O ABDUTOR DE ALIANÇAS 3/6
Capítulo 03 - Explosão
Tomas perseguia a nave e a nave perseguia a caminhonete. Adiante já se via a enorme e extensa montanha se aproximando bem no meio do caminho. O traído nunca percorreu por aquela estrada, talvez quem tivesse dirigindo aquela caminhonete sabia o que ocorria quando se deparasse com os poderes extraterrestre, mas preferisse jogar o carro contra a montanha num suicídio honroso.
O ex-casado acelerou até o talo alcançando o OVNI. Pôs o braço pra fora, mirou pra cima resistindo ao vento, mas não fez ideia de onde atirar. Uma bala de pistola soava inofensiva perante aquele objeto bruto. O cenário avermelhado devido as luzes de excitação insinuava que algo devia ser feito urgente!
A montanha estava chegando mais perto. Ele fechou os olhos, respirou fundo buscando uma solução, nada veio na cabeça. A caminhonete fez um movimento descontrolado, um cilindro apareceu na janela trêmula do motorista. A cabeça do objeto foi mirada na direção do disco voador, um clarão amarelado surgiu dali, e da ponta do cilindro um cubo voou em direção a nave deixando fogo e fumaça no trajeto percorrido.
— Uma bazuca? — gritou Tomas com a cara em cima do volante – O pessoal da caminhonete tem uma bazuca?
Apreciou cada momento daquele mini foguete indo na direção da nave mau caráter. Era bom demais pra ser verdade. Sabia que uma aeronave daquele porte não cairia assim tão fácil, mas ansiava em causar o mínimo incomodo aos vigaristas. Ele abaixou um pouco a cabeça pra ver o projetil chegar lá em cima. O foguete já estava perto demais e nada da nave projetar o escudo de defesa, se é que isso existia. Um estrondo surgiu, a nave chacoalhou e Tomas viu uma belíssima euforia de fogos na explosão provocada embaixo dela. Comemorou aquele réveillon acontecendo graças a bravura do motorista da frente pra proteger seu casamento. Até que a beleza incandescente cessou, sobrando uma fumaça serpenteando no céu. A astronave lançou um jato como extintor de incêndio, e assim que o ambiente limpou, o ex-casado constatou que o buraco foi minúsculo como uma topada de dedo que não impede o corredor de correr. A nave continuava a perseguir.
Na frente, a montanha estava terrivelmente gigante. E a caminhonete não diminuía a velocidade. Ia mesmo acontecer. Mas no pé do cume havia uma área mais escura, quando o farol tocou o local, se revelou um túnel, a caminhonete entrou ali. A luz vermelha da nave ficou azul e desacelerou ao perceber que não caberia na passagem repentina, tremeu e subiu pela montanha.
Tomas, acompanhou o veículo da frente pelo interior do túnel, que logo desacelerou e encostou próximo a parede rochosa. O ex-casado passou devagarzinho investigando o automóvel estranho e estacionou logo adiante, desceu do carro ficou ali curioso pra conhecer o ousado da caminhonete preta.
O novo ambiente era mais escuro que lá fora. A maçaneta do veículo misterioso se moveu e a porta abriu, surgiu a sombra de alguém, suas botas de couro pisaram no chão areado, ele se ergueu, encarou o homem da lata velha sem falar nada e voltou a atenção para os itens que começou recolher no carro. A fera tinha estilo.
— O que está fazendo aqui? — Perguntou a voz do estranho.
— Vim atrás deles, queria fazer justiça.
O sujeito encaixou a bandoleira entre o ombro e o pescoço. Mesmo no escuro, pelo formato da arma, parecia uma doze. Ele virou a cabeça e disse:
— O que eles te fizeram?
— Raptaram minha mulher.
— Raptaram? — Disse o estranho se virando por completo dando uma leve gargalhada — ou ela quis?
— Ela quis — vacilou na voz — Mas ela estava estranha...
