A Saga de Godofredo Parte II – “Santos Dumont”
27.04.23
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Janice falou com várias pessoas que trabalhavam com neurociência e informática, expondo o seu plano. Chegou a uma pesquisa no exterior, na Suíça, na qual mapeavam e dimensionavam as interações entre os neurônios via impulsos eletroquímicos.
Nessa pesquisa, os neurocientistas aproveitaram um ramo clássico da matemática de uma forma totalmente nova para avaliar a estrutura de nossos cérebros. Por meio da topologia algébrica, descobriram que o principal órgão do sistema nervoso está cheio de estruturas geométricas multidimensionais e pode operar em até 11 dimensões.*
Ficou estupefata, pois poderia tentar se comunicar com Godofredo por uma destas dimensões cerebrais.
Determinada e empolgada, conseguiu o contato pela internet do pesquisador suíço, descrevendo na mensagem a situação do seu marido e a sua ideia. Aguardava retorno.
Também, se tinha no Brasil equipamento com capacidade suficiente para efetivar os cálculos necessários para o desenvolvimento do sistema, um supercomputador.
Ela estudou na Universidade de São Carlos e procurou o seu orientador na época da elaboração da sua tese. É especialista em supercomputação, para saber se havia este equipamento, como também, para ajudá-la no desenvolvimento do seu projeto. Ele ficou entusiasmado com a proposta e disse que trabalharia com os seus alunos de pós-graduação na elaboração do programa coordenado por ela.
A única dúvida era se haveria tempo suficiente para executar e aplicar o sistema, pois o coma de Godofredo poderia durar dias, meses ou anos. Foi conversar com o neurocirurgião que acompanhava o caso de Godofredo no hospital.
-Bom dia Dr. Luís, tudo bem? Já entrei em contato com várias pessoas da área de programação de sistemas, com o orientador na universidade em que fiz meu doutorado, e principalmente com o pesquisador suíço, também neurologista, que está mapeando o cérebro humano com uma nova tecnologia – topologia algébrica, aguardando retorno.
-Sim, muito interessante! Eu li o artigo e achei notável a descoberta. Também, há o trabalho associando a neurociência com a informática, para desenvolver eletrodos estimuladores capazes de ativar áreas específicas do cérebro ou de coletar informações da atividade de certas regiões e relacioná-las a músculos específicos. Vou lhe passar o contato – respondeu o médico.
-Tenho uma questão com relação ao estado de Godofredo. Existe uma previsão de quando ele poderá sair do coma? A indução pode ser suspensa ou não? Essas dúvidas condicionarão o desenvolvimento do programa, pois ele demandará certo tempo, no mínimo de trinta a quarenta dias para se montar o diagrama e depois mais o mesmo prazo para os cálculos.
-Janice, sua pergunta não tem resposta definitiva. Ele pode acordar amanhã ou daqui a 10 anos. Impossível de prever. A indução será suspensa quando as funções vitais do cérebro estiverem sem estresse, ou seja, com o trauma totalmente absorvido pela estrutura cerebral. Por isso, Godofredo está sedado e em hibernação profunda para a sua proteção. Por enquanto não há como retirá-lo da indução.
-O que o senhor acha da proposta do sistema? Valerá a pena? O hospital poderá futuramente, caso tenhamos sucesso, utilizá-lo em situações semelhantes?
-Comentei com a Diretoria e acharam muito interessante a sua ideia. Mas, para participar do desenvolvimento, precisariam avaliar o programa, a configuração e os objetivos, e principalmente os custos. Faça o seguinte, monte o plano do programa e me encaminhe para avaliá-lo previamente – respondeu o neurologista.
Janice, mais empenhada ainda em desenvolver o sistema disse junto ao leito de Godofredo:
-Eu vou conseguir meu querido, com certeza!
Alguns dias depois recebeu o retorno do médico suíço, disposto a dar todo apoio ao projeto, inclusive com o que já tinha desenvolvido em programação, algoritmos e demais processos de engenharia computacional, para elaborarem conjuntamente o sistema.
Também, seu orientador na universidade pesquisou se havia no país supercomputador para processar esses cálculos, e chegou ao “Santos Dumont” instalado no Laboratório Nacional de Computação Científica – LNCC em Petrópolis no Rio de Janeiro , que iria apoiar a pesquisa e desenvolvimento do sistema sem custo, pelo interesse social que o programa teria.
Dr. Luís passou o contato do neurocientista que estava desenvolvendo os eletrodos, ela conversou com ele, que também se entusiasmou com o projeto e participaria e forneceria os dados que possuía , ajudando na elaboração do sistema.
Agora, era começar a montar o programa o mais rápido possível e colocá-lo em prática.
-Mãos a obra! – disse para Godofredo, acariciando o seu cabelo.
Godofredo, alheio ao que acontecia a sua volta , mantinha-se em sono profundo e tranquilo.
*Projeto “Blue Brain” liderado por Henry Markram, neurocientista do instituto EPFL na Suíça.
Nota do Autor:
Obra ficcional e qualquer semelhança é mera coincidência.