A Saga de Godofredo V – A Princesa
17.02.22
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No dia seguinte à chegada a Sfax, Nabi concluiu a carta endereçada à Saladino pedindo mais alguns dias para a efetivação da entrega da carga de azeite, que analisada por Hassan e Halim, foi aprovada e assinada.
-Leve estes colares, anéis e pulseiras separadamente, caso tenha que subornar alguém – entregando-lhe Hassam um saco em couro com eles.
-Bem pensado Hassan – respondeu-lhe Nabi com um leve sorriso em seu rosto redondo como lua.
Com um tonel de azeite, a adaga e demais presentes em uma linda caixa de madrepérolas cravejada de pedras preciosas, e junto com dois soldados assasin escoltando-o, seguiram para o palácio. Chegaram à fortaleza de Saladino e foram parados na entrada por um dos guardas sarracenos. Eram dois.
-Alto! – indo até ao carro em que Nabi conduzia o tonel e os presentes na caixa, ladeado pelos dois assasin.
-Que Alá esteja convosco. Viemos entregar um tonel de amostra de nosso azeite e presentes para o grande Senhor. Ele nos aguarda - fala Nabi, sabendo que no dia anterior, Hassan enviara ao palácio mouro, o segundo homem no comando dos assasin, e de extrema confiança de Halim, para solicitar que fossem recebidos na manhã do dia seguinte, sendo aceito o pedido.
O soldado rodeou a carroça, viu o tonel de azeite e a linda caixa com os presentes. Fitou-a por alguns instantes e disse:
-Abra o tonel e a caixa!
-Mas nosso grande Senhor nos aguarda ansioso. Vamos perder tempo precioso, pois é o azeite para as tropas prestes a partir para a batalha contra os cruzados, meu senhor.
-Abra! – empunhando a sua lança em direção ao peito de Nabi. Um dos assasin puxou sua adaga. O confronto estava prestes para acontecer, o que arruinaria toda a missão. Nabi agilmente tirou debaixo do banco da carroça o saco de couro que Hassan lhe dera, retirando duas pulseiras em ouro.
-Meu senhor, aceite este humilde presente e nos deixe ir encontrar com o grande Saladino, que nos aguarda ansioso – estendendo sua mão com as duas peças douradas.
O soldado mouro abaixou a lança, olhou para o seu companheiro, que assentiu levemente com a cabeça. Pegou as peças, colocando-as dentro da manga da túnica.
-Podem passar! Mas têm que deixar suas armas conosco, ordens superiores – completou.
Nabi sabia que os assasin não se separam de suas armas de forma alguma, criando um impasse. Teria que dar uma solução. Chamou-os e sussurrou-lhes:
-Aguardem-me aqui. Caso a minha demora seja grande, vá um de vocês avisar a Hassan – combinou Nabi. Concordaram acenando suas cabeças.
Deixou a sua adaga e faca com um dos seus soldados e adentrou sozinho na fortaleza em direção à entrada do prédio. Parou a carroça, desceu, e à porta, estava um oficial.
-Algum problema?
-Não tudo resolvido.
-Nosso grande Senhor o espera com o seu alto comando no grande salão azul. Deu ordens aos soldados para levarem o tonel e entraram pelo castelo. Nabi carregava a bela caixa com os presentes.
Caminharam os dois por entres as salas de altas abóbadas ricamente esculpidas com finíssimos arabescos, que poderiam quebrar a um leve toque, por sua delicadeza. As paredes, em mosaicos cerâmicos multicolores e babados dourados, mostravam a grande riqueza do sultanato. Chegaram a uma enorme porta em madeira maciça, guardadas por dois soldados negros com túnicas iguais as dos assasin de Halim. -Têm também os seus assasin - pensou Nabi.
Foram abertas as duas pesadas folhas do portão. Descortinou-se a grande nave azulada da fortaleza com sua enorme abobada esférica, ricamente decorada com mosaicos mostrando as campanhas de Saladino. Em uma delas, ele enfrentava um enorme puma negro. Nabi maravilhou-se pela beleza e luxo do local. Viu o piso em mármore e granito com molduras douradas, brilhantes como um espelho. As colunas cilíndricas de sustentação da nave eram também douradas até meia altura. Depois, arabescos finos e delicados ornavam-nas até se encontrarem e desaparecerem na curvatura do teto. No centro da nave, uma fonte toda dourada, jorrava agua límpida e fresca. Muito poder demostrava o nababesco local.