— Se ela quis — interrompeu o estranho — Então o que busca não é justiça, é vingança.
Ninguém mais saía da misteriosa caminhonete. Mesmo no ambiente semiescuro, daria pra ver a silhueta caso houvesse alguém.
— E você? fizeram o mesmo com a sua mulher? — quis saber Tomas.
— O que é isso?! — Se impôs o sujeito.
A pessoa se aproximou enrubescida e quando perto, Tomas confirmou. Tinha cabelos grossos, longos até a cintura, amassados pela bandoleira; o rosto estava sujo de poeira, um vestido a moda roceira esverdeado a cobria até os tornozelos onde dava lugar as botas.
— Não sou lésbica! Quer dizer que estou tão mal assim? — O confrontou irritada com as mãos na cintura quase rosto a rosto com ele.
— Não. Eu não, eu não... — O acuado deu um passo pra trás em defesa erguendo as palmas das mãos buscando trégua — é... tá escuro né? Então né?
— Agora está me vendo. O que acha?
— É bonita — Mentiu. Afinal, a sua frente estava a mulher que deu uma bazucada numa nave extraterrestre.
Ela avaliou a resposta com uma sobrancelha em pé e suspirou. Depois escolheu uma rocha, sentou nela, inspecionou a doze e começou encaixar as balas:
— Pegue alguma arma no meu carro, daqui a pouco eles vão entrar — ordenou ela.
Com gelo na espinha, Tomas olhou para as duas saídas da caverna, um vento frio rodopiou no corredor encurvado, e decidiu ir até o carro dela.
Sua vista já se acostumava com a baixa iluminação. Logo de cara avistou a bazuca no banco carona. Ele não sabia usar aquilo, e usar escavado numa montanha? Abandonou a ideia trágica e vistoriou os bancos traseiros. Ali havia pistolas, revolveres, até duas metralhadoras, a mulher era braba, uma era toda escura e a outra uma Ak-47, reconheceu pelo clássico punho de madeira.
— É essa aqui! — inseriu na bandoleira — São todas suas? — gritou ele do carro.
— Do meu marido. Ele era colecionador — respondeu ela lá de fora.
— E onde ele está? — Tomas se ajeitou na poltrona barulhenta e começou a preparar a arma.
— Sou viúva — Ela silenciou — a pelo menos duas horas.
Tomas a observou do carro, ela sentada na pedra terminando de inspecionar a doze. E disse:
— Não parece muito abalada.
— Se acha normal uma mulher sair por aí dando tiro de bazuca em nave espacial, pode voltar pro seu planeta rapaz! — Ela se levantou, foi em direção a parede rochosa e começou a subir os degraus que Tomas só notou a existência agora — Vai demorar muito?
Ele tentou procurar mais munições antes de sair do carro, não achou nas poltronas, arriscou no porta luvas, mas lá só tinha um par de luvas e algumas vacinas usadas, munição mesmo nada. O rapaz trancou o porta luvas e saiu do carro estranhando o peso da arma.
— Ak-47? — Questionou ela com humor enquanto subia às pedras — tá certo!
— Qual o problema com ela?
— Isso é arma de bandido! — Ela parou virando pra trás — Meu marido também gostava, mas quando descobriu o que eu pensava mudou pra M4A4. É aquela preta que estava perto dessa aí. As duas são equivalentes.
De repente, do caminho oposto ao que vieram, da curvatura do túnel, uma luz fraca surgiu e foi ganhando intensidade gradualmente até que fixou. O clarão emitia um sinal que havia pouco tempo para a dupla.
— Eles pousaram na saída! Rápido! Vem, sobe aqui, precisamos nos posicionar — disse ela apressada.
Tomas subiu capengando os degraus desproporcionais e a encontrou em cima de uma grande rocha deitada atrás de outra rocha menor com o bico da arma apontado para o caminho lá em baixo, ele se agachou do outro lado e fez o mesmo. A visão era limpa, dava pra ver os dois veículos estacionados e a parede encurvada reluzindo a luz OVNI.
