Seu grito não será ouvido

Antes do último salto pelo hiperespaço, o capitão emitiu um comunicado verbal para toda a espaçonave, algo bastante raro.

- Fala o seu comandante, ouçam todos com atenção! Ao emergirmos do hiperespaço nas coordenadas Phi Beta 439, será mantido rigoroso silêncio de rádio. Por questões de segurança, as comunicações só serão reativadas quando estivermos em órbita do planeta Calamar-IV.

Na ponte de comando, o inexperiente oficial tático olhou seu superior com preocupação.

- Alguma coisa com que deva me preocupar, capitão?

O comandante fez um gesto negativo.

- Basta que comunicações mantenha o silêncio de rádio, e vai acabar tudo bem.

O oficial de comunicações virou-se para o capitão, lá do seu console.

- Capitão... estou desativando remotamente os rádios das naves auxiliares, só por precaução.

- Bem lembrado - aprovou o comandante.

O jovem oficial tático tentou lembrar-se de alguma informação sobre as coordenadas fornecidas, e a única coisa que lhe veio à mente foi que iriam emergir próximos de um buraco negro. Mas o que isso tinha a ver com silêncio de rádio?

- Saindo do hiperespaço em 3, 2, 1 - alertou o navegador.

A visão do espaço pontilhado de estrelas encheu a tela principal: haviam emergido no ponto previsto. Um círculo escuro distorcido no centro da imagem marcava a posição do buraco negro.

- Vamos com cuidado - indicou o comandante ao navegador. - Ninguém quer ir ver aquilo por dentro...

Com infinita cautela, a espaçonave contornou a anomalia gravitacional e tomou o rumo de Calamar-IV. O silêncio na ponte de comando era tanto, que podia ouvir-se o zumbido dos motores na casa de máquinas, três níveis abaixo.

- OK, acho que conseguimos - falou finalmente o comandante.

Uma lâmpada amarela começou a piscar insistentemente no console de comunicação; o operador voltou-se novamente para o comandante, expressão interrogativa.

- Nem pensar - foi a resposta do superior, mão erguida.

Todos voltaram a fazer silêncio, até que finalmente a espaçonave entrou em órbita do planeta oceânico onde iriam pousar.

- Comunicações liberadas - informou o comandante. - Avise à base que em cinco minutos estaremos lá.

- Positivo - replicou o oficial, apertando um botão no console.

Ao desembarcar na ilha onde os terrestres haviam construído sua base, o oficial tático avistou sua equivalente na equipe de solo e resolveu perguntar-lhe o que poderia estar por trás da ordem de silêncio de rádio. A mulher sorriu ao ouvir o relato.

- Sereias, meu caro.

- Sereias... no espaço? - Questionou ele, incrédulo.

- O som não é transmitido no vácuo... mas ondas de rádio, sim - replicou ela. - Algumas das nossas astronaves receberam transmissões misteriosas ao passarem próximas do buraco negro, e resolveram investigar; nenhuma delas voltou.

- Portanto... - começou a dizer ele, atônito.

- Sereias, é claro - afirmou a oficial, muito séria.

- [13-05-2021]