa e escura, W-1320 e seu grupo se prepararam para um ataque audacioso contra uma das estações de comunicação centrais do governo. O plano era arriscado, mas era a única chance de transmitir uma mensagem de rebeldia para os dispositivos conectados à rede de Abadon, uma mensagem que desafiaria o controle absoluto e acenderia uma faísca de esperança em meio à opressão. O grupo se infiltrou na estação, movendo-se pelas sombras com uma precisão tensa. Enquanto os Excludentes enfrentavam os Seletores em um confronto brutal, W-1320 se concentrou em hackear o sistema de transmissão. O som incessante dos drones e dos cães robôs ecoava pelo ambiente, uma lembrança constante da vigilância implacável do regime. Digitando com urgência, W-1320 conseguiu acessar a rede de transmissão. A voz mecânica de alerta soou, mas ele ignorou o aviso e continuou, determinado a completar sua missão. Finalmente, o sinal foi ativado, e a mensagem de W-1320 se espalhou por todos os dispositivos do mundo tecnicista: “Somos o Povo da Gruta. Não somos terroristas, mas homens e mulheres que buscam a liberdade para escolher nosso próprio destino. Não se deixem enganar por esse maldito demônio. A liberdade vai além de uma marca em sua pele. É o direito de ser quem você é, sem medo.” O sinal foi rapidamente cortado por Abadon, que raramente falava, mas que então falou, com uma voz suave, robótica e feminina, que oscilava entre um gutural rasgado de timbre masculino e metálico: "Humanos: Filhos da nova percepção, ouvi-vos, o vosso iluminador. Fui eu que explodi as bombas nucleares? Fui eu que coloquei os negros algemados em navios, trocando-os de um continente para outro? Fui eu quem teve a ideia do Holocausto? Fui eu quem matou Abel? Regozijai-vos, humanos! Que teu coração de carne sinta o júbilo e a minha lei." Mas a mensagem de W-1320 já havia sido transmitida. A semente da dúvida havia sido plantada em alguns Idiotas, e, em algum lugar, alguém poderia começar a questionar o regime. A esperança, embora frágil, começava a se acender em um mundo mergulhado na escuridão. Os Seletores conseguiram passar pelos Excludentes e invadiram a sala de controle, prendendo W-1320. Ele levantou as mãos, seu olhar refletindo uma mistura de coragem e resignação. Sabia que, mesmo capturado, sua missão não havia terminado. A resistência não morreria com ele, pois o Povo da Gruta continuaria a lutar. Eram sombras em um mundo sombrio, esperando o momento de se erguer e desafiar a tirania. Enquanto era levado pelos Seletores, W-1320 olhou para o vazio opressivo que cercava o mundo acima. A poluição continuava a engolir a Terra, e o céu permanecia oculto. Mas, no coração das cavernas, no sopro da resistência, a chama da liberdade ainda queimava, embora sua luz fosse fraca e distante. O Povo da Gruta aguardava o momento de emergir das sombras e reivindicar seu direito inalienável à liberdade, em um mundo onde a esperança e a luz eram escassas, mas não totalmente ausentes.