A Saga de Godofredo VIII – A Novidade
28.02.22
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Após a partida de Saladino e de sua filha Mira voltaram para a tenda Halim e Nabi. Hassan permaneceu deitado e Abbud ficou no barco finalizando a separação dos toneis para a descarga na manhã seguinte. Retomaram os planos para a execução da missão, pois teriam que recuperar o tempo perdido pela inesperada visita do sultão. A tarde findava.
Nem bem havia começado a revisão das ações planejadas, quando entraram Hanu e Nabu, os espiões gêmeos e mudos, com expressão de preocupação no rosto. Hanu tirou uma folha de papel de sua túnica e a entregou a Hassan, que leu compenetrado e sério. Demorou alguns minutos e disse aos demais:
- Amanhã, chegarão mais dez navios, de Trípoli. Devem aportar junto aos demais da frota de Saladino. A entrega do azeite será adiada, pois os práticos
estarão empenhados o dia todo nessa operação. Saladino, com seus espiões, está observando as nossas ações. General Abdul - o segundo no comando das forças sarracenas, com seu filho Schain, estarão vindo nessa flotilha. Ele é o pretendente de Mira e é do agrado de Saladino – concluiu Hassan a leitura sob os olhares atônitos dos companheiros.
Ficaram em silêncio por um tempo. Abudd entrou na tenda, viu aquela cena sem saber o que acontecia. Halim lhe pôs a par, ficando sisudo e cofiando a barba.
- O que faremos? – questionou então Nabi.
-Teremos que aguardar a chegada desta frota para reavaliarmos nossas ações – comenta Hassan.
-Você não acha um grande risco ficarmos aqui mais tempo? Poderíamos propor a entrega para Saladino amanhã e só depois para a nova capitânia; usar um tonel de alcatrão de Saladino; tirar de cada navio um barril de azeite e carregar no navio da Abdul. Abbud conhece bem a barra da entrada de acesso ao local dos navios de comando de Saladino - propõem Halim.
-Sim, conheço muito bem essa entrada e poderia levar o nosso navio tranquilamente – confirma Abbud.
-Boa ideia, Halim! Mas, oficialmente não estamos sabendo dessa novidade. Como vamos justificar a nossa ação? Saladino vai desconfiar mais – comenta Hassan.
-Bem Hassan, como você está nas graças da princesa Mira, poderia ir agora ao palácio devolver-lhe o véu negro da sua túnica, que perdeu ao pular no mar para salvá-lo e Abbud pegou. E com ela no palácio poderia tentar obter mais informações – fala Nabi mostrando-lhe a peça de roupa em sua mão gorda.
-Sim, vamos eu e você, pois está nas graças de Saladino e também pode conseguir alguma informação com ele. Halim, mande um pombo correio para Hamud em Tunes, para que avise da novidade ruim ao nosso pessoal em Malta! Deixe tudo preparado para efetuarmos a entrega amanhã, caso nos autorize! Vamos Nabi?
Montaram em seus cavalos e partiram. Hassan ouviu a voz estridente de Nabi em sua mente:
-Leva-me junto para não fazer nenhuma bobagem de apaixonado, não é mesmo? E agora que ela tem pretendente, fica mais perigosa ainda a situação. Muito sábio e prudente ir com a sua consciência.
Chegaram ao castelo e entraram em direção ao salão nobre, no qual ficava Saladino. Aguardaram serem chamados, pois estava o grande chefe em reunião com os seus generais. Esperaram por algumas horas. Anoiteceu. As pesadas portas se abriram e saíram os comandantes. Os dois fizeram reverência aos oficiais que passavam por eles, abaixando suas cabeças para não serem identificados.
-A que se deve a inesperada visita dos meus irmãos mercadores? Que Alá esteja convosco - fala-lhes o sultão vendo-os sob o espaldar da porta!
Hassan caminha em direção ao sultão com o véu da princesa nas mãos e lhe diz:
-Que Alá esteja convosco grande Senhor! Trago humildemente o precioso véu da princesa Mira, que ao me salvar hoje do quase afogamento, o deixou cair no mar.
Saladino encarou-o com firmeza por alguns segundos. Hassan abaixou- se em reverência estendendo-lhe os braços com a peça de vestimenta da filha nas mãos.
-Ah, que gentileza do nobre mercador. Fico muito feliz em reaver esse véu que foi da minha avó – fala Mira com voz sensual caminhando em sua direção com passos leves como os de um felino, pegando o véu das suas mãos. Saladino permaneceu quieto e contrariado. Nabi, vendo a tensão entre os dois, dirigiu-se ao senhor:
-Meu nobre e honrado chefe, aproveitando a oportunidade, gostaríamos de lhe perguntar se está confirmado o desembarque da nossa carga amanhã?
