Os senhores da Grande Nuvem
Após alguns anos de cuidadosa pesquisa xenoarqueológica no planeta Setana-mara, na Grande Nuvem de Magalhães, Jawad disse que estava pronto para a mostrar o corolário de seus esforços.
- Provavelmente, é a descoberta mais importante já feita sobre os misteriosos senhores desta galáxia anã, os ten-nivali - afirmou sem modéstia.
- Você dedicou toda a sua vida a esse projeto; - redargui - não consigo imaginar que outra pessoa pudesse concluir este trabalho.
- Não é ainda uma conclusão - teve que admitir. - Está para mais para um começo, na verdade.
E como eu o encarasse intrigado, ele me convidou a tomar um elevador e descer até as entranhas do planeta, mais de dez quilômetros abaixo da superfície. Ali, os ten-nivali haviam construído um enorme complexo subterrâneo, com grandes cavidades repletas de maquinaria que outrora deveriam cumprir algum propósito que ainda não havíamos sido capazes de decifrar completamente. A importante descoberta anunciada por Jawad, contudo, estava isolada numa pequena sala vazia, flutuando placidamente no centro da mesma: lembrava uma bola de basquete, feita de ouro, e brilhava suavemente na obscuridade reinante. Um pouco à frente da esfera suspensa, havia dois cilindros de pedra negra e polida, com uma depressão no topo, em formato de uma impressão palmar, mas com apenas três dedos, incluindo o polegar.
- O que é isso? - Indaguei.
- Se minhas conclusões estiverem corretas, - relatou Jawad, muito compenetrado - isto é o equivalente ten-nivala de uma lâmpada mágica.
Ergui os sobrolhos.
- Uma fonte de iluminação não convencional ou alimentada de modo não convencional, quer dizer?
Ele fez um gesto negativo.
- Me refiro ao objeto das lendas da Mil e Uma Noites - afirmou. - Aquele que realiza desejos.
- E como chegou à esta conclusão? - Inquiri, braços cruzados.
- Todas estas complexas instalações subterrâneas, - prosseguiu Jawad - parecem girar em torno desta saleta com a esfera de ouro. Conseguimos traduzir alguns dos documentos deixados, e eles falam de um esforço que durou séculos para chegar até este objeto: um materializador de pensamentos.
- Bastaria então pensar em algo para que o aparelho o tornasse realidade?
- Em princípio, seria isso, mas a realidade não é tão simples. Se interpretei os textos corretamente, os ten-nivali precisavam de algo ou alguém com a frequência cerebral adequada para operar o equipamento. E, na verdade, nunca o encontraram. Ao menos, não aqui, nesta galáxia.
- Tendo em vista que parecem ter se extinguido, a busca parece não ter tido êxito, Jawad - repliquei.
Ele me encarou com uma expressão triunfante.
- Nazim, passei anos estudando a esfera de ouro e agora posso afirmar: ela está ajustada para a frequência cerebral de um cérebro humano!
- Como pode ser isso? - Questionei. - Levando-se em conta que levamos milênios para chegar até esta galáxia...
- Justamente! - Exclamou. - Eles foram à Via-Láctea milênios antes que saíssemos dela, em busca de seres inteligentes que pudessem se adequar ao seu projeto; e talvez não tenham nos encontrado, ou porque ainda não existíamos, ou porque não tínhamos ainda alcançado o estágio da viagem interestelar. De qualquer forma, eles devem estar ainda à procura...
Balancei a cabeça, consternado.
Os ten-nivali continuavam à nossa procura, provavelmente sem saber que existíamos. E nós, tínhamos descoberto o seu segredo mais bem guardado.
E o que iríamos fazer agora, de posse deste segredo?
- [04-08-2022]