Os Anjos do Futuro
Um dos maiores mistérios que tem intrigado os pensadores de todas as épocas é o tempo. Por meio dele todo o Universo veio a ser, e a Humanidade, que tem o privilégio da consciência, sucede-se pelos séculos e séculos sem que saibamos até quando. Se algo sabemos é que nós, os viventes de agora, somos mais um degrau nessa escada que parece nos levar ao infinito, de modo que conseguimos ter ideia dos degraus inferiores por meio da História, porém dos superiores fazemos apenas conjecturas. No entanto, e se a Humanidade, num ápice de conhecimento e desenvolvimento tecnológico, revertesse essa lei inexorável da Natureza, subjugando o deus Cronos?
Na história que se segue, nossos irmãos humanos, estão vivendo a quase cento e vinte mil séculos além da nossa era, contudo, por mais espantoso que pareça, suas ações tem o poder de influenciar diretamente as nossas vidas.
Numa nave espacial a alguns milhares de anos-luz do planeta Terra, dois anciãos conversam amistosamente, enquanto aguardam que o piloto robô os leve de volta ao lar:
— É o que lhe digo Ruzius, este artefato mudará completamente a forma como nós vemos o período Beta. Esse período que teve o seu apogeu no século 50.000 d.C, cerca de cinco milhões de anos depois do nascimento daquele maravilhoso homem que dividiu a história.
Ruzius balançou a cabeça concordando com Claudius.
— E pensar que eles quase extinguiram a espécie humana junto com a nossa amada Terra, mas graças às ideias elevadas que sempre estiverem presentes no espírito humano como a nascente pura e cristalina de um rio poluído, nós, humanos, ainda estamos aqui, quinhentos e vinte dois milhões de anos depois do nascimento de Jesus Cristo. — concluiu Ruzius.
Claudius tinha nas mãos um objeto parecido com um relógio de bolso. No centro, um ponto brilhante dava origem a uma série de círculos concêntricos cada vez maiores, até que nas extremidades sete triângulos faziam lembrar o desenho de uma estrela. Uma luz azulada circulava constantemente pelo objeto e de quando em quando atingia o zênite nos triângulos. O misterioso artefato tinha treze centímetros de altura e pesava pouco menos de quatrocentos gramas.
— É um magnífico engenho! — exclamou Claudius — Com ele conseguiremos finalmente tentar impedir explosão das dezessete bombas atômicas que quase exterminaram a raça humana naquele horrível século XX...
— Se impedíssemos Hitler de conseguir a bomba atômica, muito sofrimento humano já deixaria de existir. — afirmou Ruzius.
— Concordo com você, meu camarada, mas infelizmente não conseguiremos impedir que algumas bombas sejam lançadas...
— É triste... Mas quem sabe o socialismo...
— Socialismo ou Comunismo como vivemos hoje, nessa época ainda será algo distante e que encontrará resistência sanguinária daqueles que não querem perder seus privilégios, além disso, muito sangue foi derramado em nome desse ideal.
— É lamentável que homens violentos tenham sujado de sangue essa mais nobre das aspirações sociais. Mas, sem a luta por esse paraíso na Terra, jamais chegaríamos a esse estágio de paz universal que alcançamos hoje.
Os anciãos ficaram um momento em silêncio.
— Ora, Ruzius, se eliminarmos todo o mal do passado você não acha que isso pode refletir negativamente no nosso mundo atual?
— Não, Claudius, pois penso que o bem só pode levar ao bem... E se retirarmos o mal só sobra o bem.
— Então você pensa como a minha neta, Lulia... — disse Claudius cofiando sua longa barba grisalha.
— Lulia desde cedo mostrou vocação para as alterações temporais, ela será uma agente de Deus bem melhor do que nós.
— Sem dúvida, o Ser Supremo age no espaço-tempo por meio de nós, mas sua bondade fica mais evidente em pessoas como Lulia.
— A propósito, foi ela a primeira a fazer contato com os nossos irmãos que estão a oitocentos milhões de anos acima de nós e que nos trouxeram esse maravilhoso artefato...
Nesse momento, o piloto robô exclamou:
— Senhores! Já chegamos. Estamos de volta à Terra!
— Ah, querido Computador... — disse Ruzius — Obrigado pela presteza de nos levar nessa viagem de ida e volta a uma galáxia tão distante!
A nave pousou numa estrutura gigante semelhante a um prédio, mas cuja base não se fincava no chão e parecia flutuar. Os homens desceram do veículo espacial e entraram num grande salão a procura de Lulia. Homens e mulheres andando atarefados paravam um momento para saudar os dois anciãos. Foi quando uma linda jovem de cabelos azuis apareceu:
— Vovô, você voltou... Quanta saudade eu senti!
— Lulia, minha querida, apesar dos meus cento e setenta anos ainda saio por aí em busca de aventuras! — disse Claudius, enquanto abraçava sua neta.
— E pensar que houve uma época em que era impossível viver até essa idade, eu já estou com cento e cinquenta e cinco! — disse Ruzius, rindo.
— Senhor Ruzius, que bom que voltou! — exclamou Lulia.
Todos riam felizes.
Claudius mostrou o artefato que fora o motivo da viagem.
— Deixe-me vê-lo vovô?... Hum... Jamais teríamos condições de desenvolvê-lo nessas época.
— É uma tecnologia e tanto desde que o homem pré-histórico inventou a pedra lascada, hein?
Ruzius e Lulia riram espantados.
— Diga-me Lulia, é verdade que esse artefato evitará a quase extinção da humanidade no século vinte? — arguiu Ruzius.
— Sim. Infelizmente não conseguiremos impedir as grandes guerras mundiais, mas impediremos que os nazistas desenvolvam a bomba a atômica, evitando assim todo aquele horror que quase destruiu a humanidade.
A jovem pareceu meditar e, por fim, concluiu:
— Deus sabe o que faz. Nós mesmos estávamos lá.
Essa última frase de Lulia pareceu aos anciãos um tanto enigmática, mas logo a compreenderam.
Hoje, vivendo no século XXI, temos consciência de que o século passado foi o mais mortífero da história, mas nos escapa o fato de que, sem as intervenções desses humanos ou anjos do futuro, a ameaça atômica que ainda paira no ar seria muito mais do que um fantasma, e todo o horror da guerra nos teria atingido em uma extensão jamais vista.
Por outro lado, podemos ter a certeza de que o futuro da humanidade ainda guarda maravilhas jamais sonhadas pelos amantes da ficção científica, e se de alguma forma sobrevivermos, não será em vão.