Céu azul: proibido
Aquele era um país muito engraçado porque um dia, de repente, mas não tão de repente assim, o céu azul não era mais gratuito.
- Tem que pagar se quiser olhar, minha senhora - disse o fiscal, crachá novo balançando no peito.
E o país ficou ainda mais engraçado porque as pessoas, depois de algumas notas de repúdio aqui e ali, aceitaram pagar - e não que todos pudessem pagar.
- Viu o novo reajuste!? - reclamavam na mesa do bar. - Um absurdo!
O país ganhou ainda mais graça porque depois, e não tão depois assim, o céu azul foi proibido.
- Tá fazendo o que aí, vagabundo!? - inqueriu o soldado, notando a cabeça virada pro alto, lá pra cima. Deu safanão na nuca e empurrou pro camburão. - Teje preso!
E o país continuou a ser muito, muito engraçado, com tanta piada, tanta tirada, gargalhada do início ao fim do jornal das oito, coisa igual ou melhor do que a graça em torno do céu azul. Chegou-se até a se esquecer toda a história com o céu azul.
- Pai, o que é isso? - perguntou a criança, dedo fino e ingênuo apontando a coisa esquisita naquela foto antiga, uma foto já meio desbotada, mas perigosamente ainda em cores.
O pai tornou-se imediatamente severo. Não porque fosse um mau pai ou porque o filho andasse mexendo onde não devia. Tornou-se severo porque a culpa, o ressentimento e o mais absurdo sentimento de perda ainda custavam a achar outra expressão que não a severidade. Esse pai, defensivamente severo, tomou a foto das mãos da criança e disse, um eco frio em cada sílaba:
- Não é nada.
E o país que era muito, muito engraçado, finalmente encontrou o dia em que a tristeza desceu do céu sem cor.