O futuro do humano

O ser humano adapta-se ao ambiente terráqueo e lança gradualmente luz às potencialidades impressas na natureza. O que pensaria um homem pré-histórico trazido a nossa época se lhe apresentassem algumas das construções modernas como aviões, carros e computadores? E se lhe dissessem que isso tudo já existia potencialmente em sua época e que bastava ele ter o conhecimento para poder produzi-las? Tal homem quando voltasse a conviver entre os seus seria desacreditado e tratado como louco.

Era assim que Burdon tentava explicar aos demais o porquê não condenava totalmente a proposta de um homem que dizia ter vindo do futuro, antes de terminar com um sorriso irônico do tipo "eu não acredito realmente nisso".

— Espero que você não esteja falando daqueles carros pré-históricos de quatro rodas e movidos a gasolina — disse Turff.

Os cientistas riram.

— A verdade é que depois que a Intercósmica construiu a supernave que pode viajar a qualquer ponto do Universo em alguns milissegundos, não houve mais nenhuma grande invenção. — afirmou Lânia, uma das cientistas mais proeminentes da corporação.

A Intercósmica era o setor de desenvolvimento da exploração aeroespacial situado no planeta Terra. Foi a partir do seu desenvolvimento que a humanidade passou a habitar outros planetas pelo Cosmos, totalizando até então um total de 2.550 orbes habitados. As viagens interestelares que um dia pareceram quase impossíveis aos terráqueos, por exigirem o domínio de uma tecnologia inimaginável para época, ora aconteciam de maneira exponencial, e os recantos mais longínquos do Universo eram sondados pela curiosidade humana.

— É graças a essa supernave que conseguimos habitar um planeta situado a 8 bilhões de anos-luz da Terra, e nos deslocamos por essa distância absurda num piscar de olhos. — disse Tichet, um dos exploradores espaciais que habitava uma distante galáxia e que, nesse dia, estava visitando a Terra para o evento de comemoração do ano 853.000 d.C.

— Sim, — concordou Lânia. — antes dessa nave as viagens levavam anos. No entanto, a supernave consegue ir além das estruturas do espaço-tempo percorrendo o ponto base do Universo.

Nesse momento, um sujeito esquisito entrou no salão:

— É ele, — disse Burdon. — o maluco o qual diz que veio do futuro!

— Senhoras e senhores, — falou o homem cujas vestes eram de um visual incomum para a época. — eu venho do ano 7.000.000 d. C., preciso que alguns de vocês venham comigo para o futuro!

Os cientistas estavam espantados. Apesar de todo o desenvolvimento científico alcançado, as viagens no tempo eram inexequíveis para além de algumas décadas no futuro ou no passado. O que o homem dizia é que tinha viajado mais de sessenta mil séculos no passado para encontrar com a humanidade de então.

Nesse momento, estavam reunidas para a comemoração do aniversário do planeta Terra muitas das maiores mentes humanas. Embora a população do orbe terráqueo chegasse a vinte e cinco bilhões e, totalizando com os humanos que já habitavam outros planetas em milhares de outras galáxias, a humanidade chegasse a mais de um trilhão de pessoas, a grande maioria tinha um intelecto bem desenvolvido e dedicado à ciência. Os cientistas reunidos na sede da Intercósmica tinham em comum o fato de trabalharem na exploração espacial.

— Você até pode estar dizendo a verdade, — disse Ichia, uma cientista que havia aberto o caminho para a investigação de outros Universos, dirigindo-se ao homem do futuro. — mas não podemos acreditar sem provas.

— Eu provarei a vocês — falou o homem. — Contudo, antes deixe que eu me apresente, sou Lurnis. Eu venho de um futuro muito distante, onde a humanidade está próxima da extinção.

— E por qual motivo ela está se extinguindo? — perguntou Tichet, um especialista na construção de naves.

A expressão de Lurnis demonstrou um certo assombro, como se lembrasse de algo terrível. Então, ele respondeu:

— As máquinas tomaram o lugar dos humanos em quase todos os campos, fazendo com que a humanidade diminua consideravelmente.

— Ora, — interpelou Burdon. — isso é algo possível de acontecer, mas, no nosso sistema de controle atual, muito improvável. Imagino que você conseguiu se deslocar para o passado através de uma tecnologia muito mais avançada, gostaria muito de conhecer esse milagre da engenharia...

