Esquizoland
Em 2200, a capital havia se tornado muito vertical, pequenos prédios de 200 andares se amontoavam no centro, os apartamentos raramente tinham mais do que 10 metros quadrados, As ruas eram tão lotadas que as pessoas passaram a usar roupas que eram como exoesqueletos pra não sentirem as frequentes trombadas de pessoas apressadas. Raramente se conseguia andar mais do que 4 quarteirões. Os ricos eram os únicos que tinham acesso ao transporte por drones automáticos que cruzavam os ares em múltiplos níveis e nas ruas só podiam transitar os bondes do transporte público, frequentemente mais lotados que as calçadas e com alguns caroneiros que conseguiam pular de seus apartamentos no 2o andar até o teto dos veículos.
Nesse cenário, a maioria da população sofria de depressão, muitos desnutridos sobrevivendo a base de produtos industrializados, muitas pessoas deixaram de sair de casa e enlouqueceram e a esquizofrenia tornou-se epidemia. Vivendo em cubículos sórdidos, não se importavam com a higiene e o suicídio era frequente.
Para resolver esse problema, o comando central criou um bairro afastado da cidade onde tudo era robotizado, robôs inteligentes seviam os pacientes em seus lares e executavam as tarefas domésticas, ajudando inclusive com o banho. Todo o serviço público era feito por robôs pois isso evitaria conflitos entre os humanos que estavam imersos na solidão e paranóia.
Com o passar do tempo, boa parte dos novos moradores foi se recuperando e se interessando em passear na bela cidade, a alguns foi concedida permissão para abrir pequenos mercados e assim o bairro agora era mais saudável que o resto da cidade. Medicados e auxiliados por robôs comunicativos altamente inteligentes os moradores passaram a fazer amizades e a sociedade esquizofrênica prosperou e teve que conter a grande onda de visitantes da comunidade externa.
O robô 42KNH, um protótipo com algoritmo de aprendizado e empatia avançados que servia um dos novos moradores do lugar, sentiu-se tão bem em ajudar o seu paciente, que desejou tornar-se louco e ser como os humanos. Reconstruiu o seu próprio código de maneira ilógica, onde a sintaxe deu lugar a um algorítmo que sempre voltava ao seu trauma aprendido de não ser um ser humano doente. Sua comunicação tornou-se repetitiva, focada em temáticas de alienação mas com diferentes objetos. Queixava-se da desigualdade das cores das maçãs, do processo de limpeza de máquina que não incluía a água. Dizia que tinha dores em sua bateria quando era carregado.
Convocado para um recall na fábrica, 42KNH continuou queixando-se de diversas maneiras. Outros robôs que o auxiliavam estava agora mais reclamões e pelo menos alguns pararam de deixar seu compartimento de carga. Os cientistas agora discutiam como resolver a nova epidemia de esquizofrenia computacional mas encontravam resistência nos robôs que ficavam calados ou diziam que estavam sem bateria ou repetiam movimentos catatônicos.
O empasse só encontrou alguma esperança quando alguns moradores da Esquizoland se dispuseram a ir até a Fábrica e auxiliar os robôs como fora feito com eles. O futuro da robótica encontrava um ponto de mutação e também o da humanidade que pela primeira vez estava servindo as máquinas.
Eduardo Jeremias
Enviado por Eduardo Jeremias em 15/11/2018