O procedimento
Depois do lanche, Mait me convidou a ir com ele até um prédio comercial, na avenida que margeava o rio Hägune. Era ali que os insurgentes tinham montado a sua base de operações em Jõeäärne.
- A localização é importante. Há sempre gente entrando e saindo, é um lugar movimentado - comentou antes de chegarmos ao nosso destino. - E também há saídas alternativas, caso alguma coisa dê errado.
- Fala da SegInt, imagino.
- Essa é uma área onde nem a SegInt costuma entrar - declarou confiantemente. - Mas, não se preocupe, temos amigos aqui.
O prédio abrigava várias lojinhas suspeitas que vendiam jogos eletrônicos e utilidades domésticas, muito provavelmente contrabandeados dos planetas extrassolares. Não despertamos a menor atenção ao passar pelo hall de entrada, e logo descemos pelas escadas mal iluminadas para o subsolo. Diante de uma porta onde uma placa informava que ali se fazia manutenção de consoles de computador e impressoras, Mait deu duas pancadas breves com os nós dos dedos.
- Entre! - Disse uma voz lá de dentro.
Entramos. Havia uma pequena antessala, com estantes atravancadas de todo tipo de tranqueira, um balcão e duas portas. Por trás do balcão, um sujeito gordo que nos olhou por cima dos óculos de aros redondos.
- Caramba! É impressionante como se parecem - disse o homem à guisa de saudação.
- Só deixando bem claro que eu sou o original - repliquei.
- Naturalmente - Mait sorriu e me deu um tapinha nas costas. - Este é Laur, Mairo.
Apertamos as mãos.
- Vamos para o laboratório - disse Laur, erguendo uma seção do balcão para que pudéssemos passar.
Entramos na porta da esquerda, que se abria para um corredor, e deste para uma sala maior, com dois assentos anatômicos colocados lado a lado, cercados por equipamento sofisticado que certamente não era usado para consertar computadores.
- Mait lhe explicou o que fazemos aqui? - Indagou Laur.
- A questão do emaranhamento quântico? Sim.
- Precisávamos de você, que é a matriz genética de todos os clones criados, para criar o primeiro vínculo - explicou Laur. - A partir daí, Mait poderá retornar às colônias extrassolares e reproduzir o procedimento com os demais.
- E então, os insurgentes poderão criar a sua própria rede de comunicação instantânea, sem interferência do governo? - Intuí.
- Precisamente - disse Laur. - Queiram se acomodar nos assentos, enquanto ajusto os equipamentos.
Mait e eu nos sentamos, o técnico colocou um bracelete prateado no pulso esquerdo de cada um de nós, e em seguida ligou vários equipamentos.
- Fiquem o mais imóveis que puderem enquanto calibro o gerador quântico - alertou.
Cheguei a prender a respiração por alguns segundos, até que Laur informou que o procedimento fora bem-sucedido.
- É só isso? Não senti absolutamente nada - comentei, algo decepcionado.
- Vamos fazer um teste para ver como funciona na prática? - Sugeriu Laur.
Mait segurou o bracelete com a mão direita e olhou para mim. E então, subitamente, passei a me ver através dos olhos dele.
- Comunicação instantânea - ouvi-o dizer, diante da minha própria cara de assombro.
- [Continua]
- [04-03-2022]