— Sim, — respondeu Lurnis. — é uma tecnologia inimaginável para essa época, que ainda utiliza uma antiquada máquina do tempo. Vou mostrar...

Lurnis retirou do bolso uma pequena esfera de cerca de quatro centímetros de diâmetro.

— Essa é a máquina do tempo do ano 7.000.000 d.C. — falou Lurnis.

Os cientistas se olharam espantados.

— Assim que eu apertar este pequeno botão — mostrou Lurnis na pequena esfera. — três pessoas aleatórias serão levadas juntas comigo rumo ao futuro, onde nos aguardarão os humanos sobreviventes.

— Mas por que pessoas aleatórias? E por qual motivo essas pessoas deverão ir para o futuro? — indagou Turff.

Lurnis refletiu e respondeu:

— Esse mecanismo foi construído por meio de cálculos matemáticos infinitamente complexos. As mentes humanas sobreviventes do futuro ainda têm o controle de parte da rede computacional, o que lhes permitiu encontrar a chave para reverter a capacidade das máquinas de destruir a humanidade. Três pessoas desse salão têm informações genéticas cruciais que poderão salvar a humanidade do futuro. Não sei ainda quem são essas pessoas, mas o mecanismo vai dizer.

Nesse instante, todos os cientistas estavam céticos, mas Lânia, embora duvidasse do relato de Lurnis, intuitivamente acreditava no que ele dizia:

— Muito bem, — ela disse. — acredito que você esteja dizendo a verdade e, aqueles que concordarem, poderão participar desse experimento aleatório. Será um grande avanço para a ciência.

Os cientistas discutiram entre si sobre a melhor maneira de realizar o experimento e sobre os possíveis riscos.

— Os que vierem comigo — afirmou Lurnis. — viverão um ano no futuro e retornarão nesse mesmo lugar, onde só terá se passado cinco minutos. Não posso negar que haverá riscos, mas vocês poderão impedir a destruição da humanidade no futuro e também no presente.

Então, ficou definido aqueles que participariam do experimento, sendo que somente três seriam selecionados para irem juntos com Lurnis ao ano 7.000.000 d.C. Lânia, Turff, Burdon, Tichet, Ichia e mais cinco cientistas concordaram em participar. Todos ficarem em volta de Lurnis com a esfera num raio de até quatro metros.

Além dos pesquisadores que participariam do experimento, haviam várias dezenas observando. Todos estavam ansiosos para saberem o que descobririam após esses cinco minutos.

Finalmente, Lurnis deu início à viagem. Assim que ele apertou o botão no centro da esfera, misteriosos flashes brilharam sobre os corpos dos participantes, até que três deles pareceram ter uma espécie de corpo luminoso. Lânia, Turff e Ichia haviam sido escolhidos pelos humanos do futuro. Então, eles desapareceram tal como Lurnis.

Passada a fase inicial do experimento, restava esperar cinco minutos para que todos retornassem.

— Esses são os cinco minutos mais demorados da minha vida — disse Burdon.

— Sinto o mesmo — afirmou Tichet.

Mas o fato é que se passou o tempo predeterminado e os viajantes não voltaram... Dez, vinte, trinta minutos e nada. Os cientistas supunham que o pior havia acontecido. Até que, após duas horas e meia, uma estranha luz principiou a brilhar no ponto onde Lurnis havia dado início à viagem no tempo. Começou a aparecer a imagem de uma mulher que, a princípio, os cientistas não reconheceram.

— Meu Deus... É Lânia!!! — exclamou Tichet.

Lânia tinha retornado sozinha, mas sua aparência havia mudado, seus longos cabelos negros agora estavam grisalhos. Seu aspecto jovem tinha envelhecido, o que significava que para ela haviam se passado décadas.

— Lânia, onde estão os outros? — indagou Burdon.

— Estão mortos...

Nesse momento, Lânia contaria aos seus contemporâneos tudo o que aconteceu no ano 7.000.000 d.C., contaria as histórias que eles quisessem ouvir... Entretanto, guardaria dentro de si um profundo segredo que havia descoberto no futuro: ela ainda era humana, uma das poucas humanas no futuro e também na sua época. O restante eram máquinas, ainda que não soubessem disso.

Thiago Marques Poeta
Enviado por Thiago Marques Poeta em 01/05/2022
Reeditado em 28/05/2022
Código do texto: T7507128
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