Refugiados
– Ei moça! - gritou o pequeno enquanto apontava para minha mala – Posso carregar isto?
– Quanto vai me custar? - perguntei
– Você tem alguma ração?
– Sim – disse eu – uma ração aloriana especial.
– Dois pacotes então! - exclamou ele enquanto sibilava de alegria.
– Dou-te três pacotes então!
A pequena criaturinha sibilou ainda mais alto, chamando até um pouco a atenção de outros na estação.
– Pssth! - pedi – não queremos que todos venham atrás de nós não é?
– Não moça, não! - e ele foi logo envolvendo minha mala com seus diminutos, mas ágeis tentáculos.
Saímos da estação. E lá estava ela, minha antiga e querida cidade, que a muito não via. A arquitetura continuava a mesma, prédios baixos, os maiores com não mais que 100 andares, ruas e avenidas extremamente largas e entre elas muitas praças e canteiros cheios de grandes árvores. Respirei aquele ar, era bom o ar da Terra. Mas havia muita coisa diferente também, primeiro era a presença de muitos refugiados, como meu pequeno ajudante aloriano que gentilmente ofereceu-se para carregar minha mala a troco de umas migalhas.
– Pra onde vai moça? - perguntou ele.
– Vamos para aquela praça – apontei, logo irão me buscar ali. - Fiquei curioso com uma coisa a seu respeito.
– O quê? - sibilou ele.
– Você me chama de moça, sabe o que isso significa?
– Claro, você é uma fêmea humana.
– Como sabe nos distinguir?
– Muito óbvio, nasci e fui criado aqui, conheço muitos humanos.
– Engraçado, encontrei muitos alorianos, você é o primeiro que consegue distinguir um humano do outro.
– E quanto a mim? - perguntou ele – sou macho ou fêmea?
– Ora, lógico que é um macho, seu sibilo e mais agudo, e seus tentáculos são vermelhos, as fêmeas possuem tentáculos cinzentos.
– Você é esperta!
– É que já estive em Alore quando… - me dando conta do que ia dizer, me calei.
– Pode falar moça, eu não ligo, nunca estive lá. Não ligo mesmo.
– Bom, mas melhor deixar isso pra lá rapazinho. Nosso papo está muito agradável para estragar com histórias tristes. E bem, aqui estamos, chegamos na praça, e como combinado tenho algo pra você.
Abri uma mochila que trazia as costas e dei a ele cinco pacotes de ração aloriana.
– Aqui está, guarde-as bem!
– Moça, está errado, eu deveria receber três pacotes.
– E está recebendo, três pacotes pelo serviço, e mais dois pela companhia.
Ele sibilou mais alto, alorianos demonstravam alegria de forma bem evidente.
– Obrigado moça! - e saiu apressado chacoalhando seus tentáculos.
Fiquei ali aguardando meu transporte e observando, via algumas pessoas, alguns robôs, mas a maioria dos seres ali eram alorianos, via também alguns plustáceos, andando pra lá e pra cá com seus cabeções, e também um ou outro miriarte, com suas muitas perninhas tentando se equilibrar. Era nítido que todos eles estavam doentes, também pudera, a Terra não era o ambiente de nenhum deles, gravidade mais alta, temperatura mais alta, baixo teor de oxigênio e aquele Sol implacável sob nossas cabeças. Agora que tinha voltado até eu achava o meu mundo mais alienígena do que os outros que visitei pela galáxia, mas era bom estar em casa.
Infelizmente todas aquelas raças alienígenas não tinham casa para voltar, com seus planetas destruídos, só restava aos sobreviventes aceirar o refúgio para viverem os últimos dias de suas gerações. Ao menos ali fora-lhes prometido não sofreriam nenhuma violência.
Vi meu pequeno ajudante ainda, ele dividia a ração com mais alguns de sua espécie, provavelmente seus companheiros de ninho, ainda vi quando balançaram seus tentáculos em minha direção, entendi aquilo como um aceno e acenei de volta.
Por fim meu transporte chegou, embarguei e vi pelo caminho muitos outros refugiados como eles, todos expulsos de seus mundos invadidos pela raça humana.