A Escolha
Capítulo 01:
O som do despertador ecoando, juntamente com uma voz, revelavam o início de uma bela manhã. Os raios de sol radiavam e brilhavam através das cortinas da janela, iluminando aquele quarto pequeno em tamanho, mas grande em aconchego. Fotografias de família; rostos alegres; um chão de madeira rústica; um teto lindamente detalhado de ouro e uma pequena cama para um pequeno homem transmitiam um ar de familiaridade, ainda que fosse sua primeira vez ali. A voz do princípio, entretanto, aumentava.
- Daniel... Daniel... Acorda... - a voz tinha dono; uma pequena menina tentava o acordar. Sem sucesso, balançada aquele que dormia com suas pequenas mãos. - Da... Ni... atrasad...
- Daniel! Daniel, acorde agora! - outro som doutro dono. Estridente e fino, mas perfeitamente rígido -, se você não ouvir sua irmã, eu vou aí te acordar!
O menino então levantou-se com uma destreza impensável para alguém que dormia há poucos minutos. Agora, os sons lentamente aumentavam de intensidade e variedade: mais vozes mais altas, sons de máquinas e homens que faziam suas tendas em nome de seus donos: era o som da Cidade Alta. Não precisa gritar num dia tão especial, pensou com razão. A rapidez com que levantara e o turbilhão de pensamentos que invadiram seu consciente deixaram-no tonto, quase caindo na cama novamente. É hoje. Quase não dormi. Será que Ela já escolheu? Será que nos veremos de novo? Será? Será se vou ou fico? Até porque, hoje é o-
- Grande Dia! Grande dia! - o grito da menina calou os pensamentos de Daniel; de volta a realidade, dizia para si ao abaixar sua cabeça.
- Sim, Isabel... - lentamente um sorriso era formado -, mas você parece mais animada que eu. Eu sei que é importante, mas já sei onde quero ficar e o que quero receber. Temos um nome nobre, lembra? Podemos escolher; pior se fôssemos da Cidade Baixa... aquele lugar sujo de graxa e carvão, dizem que as pessoas imploram por um mísero pedaço de pão. Não se aproxime de lá... - subitamente, quando ia completar a frase, algo veio a sua mente: um daqueles pensamentos inexoráveis; uma ideia fixa... aquilo deve ter sido um engano...
- Eu sei! Mamãe já disse sobre se aproximar da Baixa, e é claro que fico mais ansiosa que você! Hoje é o dia que muda tudo! Tudo! Imagine, meu irmão, você indo para a Catedral como um Perdido e voltando para casa como um Escolhido! Com certeza te darão um belo androide! Vai ser demais, tenho certeza de que Ela também escolherá igual a você..., mas..., mas... e se você não... for escolhido... eles vão...! - Isabel já não conseguia formar frases, sua ansiedade tinha tirado a sua razão e seus pequenos olhos enchiam-se de lágrimas.
- Os robôs...
- O que têm eles?
- Nada! Eles não vão fazer nada comigo! - Rindo, Daniel mexia nos cabelos da irmã e caçoava da ansiedade dela, como sempre aconteceu.
As risadas ecoavam nas paredes da casa e alegravam o ambiente; o casal que observava da sala de estar se aproximava da conversa. “Daniel, meu filho...” o homem dizia, “você vai conseguir, garoto, te criei para isso! Vão te dar o melhor Androide...”. “Não ouça seu pai, Daniel. Você precisa se concentrar e responder as perguntas com sinceridade, vamos te amar não importa o que te derem!”, a outra mulher complementava. Apesar das preocupações, o clima era festivo, não somente ali, mas em toda Cidade Alta, pois o Dia do Recebimento havia chegado. Contudo, talvez essa foi a última manhã que as paredes ouviram tão belo som duma boa risada.