O Fim dos Dias

O universo ao nosso redor apresentava-se quase que uniformemente escuro, ao menos em luz visível; apenas no infravermelho podíamos detectar alguns pontos luminosos, bastante espaçados e distantes. Aquele era o Fim dos Dias.

- Não exatamente o Fim dos Dias - corrigiu o comandante Sorr Takh. - Se estivéssemos lá, este universo seria apenas uma sopa gelada de fótons e léptons mergulhada em trevas. E, certamente, não haveria trabalho para nós.

Afinal, recolher informações era o nosso trabalho, e para isso alguma organização de matéria e fontes de energia ainda deveriam subsistir no universo abordado. Mas não o suficiente para representar perigo para a tripulação do transporte multiversal "Hitta Merari", um colosso esférico de seis km de diâmetro e tripulação recrutada em centenas de mundos e dezenas de universos diferentes. O que fazíamos com a informação recolhida?

- O objetivo maior é nos tornarmos capazes de criar nossos próprios universos, ou de reverter o processo de degeneração daqueles que chegaram ao fim da sua existência - diziam os instrutores da Academia em Lassan, o orbital que funcionava como sede da Aliança Interuniversal.

Esse era o propósito de nível mais alto, mas sempre havia muita informação relevante e útil a ser garimpada em universos agonizantes, e que não era abrangida por esse cômputo. Às vezes, também fazíamos missões de resgate para quaisquer civilizações remanescentes que assim o desejassem, sem perspectivas de escapar à inevitável morte térmica. Aparentemente, esse era o caso dos sideritas, espécie biológica que havia migrado para uma existência virtual há centenas de milhões de anos, já prevendo que a energia se tornaria cada vez mais escassa em seu universo. Mas os sideritas haviam agradecido nossa ajuda e informaram que tinham um plano para criar um novo entorno, algo que nos interessava de perto.

- Como pretendem fazer isso? - Questionou o comandante Sorr Takh.

Os sideritas estavam finalizando a construção de um colisor de buracos negros, cuja função seria absorver toda a matéria restante e transmitir sua informação para um novo universo recém-criado. Todavia, fazia-se necessária uma ressalva: não havia nenhuma garantia de que a informação preservada o fosse de modo coerente. Ou seja: a própria existência da civilização dos sideritas talvez não resistisse à sua absorção pelo buraco negro final. De imediato, nosso interesse reduziu-se consideravelmente.

- É uma ideia interessante, mas creio que vamos continuar procurando - disse o comandante.

Nossos teóricos afirmavam que, em algum lugar no multiverso, havia um universo de estado contínuo, sem princípio nem fim. Talvez fosse apenas uma nova lenda do Eldorado, mas a busca prosseguia.

- Em último caso, - finalizou o comandante ao enviar seu relatório para a Aliança - podemos considerar o método idealizado pelos sideritas.

Mas não havia pressa. Afinal, ainda tínhamos alguns trilhões de anos antes de ter que tomar uma atitude tão drástica...

- [31-12-2021]