-Que Alá esteja convosco! – escutou a voz firme e forte de Saladino, sentado ao final do salão em trono todo em ouro, postado em patamar acima do piso. Rodeavam-no seus comandantes. Ao lado esquerdo do trono, preso a uma corrente, um lindo puma negro de olhos de fogo, apreciava a cena deitado calmamente. - Será que é o mesmo do teto? – pensou Nabi.
Então, notou ao lado direito de Saladino, uma jovem apoiada no espaldar do trono, com longos cabelos lisos e olhos amendoados, negros, de estatura mediana, usando um bustiê e calça bufante em fina seda vermelha que mostrava todo o seu corpo escultural. Usava também, como reza o costume árabe, um leve e transparente véu vermelho. Portava ricas peças em ouro, em prata e pedras preciosas. Tinha em sua cabeça, uma tiara com diamantes reluzentes. Uma princesa. - Quem será essa linda mulher? – questionou-se Nabi, encantado.
-Que Alá esteja convosco também meu Senhor e grande Chefe Saladino – respondeu-lhe Nabi fazendo reverência.
-Aproxime-se. Onde está o seu companheiro de negócios? Ele não viria também? Tinha a informação de Amud de Tunes, nosso querido irmão negociante de azeite, que viriam Hassan e Nabi, descrevendo-os para mim como seriam. Você é Nabi, não?
-Sim, meu grande Chefe, sou Nabi a seu dispor. Aqui está uma carta, que gostaríamos humildemente atendesse a nossa solicitação. Também, trago-lhe um tonel do puríssimo azeite libanês para que confira a sua procedência e qualidade – apontado para o barril ao lado dos guardas que o transportaram. Seguiu falando:
-Mas antes de lhe entregar a carta, gostaria que aceitasse esse nosso presente, como sinal de amizade e relacionamento comercial que temos – abrindo a caixa e retirando dela a adaga pilhada pelos piratas, em uma rica bainha em prata cravejada com pedras preciosas. Nabi caminhou ao degrau do patamar em que estava o trono de Saladino, ajoelhou-se e estendeu-a ao sultão, em gesto de submissão.
-Agradeço o presente – pedindo a um soldado que a pegasse e lhe entregasse.
Saladino segurou a linda arma observando-a com cuidado e vagar. Desembainhou-a vendo a sua beleza e leveza. Eram feitas com o aço de Damasco. Sorriu de aprovação.
-Bela arma. Obrigado. Mas agora, passe a sua carta!
-Nobre sultão, tenho aqui esta caixa de presentes que gostaria que aceitasse também, como mais um sinal da nossa lealdade e compromisso com a sua causa – colocando a linda caixa sobre o degrau do patamar.
-Posso pegá-la pai? – diz a moça com voz sensual. Uma princesa de fato, filha de Saladino, deixando Nabi pasmo com a revelação.
-Sim e traga a carta também.
Ela desceu do patamar com passos suaves e movimentos graciosos e belos dos seus braços e corpo como um felino. Pegou primeiro a carta, e depois, solicitou a um guarda que levasse a caixa até ao lado do trono.
Entregou a carta ao pai, que leu e olhou fixamente, com seus olhos negros e duros, para Nabi por alguns segundos, avaliando a proposta. Nabi ficou tenso.
-Pedem mais três dias para a descarga dos tonéis de azeite? Qual o motivo? Eles estão disponíveis no seu barco, não é mesmo? Explique-me!
-Meu grande Senhor e Chefe supremo, tivemos imprevistos durante a nossa viagem até aqui. Em uma tempestade, os tonéis se chocaram pelo enorme balanço do barco, rachando alguns e vazando o seu conteúdo. Ficou misturado com a água do mar que entrou no compartimento de carga. Já estamos fazendo a coleta do azeite derramado. Por esse motivo, o pedido de prorrogação do prazo.
-Dou-lhes um dia, nada mais! Depois de amanhã cedo, meu prático irá levar o seu barco até as nossas embarcações para o desembarque.
-Entendo e aceito humildemente sua sábia decisão, meu grande Senhor.
-Ah, e amanhã a noite haverá um jantar de despedida da nossa tropa para a travessia até Malta e convido você e seu companheiro mercador. Quero conhecê-los melhor. Estejam aqui ao cair da noite – completou Saladino.
-Estaremos sim meu grande Senhor. Alá esteja convosco – despediu-se Nabi, caminhado rapidamente com seus passos curtos para a saída da fortaleza.
Nota do Autor:
É uma obra de ficção e qualquer semelhança é mera coincidência.