A reunião do Diretório
- Este é Mairo Alver, nosso colega do terceiro ano de antropossociologia - apresentou-me Riho Eenpalu aos seus colegas reunidos na sede do Diretório Estudantil. Alguns dos presentes já eram meus conhecidos, dos corredores da universidade ou pelas participações em manifestações de cunho político. Reconheci Jaak Janes, Kalev Laar, Joel Sepp e Kaarin Mand, uma estudante de comunicação e propaganda. Os demais ao redor da mesa redonda não me foram apresentados, nem seus nomes declinados, mas todos acenaram ou sorriram, tentando parecer simpáticos.
- Temos ouvido falar de você nos últimos dias, Mairo - disse Jaak Janes à guisa de introdução, após eu ter me sentado no único assento vazio.
- Espero que as notícias tenham sido boas - redargui.
- Foram bastante promissoras - assegurou Jaak. - Acredito que tenha vindo nos ver pelas informações que temos sobre o desaparecimento dos seus pais, em Kuusirp.
- Não sei porque fala em desaparecimento... eles morreram num acidente industrial - repliquei, num tom que esperava não soasse como defensivo.
- Os corpos nunca foram encontrados - comentou Riho, meu cicerone.
- Assim como os de outros operários e técnicos atingidos pela explosão - retruquei com firmeza. - Era uma maldita fábrica de termoplásticos!
- Calma, Mairo - Kaarin Mand ergueu as mãos, num gesto apaziguador. - Ninguém aqui está fazendo uma acusação, trata-se apenas de discutir fatos.
- E o fato é que seus pais foram dados como mortos em Kuusirp - insistiu Jaak. - Você foi colocado sob a tutela da sua tia materna Kaidi, e fim da história; pelo menos, até agora.
Subitamente, todos ao redor da mesa estavam me encarando, como se eu estivesse escondendo alguma coisa.
- Francamente, não sei o que esperam ouvir de mim - repliquei, mãos espalmadas sobre a mesa. - Não tenho qualquer informação nova sobre a morte dos meus pais, e na época do acidente, estava com meses de idade!
Fez-se silêncio até que Jaak o interrompesse.
- Há uma possibilidade real de que seus pais ainda estejam vivos... e que tenham decidido entrar para a clandestinidade logo depois do seu nascimento. A explosão na fábrica teria sido apenas uma encenação para que a SegInt arquivasse o caso e deixasse de procurá-los.
Cerrei os punhos e estreitei os olhos.
- Está me dizendo que meus pais provocaram uma explosão que matou várias pessoas, apenas para fugir da Segurança Interna?
Jaak deu de ombros.
- Talvez não tenham sido eles, mas uma decisão da cúpula insurgente - ponderou. - Não importa. O certo é que o Partido tinha suspeitas sobre seus pais, mas não houve tempo para investigar a fundo, pois desapareceram no tal acidente.
- A afirmação que está fazendo é muito grave - tentei parecer firme, mas estava abalado por dentro.
- Como disse a Kaarin, são apenas fatos, Mairo - redarguiu Jaak serenamente. - E em defesa deles, podem ter tomado essa decisão drástica para proteger você.
- Eu? - Pus a mão no peito, intrigado.
- Se o Partido souber do que nós sabemos, - prosseguiu Jaak - provavelmente você será trancafiado numa instalação militar, incomunicável.
- Nós podemos lhe dar proteção, Mairo - disse suavemente Kaarin. - Fique conosco.
- Por que o Partido iria querer me prender? - Abri as mãos, como se quisesse reforçar minha inocuidade.
- Para pegar o seu irmão, Mairo - replicou Jaak.
- [Continua]
- [28-02-2022]