O Doutor Mexilhão viaja no tempo

O DOUTOR MEXILHÃO VIAJA NO TEMPO
Miguel Carqueija

O grande sábio Doutor Mexilhão andava muito ocupado em seu laboratório, desenvolvendo a máquina do tempo, inspirada nas histórias do Professor Papanatas e Brucutu. Com o modelo matemático já bem adiantado, Mexilhão não via a hora de dar início às planejadas incursões pelo tempo: passado e futuro.
O que ele não contava era ser assaltado ao voltar para casa certa noite, passando por uma viela deserta para encurtar caminho, esquecido que no Rio de Janeiro todo cuidado é pouco.
— Passa o dinheiro todo pra cá, bicho feio!
— Que história é essa? Eu sou o Doutor Mexilhão, tenha mais respeito!
— Mais uma palavra e te passo fogo! Vai passando a grana!
O pobre cientista foi obrigado a entregar todo o dinheiro que trazia e por fim o bandido apalpou seus bolsos mantendo a mira do 38, e pegou moedas, relógio e objetos diversos, além do celular.
— Até o meu pente?
— Está em bom estado. É só escaldá-lo, caso você tenha caspa. Agora desguia, velhinho! Cai fora e não me segue!
Mexilhão correu para casa, furioso e já com o plano de vingança na mente. Não se importava com a perda do celular, pois o mesmo estava sem chip e era puro engodo para satisfazer assaltantes. Mas o dinheiro iria fazer falta, sem dúvida! Cartão por sorte ele só levava para a rua quando saía de manhã e voltava de dia.
Mas a máquina do tempo já estava funcional, precisando apenas de alguns retoques finais. Mexilhão trabalhou febrilmente naquela madrugada e por fim conseguiu pô-la em funcionamento.
Só precisava retornar ao passado e socorrer a si mesmo.
Depois de descansar um pouco e comer qualquer coisa Mexilhão programou a máquina e, com o controle no bolso da jaqueta, retornou ao beco onde se dera o assalto. Iria atacar de surpresa, não daria chance ao bandido.
Mas estava escuro, e ele se esquecera de levar uma lanterna. Estava, porém, decidido. Assim que viu os dois vultos, investiu. Agarrou o biltre pelas costas, num abraço de urso, segurando os braços, e aí...
— Quem é você? Me solta!
Mexilhão empalideceu ao ouvir sua própria voz.
O assaltante riu desbragadamente.
— Essa foi boa! O seu irmão gêmeo é tão míope quanto você!
Mexilhão e Mexilhão se entreolharam, incrédulos.
— Agora — prosseguiu o assaltante — chega de brincadeiras. Vão passando TUDO o que tiverem!
Mexilhão 2 ficou estarrecido. O “tudo” que ele tinha no bolso incluía o controle, sem o qual não poderia reverter a viagem.
Ia ser duro ter que conviver consigo próprio.

Rio de Janeiro, 11 de dezembro de 2019 a 21 de janeiro de 2020.


(imagem pinterest)
Miguel Carqueija
Enviado por Miguel Carqueija em 28/05/2021
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