A Saga de Godofredo XIX – O Casamento

15.04.22

418

O casamento aconteceria no navio antes de atracarem em Lampedusa, pois a embarcação em alto mar era território árabe. Saladino trazia o Imam Al Jarid na comitiva para as rezas e leituras diárias do Alcorão e seria quem faria o matrimônio, sob as leis do Islã. Convidara todos os seus comandantes para o evento, aproveitando para no dia seguinte se reunirem e definirem como atacariam Malta.

Ordenou o grande Sultão que a frota seguisse e aportasse na ilha sem ele, pois ancoraria ao largo para esse evento que seria ao entardecer daquele dia. Estava ansioso e preocupado, pois apesar de ter se convencido pelas atitudes de Hassan, ainda receava da sua lealdade. Seu instinto alertava-o. E como diz o ditado: é melhor ter o inimigo perto do que longe!

Mira, eufórica, preparava-se para a cerimônia. Usaria sua túnica em seda preta com bordões em ouro e a tiara de diamantes. Hassan, a melhor túnica. Nabi seria o seu padrinho e Saladino o da sua filha. Um pequeno altar foi improvisado no convés da embarcação. Estava tudo pronto. Ao por do sol e com o barco apontado para Meca, o casamento se realizaria.

Hassan, separado de Mira, pois os noivos não podiam se encontrar no dia do casamento, estava em outra cabine com Nabi, Halim e Abbud. Pensativo e preocupado com o que aconteceria, pois a atitude de Mira foi totalmente inesperada. Nabi, como sempre, falou a Hassan:

-Resolvido o problema meu irmão! Casará pelas leis islâmicas, que não são aceitas por nós, cristãos, e assim não terá validade. Também, poderá alegar que foi obrigado a assumir esse compromisso para que o seu disfarce não fosse descoberto por Saladino. Acalme-se, está melhor do que o esperado – completou Nabi dando-lhe tapinha nas costas!

Godofredo não respondeu. Continuou pensativo, pois estava mais enrascado ainda, como se não tivesse saída. Falou depois do seu silêncio:

-Sim concordo! Essa situação está resolvida, não há mais o que fazer! Depois da cerimônia e das minhas núpcias, deveremos ter a reunião final dos comandantes para conhecermos a real estratégia a ser adotada por Saladino para o ataque à Malta. Veremos se nos enganou ou não e o que faremos!

Batidas à sua porta foram ouvidas. Era o ajudante de ordens de Saladino informando que fossem ao convés. Era hora.

Hassan à frente seguiu ao local. O dia morria com um maravilhoso entardecer rosáceo no céu, já despontando algumas estrelas. Saladino, em sua túnica vermelha bordada a ouro ostentava o tacão do grande chefe dos muçulmanos. O Imam os aguardava com o Alcorão às mãos. Mira ainda não chegara. Os comandantes estavam em volta do altar em um semicírculo. Toda a tripulação do navio estava alinhada e fazia um corredor até o local do enlace. Usavam túnicas de gala, e Hassan ao passar por ela, desembainharam suas adagas e empunhando-as ao alto gritavam em uníssono: que Alá abençoe esse casamento!

-Que Alá abençoe esse casamento! - respondeu Hassan ao chegar junto ao Sultão e ao Imam. Reverenciou-os abaixando-se respeitosamente, posicionando-se à direita do Imam. Nabi, padrinho de Hassan, ficou a um passo atrás. Aguardavam a chegada de Mira. O coração de Hassan batia forte. Estava emocionado!

Mira então subiu ao convés. Caminhava com seu andar sensual e manso de felina. Olhava fixamente para Hassan, com olhos flamejantes de pantera. Um leve sorriso de vitória lhe estampava o rosto. Estava deslumbrante!

Passou pelo corredor da tripulação, que a saudou da mesma forma que a Hassan, seguindo em direção ao altar e se postou ao lado esquerdo do Imam, com seu pai um pouco atrás. A cerimônia começaria. A noite caía languidamente com o nascimento de uma enorme lua cheia, iluminando gradativamente o mar e a embarcação. A cena era maravilhosa e emocionante. Hassan estava sensibilizado e de olhos marejados. Saladino também!

O Imam iniciou as falas e cânticos lendo o Alcorão. Mira era só olhos para Hassan, que estremecia a cada olhar. Era irresistível essa mulher, colocando sua razão em xeque.

Chegou o momento dos juramentos, com os noivos frente a frente. O Imam perguntou a Hassan:

-Sob a benção de Alá, nosso mestre e mentor espiritual, e sob as suas leis contidas no sagrado livro do Alcorão, aceita Mira como esposa?

Hassan emocionado, disse de chofre com os olhos negro fervilhantes de Mira encarando-o, queimando-lhe de desejo:

- Sim!

A mesma frase repetiu o Imam à Mira, que respondeu afirmativamente sem tirar seus lindos olhos negros e amendoados de Hassan, que fervilhava de emoção.

-Doutor, doutor, os aparelhos estão apitando! – gritou Janice, esposa de Godofredo, correndo pelo corredor do Hospital a procura do médico. Ele a encontrou a caminho do quarto do seu marido.

-Calma, vamos ver se não é mais um espasmo – disse entrando com ela pelo quarto.

-Ele esta voltando, não é doutor? – diz ansiosa pela resposta do neurologista. Este acompanhava os dados dos aparelhos de monitoramento e nada respondeu. Ficou um tempo quieto observando os monitores. Ela, aflita, aguardava-o.

Os instrumentos pararam de apitar e a situação voltou ao normal. O médico continuou quieto. Depois de um tempo avaliando a situação, disse à Janice:

-Vamos fazer uma nova tomografia para ver o que está acontecendo e ter um diagnóstico melhor – saindo da sala. A esposa acompanhando-o, perguntou:

-É sinal de que está voltando, não é doutor?

-É um sinal de melhora, mas é cedo ainda para definirmos se está se recuperando de fato. O exame nos ajudará a avaliar esse quadro.

Janice voltou ao pé da cama e ficou acariciando os cabelos cacheados de Godofredo inerte e em coma, sussurrando-lhe no ouvido:

-Esta voltando sim, meu amor, eu sei que está!

- São agora marido e mulher sob as leis do Islã, e que sejam felizes – concluiu o Imam.

Mira sorridente e eufórica beijou longamente os lábios de Hassan, que quase desfaleceu de prazer. Estava totalmente dominado por ela. Ouviu-se no navio:

-Que Alá os abençoe! – gritaram todos balançando suas adagas ao céu, com Saladino comandando a homenagem. Depois, abraçando Hassan, sussurrou em seu ouvido:

-Que nada aconteça com a minha filha, pois terá que se haver comigo!

Largou do seu genro. Emocionado e com lágrimas nos olhos, abraçou longamente sua filha, dizendo-lhe:

-Minha princesinha! Que Alá lhe dê muitas alegrias e muitos filhos para que mantenham a nossa linhagem e cultura preservadas!

Hassan e Mira, agora marido e mulher sob as leis muçulmanas, foram para o leito nupcial. O grande disco prateado brilhava no céu iluminando a noite fresca e acolhedora. A festa em comemoração ao matrimônio se iniciou sob a luz lunar. As sombras predominavam. Uma ideia brilhou na mente de Hassan.

Nota do Autor:

É obra de ficção e qualquer semelhança e mera coincidência.

Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 19/04/2022
Código do texto: T7498487
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2022. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.