A Grande Farsa das Vidas Passadas: Fui de Arquiduque a Fundador do Corinthians em Três Sessões

 

     Em 2012, fui arrastado para uma aventura cômica e absurda conhecida como Terapia de Regressão. Eu, um materialista convicto, professor de Matemática e Física e estudante de filosofia, aceitei o convite de um colega exótico, Paulo Barbieri, para explorar essa jornada insólita. Paulo, um entusiasta de cristais e chakras, insistia que eu poderia retroceder até três vidas passadas para desvendar traumas e perrengues.

Inicialmente, rebati a ideia com lógica crua. "Nasci em 1978, fruto de uma relação sexual que culminou na fecundação do óvulo da minha mãe pelo esperma do meu pai em 1977. Como poderia retroceder a um tempo anterior à minha concepção biológica?"      No entanto, após um debate intenso e muitas risadas, decidi embarcar nessa experiência com um toque de ceticismo e curiosidade.

     Paulo e eu traçamos um plano: consultaríamos três terapeutas de regressão diferentes e compararíamos os resultados. O objetivo era testar a veracidade dessas terapias místicas. Cada terapeuta prometia viagens no tempo guiadas por técnicas poderosas e mentores espirituais. Os anúncios eram irresistíveis: "Reviva o que sua alma experimentou décadas atrás. Descubra quem você foi e o que deixou para trás!"

Terapeuta I: O Arquiduque da Áustria

     O primeiro terapeuta me levou a dezembro de 1863, na Áustria. Segundo ele, eu era um arquiduque, chefe do ramo cadete da Áustria. Minha vida teve um fim trágico em 28 de junho de 1914, em Sarajevo, e minha morte foi o estopim da Primeira Guerra Mundial. Em outras palavras, eu era Francisco Ferdinando! Essa revelação grandiosa foi minha primeira vida passada.

Terapeuta II: O Fundador do Corinthians

     O segundo terapeuta me transportou para 1910, onde eu era um humilde alfaiate em São Paulo. Junto com amigos, fundei o Sport Club Corinthians Paulista. Sob a luz de um lampião, na esquina das ruas José Paulino e Cônego Martins, eu, Miguel Battaglia, declarei: “O Corinthians vai ser o time do povo e o povo é quem vai fazer o time”. Confesso, quase chorei de emoção ao descobrir que eu fui o fundador e primeiro presidente do Corinthians.

Terapeuta III: O Gênio da Física

     O terceiro terapeuta revelou que, por volta de 1900, eu era um brilhante cientista alemão. Nascido em uma família de juízes, cientistas e teólogos, trabalhei em várias universidades e desenvolvi a teoria quântica ao lado de Albert Einstein e Niels Bohr. Em 1918, recebi o Nobel de Física como Max Planck.

     Três terapeutas, três vidas passadas completamente diferentes. Arquiduque, alfaiate e cientista, cada um com sua própria narrativa gloriosa. A inconsistência foi hilária e reveladora. Como poderia eu ser três figuras históricas distintas em vidas passadas quase simultâneas?

     Paulo Barbieri, também não ficou para trás. Após submeter-se às mesmas consultas, seus resultados foram igualmente grandiosos e variados.

Terapeuta I: O Faraó Egípcio

     De acordo com o primeiro terapeuta, Paulo viveu no Egito Antigo como um faraó poderoso e reverenciado. Governou com sabedoria e construiu monumentos que desafiavam o tempo. Seu nome era Tutemés, e ele era conhecido por suas reformas religiosas e políticas inovadoras.

Terapeuta II: O Samurai Japonês

     O segundo terapeuta afirmou que Paulo foi um samurai destemido no Japão feudal. Seu nome era Hideo e ele serviu ao shogun com lealdade inabalável. Foi um estrategista brilhante e participou de batalhas épicas que moldaram o futuro do Japão.

Terapeuta III: O Poeta Romano

     O terceiro terapeuta revelou que Paulo era um famoso poeta romano, aclamado por suas obras líricas e seu impacto cultural.      Ele era Publius Ovidius Naso, mais conhecido como Ovídio, cujas poesias continuam a ser estudadas e admiradas até hoje.

Três terapeutas geraram resultados diferentes para mim e Paulo, cada um mais glorioso do que o outro. Arquiduque, alfaiate, cientista, faraó, samurai e poeta, nossas vidas passadas eram um desfile de grandiosidade e improbabilidade. A experiência deixou clara a farsa. Parece que, em vidas passadas, todos somos figuras históricas impressionantes, nunca um humilde serviçal ou um escravo. E assim, concluo este experimento com uma única palavra: charlatanismo.

 

Jeferson Santos Albrecht
Enviado por Jeferson Santos Albrecht em 27/07/2024
Reeditado em 27/07/2024
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