Saladino voltou-se para ele encarando-o friamente ao responder:
-Não!
-Não, meu senhor? Ocorreu algum problema?
-Está chegando amanhã uma flotilha de Trípoli. Nossos práticos irão conduzir esses navios pela barra de acesso ao porto.
Mira olhava com meiguice para Hassan, que desviava do seu olhar. Ela era irresistível. Ele sentia frêmitos sempre que a encarava. Estava totalmente seduzido por sua beleza selvagem. Seu pai acompanhava a cena. Falou encarando a Hassan:
-Com esses navios, está Schain, filho do meu querido companheiro de batalhas, general Abdul. Rapaz que prezo muito, guerreiro valoroso e pretendente de minha filha.
Mira irritada com a fala do pai fulminou-o com o olhar. Mas não perdeu a oportunidade de contraria-lo ainda mais, dizendo aos mercadores:
-Ficam para jantar conosco? – fala para o pai olhando com olhos ferozes.
Hassan ficou estático, como que abatido por uma flecha. Nabi rapidamente respondeu:
-Com muita honra aceitamos o nobre convite da minha senhora princesa Mira – diz reverenciando-a e puxando a túnica de Hassan para que fizesse o mesmo, pois se mantinha parado. Mira riu levemente da cara que Hassan fazia. Saladino, contrariado, aceitou.
-Muito bem, sejam bem-vindos a nossa mesa. Que Alá esteja convosco – fala dirigindo-se para o salão de refeições, puxando a filha pelo braço para tirá-la do lado de Hassan! Entraram no salão em que havia uma farta mesa de comida e frutas, dispostas sobre uma fina toalha em linho egípcio, mostrando que seria um lauto jantar.
A ceia seguia tranquila. Nabi e Hassan estavam sentados lado a lado, frente a frente a Saladino e a filha. Em dado momento, Nabi se dirige ao Sultão:
-Meu senhor e chefe, gostaríamos de lhe perguntar da possibilidade de fazermos a entrega amanhã, como programado, já que temos o nosso contramestre, Abbud, conhecedor da entrada da barra do porto de Sfax. Ele já fez inúmeras viagens a esse porto. Acredito nobre sultão, que tenha muito interesse em logo receber essa preciosa e indispensável carga, para enfrentar a grande batalha que se aproxima. Caso nos autorize, poderemos dividir a carga entre os sete navios de comando, com a redução de um barril por navio para suprir o adicional.
Saladino o escutou com atenção com seus duros olhos fixos nos de Nabi, tentando decifrar qual era a real intenção da ação proposta e respondeu:
-Meu nobre amigo e irmão mercador, seria realmente interessante, pois adiantaria a partida da nossa força em alguns dias, certamente. Mas, será necessário muito cuidado e destreza para não ocorrer choque ou encalhe da embarcação, pois o calado da barra é baixo e há muitos bancos de areia. Seu contramestre deverá se ater a esses detalhes.
-Então poderemos efetuar esse desembarque amanhã, nobre senhor e chefe? –questiona ansioso Nabi.
-Sim. O meu capitão intendente Zair irá acompanhar a conferência da entrega.
-Agradecemos a sua benevolência e confiança em nós depositada grande senhor. Faremos a entrega sem qualquer problema. E como sinal de nossa lealdade com a sua causa, cobraremos a metade do valor da carga. Considere um humilde presente.
Hassan acompanhou mudo o diálogo, mantendo-se o mais despercebido possível. Mira não lhe tirava os lindos olhos amendoados e negros, sorrindo-lhe sensualmente. Ele tentava disfarçar, mas a volúpia que ela lhe provocava, era avassaladora. Essa princesa estava lhe virando a cabeça.
-Certo Hassan? –lhe desperta Nabi do seu devaneio amoroso.Estava embebecido pela mulher.
-Sim, sim, perfeito – respondeu Hassan automaticamente, sob o olhar, risonho e cativante de Mira e reprovador e duro do sultão.
Voltaram refestelados para o acampamento. Nabi, pela comida maravilhosa. Hassan, pelo entusiasmo que a princesa lhe despertava. Estava difícil ficar sem pensar na linda e insinuante filha do sultão. Mas, havia Schain...
Nota do Autor:
É uma obra de ficção e qualquer semelhança é mera coincidência