O ataque das bestas elétricas

O ataque começou do lado oriental da muralha por volta das 3 da manhã, provavelmente esperando pegar nossas defesas desprevenidas; mas nós estávamos bem atentos, justamente prevendo algo desse tipo. O capitão Rybakov subiu rapidamente ao topo da fortificação, após ter sido acordado pelo alarme, e viu do lado do rio as luzes emitidas pelas couraças de pelo menos dois hrubokochek, as enormes criaturas de seis patas e quatro chifres, que funcionavam como acumuladores vivos e geravam arcos elétricos devastadores.

- Estão se preparando para descarregar! - Gritou uma sentinela, para os soldados que acorriam às ameias com suas bestas engatilhadas.

- Liberem as catapultas! - Ordenou Rybakov para os artilheiros, posicionados mais acima na muralha. Talvez aguardar um pouco mais causasse maior impacto aos hrubokochek, mas o capitão não queria correr riscos desnecessários.

As cargas lançadas começaram a arrebentar-se sobre os hrubokochek, embora isto não parecesse surtir qualquer efeito sobre as criaturas, que continuavam a avançar a passo lento, mas constante. Rybakov franziu a testa.

- Os barris estavam completamente cheios? - Gritou para o sargento Bohatec, que liderava o grupo de artilharia.

- Sim, senhor! - Gritou o sargento. - Eu mesmo verifiquei!

- Sirvam outra rodada! - Decidiu-se Rybakov. - Se descarregarem agora, vamos ver fogos de artifício!

Os soldados permaneciam em silêncio, protegidos por trás das ameias. Contra a couraça dos atacantes, suas armas só eram eficazes caso conseguissem atingir algum ponto sensível, e quase todos estes se localizavam no ventre do animal, inatingível por cima. As catapultas lançaram outra carga, sem que qualquer efeito visível fosse verificado.

No instante seguinte, os chifres dos hrubokochek se iluminaram de azul e uma cascata de fogo elétrico despejou-se sobre os defensores. As pedras estalaram e uma fenda correu a muralha de cima a baixo. Alguns homens despencaram das ameias para o fosso da fortaleza, já mortos.

- Preparar para abrir o reservatório! - Gritou Rybakov.

Era uma medida extrema, visto que, sem a água do reservatório, não teriam como encher os barris rapidamente. Mas, se nenhuma atividade fosse tomada, em breve a muralha seria posta abaixo, e a infantaria dos zahaleny tomaria a fortificação.

- Pronto, senhor! - Alertou o sargento Bohatec.

- Ao meu sinal! - Replicou Rybakov.

E para os soldados que haviam resistido ao primeiro embate:

- Recuem todos para dentro do torreão, levem os feridos!

Sozinho no alto da muralha, aguardou até que os hrubokochek estivessem com pelo menos duas das pernas dentro do fosso e deu a ordem:

- Agora! - Depois, correu para a segurança do torreão o mais rápido que suas pernas lhe permitiram.

Quando as águas do reservatório atingiram os hrubokochek logo abaixo, o circuito foi fechado e houve uma grande explosão que destruiu parte da muralha, a qual desabou, soterrando parcialmente as criaturas.

Pouco depois, os defensores retornaram e começaram a disparar sua artilharia convencional contra os zahaleny, que haviam emergido da floresta próxima e corriam em direção à fortaleza. Como os hrubokochek não haviam logrado abrir um grande buraco na base da muralha, os atacantes, após avaliar suas possibilidades, fizeram soar o toque de retirada pouco antes de chegaram ao alcance das bestas dos defensores. Afinal, sempre poderiam tentar novamente outro dia.

Do alto das muralhas, os defensores cantaram vitória.

* * *

De manhã, caminhando ao longo das ameias com o intendente real, Kjosev, o capitão Rybakov fazia uma avaliação do que precisaria para reparar os estragos provocados pelo ataque da madrugada.

- É época da colheita, mas a prioridade deve ser a reconstrução da muralha. Deve convencer o príncipe de que vamos precisar tirar braços da colheita para reparar a muralha.

- Terá os homens de que precisa - tranquilizou-o Kjosev. - Mas me preocupa que os zahaleny estiveram tão próximos de romper o nosso perímetro defensivo.

- Fizeram alguma modificação nesses hrubokochek, pode ter certeza - ponderou Rybakov. - Os zahaleny não são tão estúpidos quanto nossos antepassados acreditavam, e decididamente agora parece que resolveram se livrar de nós. Temos que nos defender, é uma questão de sobrevivência.

- Nossos antepassados foram benevolentes, permitindo que os zahaleny vivessem - replicou o intendente.

- Sejamos honestos - retrucou o capitão. - Não tínhamos como exterminar os zahaleny quando nossos antepassados fizeram uma aterrissagem forçada nesse planeta; na época, a melhor política era a de acreditar que havia espaço suficiente para ambas as espécies coexistirem pacificamente. Infelizmente, parece que pouco a pouco eles acabaram nos vendo como uma ameaça.

- Esse mundo agora é tão nosso quanto deles - avaliou Kjosev. - Vivemos aqui há séculos.

- Mas eles estavam aqui desde sempre - redarguiu o capitão, braços cruzados. - Dificilmente vamos ganhar a questão pelo critério de antiguidade.

E se o fator a ser considerado fosse o de integração ao ambiente, os nativos, cedo ou tarde, acabariam como vencedores.

- [25-12-2021]