Ele imaginou os aliens entrando ali, e numa curiosidade defensiva lançou uma pergunta pra moça.
— Vai conseguir resistir a eles?
— Vamos ver. Estamos armados né — respondeu ela sem tirar o olho da mira.
— Não. Não estou falando disso, estou falando de... — Tomas buscou as palavras – Atração. Não vai se atrair e meter bala em mim, vai?
Ela fez careta de nojo, afastou o olho da mira buscando o de Tomas.
— A atração não vem deles, a atração vem da nave, e eles vão ter que entrar sem ela.
— Da nave?
— Tem em volta delas alguma coisa que meche com a gente, surge um desejo danado, um desejo que bagunça nossos pensamentos, acho que... — pensou — é pela vontade de entrar na nave. Se aventurar, sei lá... — pensou de novo — Sentir esse desejo é normal... controlar isso é fidelidade, saciar é traição.
Aquelas palavras acertaram Tomas bem no rosto devido ao que ocorreu com sua esposa. Corou envergonhado ao comparar a bravura dessa estranha com a covardia de sua ex. E a moça reparou:
— Acha que ela foi interesseira?
— Não sei...
— Não se envergonhe, você não fez nada de errado, quem tem que se envergonhar é ela — A roceira observou algo lá embaixo e num susto silencioso falou — Rápido, abaixa. Tem alguma coisa...
— Como é seu nome? — Interrompeu Tomas intrigado com a guerreira ao seu lado.
— Marta.
Ela estendeu a mão ainda com a aliança, ele se apresentou, apertaram as mãos, sorriram um para o outro e voltaram a suas posições agachadas. Quando focaram de volta a luz na parede, a nuance de uma sombra encurvada surgiu nela, era magra e não se dava pra ver a cabeça, como se viesse alguém sem ela. A sombra ia diminuindo vagarosamente, insinuando que o ser estava se afastando do disco e entrando no Túnel. Tomas ficou com a mira no caminho por onde o alien chegaria, tentou se concentrar, se familiarizando com os breves sons passivos que arma fazia. Ele nunca havia usado uma AK-47, questionou pra si se estava mesmo tudo certo. Quando encostou o dedo cuidadosamente no gatilho teve dúvida se ia mesmo sair uma rajada daquilo.
— Ela está destravada — disse Marta — Relaxa. Tá tudo certo aí.
Apreensivo, Tomas se mantinha firme esperando a qualquer momento que o alienígena surgisse. A sombra foi minimizando até o tamanho humano e o inimigo surgiu no caminho. Das posições de campi, apenas Tomas conseguia ver. E o coração agitou oscilando na curiosidade de enxerga-lo melhor.
Ele caminhava devagar, cadavérico, com o corpo encurvado pra frente como um velho. Dois brilhos dourados se destacavam do seu rosto, vinham de seus olhos afinados de íris reptiliana. Havia dois buracos aonde deveria estar o nariz. Sua pele cinzenta, tinha cortes como rachaduras em terra seca, não havia pelo em parte alguma, nem na genital. Os dentes pontiagudos de cima vazavam pra fora mesmo com a boca fechada.
A criatura divagou até o carro entrando também na visão de Marta que ajeitou a pontaria ao enxerga-lo. Quando perto do veículo, fez uma investigação olfativa como um cachorro farejando fêmea. O alien esticou o pescoço pra cima, fungando mais rápido, se alertando de algo estranho no ar e uma rajada alaranjada o acertou jogando seu ombro pra trás, recuou três passadas se escorando no carro pra manter o equilíbrio. Tomas viu o cano da arma de sua parceira num leve brilho incandescente devido o fervor dos disparos.
Não era a doze, ele entendeu que ela estava com mais de uma arma, e entendeu o que estava prestes a começar.
Continua...