A Fenda Além do Abismo

Aquablanca. Cidade localizada entre montanhas áridas e escarpadas, permanece como um resquício de sua grandeza anterior. Suas ruas esquecidas e poeirentas se espalham entre construções abandonadas, testemunhas silenciosas de um passado remoto. Poucos se arriscavam a permanecer ali, a não ser os operários da mina de esmeraldas, a derradeira fonte de vida e sustento naquele lugar solitário.

Foi nesse local quase deserto que Marcus, um jovem determinado a um novo recomeço, encontrou seu destino. Seus olhos, que misturavam inquietude e cautela, captavam cada detalhe daquela paisagem desoladora. Avançando com passos firmes, porém hesitantes, ele se encaminhou para a entrada da mina, onde seria recebido pelos seus futuros companheiros.

O início do dia de trabalho começou com a sensação de sufoco das profundezas da terra. Marcus se juntou a um grupo de trabalhadores experientes, preparados com capacetes de luz, ferramentas e artefatos explosivos; eles se preparavam para adentrar os recônditos escuros da mina.

Durante a descida pela estreita galeria, foi possível notar uma tensão física entre os funcionários, uma mistura de expectativa e ansiedade diante do desconhecido que os aguardava. O novo integrante do time ficou encarregado de carregar a carga adicional, para uma eventual segunda explosão, sentia o peso da responsabilidade em suas mãos.

A explosão controlada, que deveria ser o acontecimento principal do dia, tomou rumos inusitados. O som foi assustador e a galeria se abriu de maneira aterradora, rompendo a conexão com a superfície e deixando-os completamente isolados.

Surpreendentemente ilesos, o grupo iniciou uma jornada desesperada em busca de uma saída. Se depararam com uma fissura enorme e encoberta por musgo verde brilhante, um portal sobrenatural para outra realidade. Sem opção, adentraram esse novo mundo, foi possível observar uma floresta tão retorcida quanto os medos dos trabalhadores. As árvores, com troncos tortos, se entrelaçavam formando um bosque denso e com uma luz verde etérea, como esmeraldas vivas.

A vegetação exalava um brilho estranho e encantador, mas mesmo sob essa beleza, o medo imperava. Insetos verdes e radiantes dançavam entre as folhas verdejantes, exibindo um brilho alucinante nas asas. A cada movimento, a luz da floresta mudava, transformando sombras em cintilações brilhantes que aceleravam o coração dos trabalhadores.

O solo, coberto por uma vegetação bioluminescente, irradiava um brilho suave, enquanto o ar se enchia de um aroma doce e penetrante. Esse ambiente retorcido, tanto vivo quanto soturno, era um labirinto de paradoxos, em que o belo se misturava ao medo, e a curiosidade enfrentava o instinto de fuga.

Os dias se arrastavam naquele lugar inusitado e angustiante. Sentiram-se vigiados, suas mentes ficaram perturbadas pela presença daqueles seres brilhantes. Depois de se alimentarem dos frutos das árvores luminosas, a fome, a sede e o cansaço desapareceram completamente. Andavam sem rumo, evitando a atenção atenta dos insetos e a sensação de estranheza que crescia.

Enquanto exploravam os cantos mais profundos em busca de uma saída, os membros do grupo foram desaparecendo, um a um, deixando Marcus cada vez mais isolado. A solidão era sua única companhia. Sentia como se partes de sua própria essência se unissem com o ambiente desconhecido. A cada passo, a fronteira entre sua identidade e o mundo ao redor parecia diluir-se, uma sensação simultaneamente fascinante e aterradora.

Em suas explorações mais profundas, deparou-se com símbolos enigmáticos entalhados nas paredes e no chão de pedra. Eram inscrições que remetiam a alguma entidade cósmica, algo antigo e além da compreensão humana. Deparou-se com estátuas peculiares que representavam seres inimagináveis, quase deuses, cuja presença parecia extrair a vitalidade de seus companheiros. Esses, que agora estavam amarrados por correntes, presos em cada uma dessas imagens.

Em meio àquele ambiente desconcertante, uma fenda deslumbrante e púrpura se delineava no centro, como um portal para um destino incerto, evocando uma escolha crucial para Marcus. A atração magnética daquela passagem era inegável, uma força que parecia puxar não apenas sua curiosidade, mas também uma parte oculta de sua própria essência. A luz púrpura pulsava, desenhando padrões hipnotizantes no ar ao redor, alimentando a tentação de explorar o que se escondia por trás dela.

Contudo, mesmo diante dessa sedução perturbadora, sentiu um perigo latente. Com um misto de coragem e inquietação; tomou a decisão de agir. O peso da responsabilidade ecoava em seu peito enquanto ativava a carga adicional de explosivos; um gesto decisivo.

O estrondo reverberou pelo ambiente, estilhaçando a serenidade aparente e fragmentando a estrutura da fenda púrpura. Estilhaços de luz dançaram no ar. O caminho para o desconhecido fora bloqueado, mas o que isso implicava para seu próprio destino ainda permanecia nublado.

Marcus olhou para trás, para a fenda púrpura agora fragmentada, e compreendeu a magnitude de sua escolha. Seu coração, ainda pulsando com a energia da decisão; ao deter a ameaça do portal, havia protegido não apenas a si mesmo, mas também impedido que a escuridão daquele mundo distorcido cruzasse a fronteira entre realidades.

Ao retomar seu caminho por entre as árvores retorcidas, finalmente encontrou uma saída daquele submundo. No entanto, essa não era a mesma superfície da qual se lançaram. Ele emergiu em um novo mundo, uma realidade exuberante e etérea, tão bela quanto irreal, onde a vegetação exalava cores vivas e a atmosfera era impregnada de uma serenidade quase mística.

Fernando Mazetti
Enviado por Fernando Mazetti em 15/02/2024
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