Futuro passado

Cem mil anos são um tempo bastante longo para uma civilização. Na melhor das hipóteses, isso explicava o silêncio nas comunicações, enquanto a "Fisaga" adentrava o sistema Losi rumo ao planeta Samaria: ninguém mais usava sistemas tão arcaicos, mesmo como legado. Na pior das hipóteses, não havia sobrado mais ninguém com quem se comunicar, algo que Viliamu Naea rechaçava.

- A Galáxia é vasta. Impossível que todos os centros tecnológicos tenham deixado de existir, mesmo numa escala tão vasta.

Finalmente, entramos em órbita de Samaria, quarto planeta de uma estrela classe F, catalogado como possível candidato à colonização cerca de 400 anos antes de nossa partida. Visto agora de perto, parecia realmente acolhedor, com mares mediterrâneos cercados por continentes parcialmente cobertos por uma vegetação de cores outonais. E, como seria de esperar numa missão de colonização, não apresentava sinais de uso recente de tecnologia; mas, como logo descobrimos, isso não significava que ela não houvesse sido empregada no passado.

- Há destroços em órbita - informou Toa Savali, em uma reunião dos técnicos no refeitório da nave. - O comandante ordenou que fossem colhidas amostras para identificar a procedência e a causa da destruição.

- Poderiam ser restos de outras naves colonizadoras? - Indaguei.

- Ainda não vi nenhum relatório conclusivo, - informou Toa - mas já devem estar sabendo que foram avistadas ruínas de grandes cidades no planeta, a maior parte delas já encoberta pela vegetação.

- Poderiam ser vestígios de uma civilização construída por nossos descendentes... outra nave colonizadora que chegou aqui antes de nós? - Perguntou Ana Perelini, que surgira com aquela hipótese numa de nossas conversas anteriores.

- Inconclusivo - ponderou Toa. - Precisaríamos descer uma equipe de xenoarqueologia para fazer pesquisa de campo, e o comandante, por ora, prefere adotar uma estratégia mais cautelosa.

Diante dos nossos olhares curiosos, ele prosseguiu, satisfeito pela atenção dispensada:

- As luas de Samaria. Temos três, e certamente deve haver estruturas e artefatos nelas, em melhor estado de conservação do que na superfície do planeta.

- É uma boa abordagem - admitiu Viliamu. - Dependendo do que for encontrado, pode adiantar o trabalho dos xenoarqueólogos.

- Ou desencorajar definitivamente seu uso no planeta - atalhei. - Se a civilização existente em Samaria foi destruída numa guerra, é possível que ainda haja algum perigo oculto para novos colonizadores, mesmo depois de milhares de anos.

Viliamu fez um aceno de cabeça.

- Tem razão. Se houve um lado vencedor nesse suposto conflito, porque simplesmente não ocupou Samaria e construiu uma nova civilização?

Fez-se silêncio, até que Ana tomasse a palavra:

- Acho que teremos que esperar que os xenoarqueólogos voltem das luas com alguma informação útil.

Viliamu fez um aceno de cabeça.

- Felizes são os colonos em animação suspensa, que não têm que se preocupar com esses problemas antes de começar o seu trabalho.

- Quando eles forem autorizados a descer, se isso for aprovado, já deveremos estar com as respostas - ponderou Toa.

- A verdade, é que a liberação poderá levar anos - avaliou Viliamu.

O clima de desânimo à mesa foi quebrado pela chegada de Etena Leapama, que contrastava com os presentes pela sua animação.

- Parece que vamos ter notícias em primeira mão das luas de Samaria! - Declarou ao sentar-se conosco.

- Você conhece alguém da equipe de xenoarqueologia? - Indagou Toa.

- Melhor - replicou ela em tom confiante. - Fui escalada para acompanhar o grupo, fazer a avaliação de qualquer sistema de sustentação de vida que venhamos a encontrar!

Talvez não demorasse tanto assim para termos respostas, constatei. Mesmo que não fossem conclusivas...

- [Continua]

- [27-04-2022]