No Refúgio de Lamok
Yv Tahr havia marcado um encontro com Jo Mara no Refúgio de Lamok, um restaurante típico na parte velha de Kobana Tal, junto ao rio que cortava a cidade. Na noite sem lua de Rorqal-IV, a estrela secundária do sistema, uma anã vermelha denominada simplesmente de Rorqal B, brilhava como uma estrela de média grandeza.
- A especialidade da casa é patas de quni ao forno - adiantou Tahr, quando sentaram-se à uma mesa nos fundos do salão de jantar.
Jo Mara examinou-o com atenção; o homem vestia-se de preto, como um executivo, e parecia bem-educado, mas não havia como definir exatamente o que ele era. Pensou em usar um dos seus truques de controle mental, mas decidiu que seria melhor deixar Tahr falar primeiro.
- Não vim pelo jantar - retrucou. - Diga logo o que quer comigo.
Tahr deu de ombros.
- Imaginei que Pah Tamor iria enviar um preposto para participar desta licitação - declarou Tahr. - Afinal, não é todo dia que alguém se arrisca a colocar um Olho de Agothar para desbloqueio em licitação, e ele quer muito pôr as mãos num. Da mesma forma, Kah Summ, e o governo local.
- Você também, imagino - avaliou Jo Mara.
- O grupo ao qual represento, quer dizer - replicou Tahr. - Afinal, este não é um Olho de Agothar comum; é o próprio dispositivo-mestre, aquele que pode reprogramar todos os outros.
Jo Mara ergueu as sobrancelhas; bem, isso era algo que Pah Tamor não havia lhe dito. Nem conseguia imaginar o valor do artefato, se é que podia ser mensurado; certamente, ultrapassava a casa das dezenas de milhões de créditos.
- Surpresa? - Indagou Tahr, encarando-a com ar divertido. - Seu antigo mentor não havia lhe dito, não é?
- Talvez não considerasse a informação essencial - respondeu Jo Mara, aborrecida. - O combinado era apenas quebrar a proteção, eu sequer iria colocar as mãos no dispositivo.
- Mas agora, tudo mudou, não é mesmo? Está começando a imaginar que o jogo talvez seja um pouco maior do que imaginou, correto?
- Quem é o seu grupo? - Atalhou Jo Mara, de modo incisivo.
- Represento o Consórcio Natthyr de Rowera Central - informou Tahr calmamente. - Já deve ter ouvido falar de nós.
Os Natthyr, recordou-se Jo Mara, eram uma influente casa comercial que controlavam centenas de mundos próximos ao Núcleo Galáctico, o mais importante deles sendo Rowera Central.
- Kah Summ também tem essa informação? Sobre o artefato? - Indagou Jo Mara.
- Por ora, apenas nós, do Consórcio, Pah Tamor, e agora você, sabem o que realmente temos aqui, em Rorqal. Pah Tamor a enviou justamente para que desbloqueasse o Olho de Agothar antes que Summ o fizesse e descobrisse do que se trata; imagino que Summ preferirá ficar com o dispositivo para si próprio, em vez de receber o dinheiro da licitação.
- Creio que sim - assentiu Jo Mara. - Entendo a sua urgência em ter a questão resolvida antes da abertura dos envelopes, mas porque se arriscou a me contar a verdade, sabendo que agora posso exigir muito mais do que os 50 mil créditos que me ofereceu?
- É um risco que corro - admitiu Tahr. - Mas os 50 mil seriam somente a primeira parte do seu pagamento; se resolver positivamente esta situação para o Consórcio, terá mais contratos valiosos de arquelogia para explorar, do que teve até hoje. Nunca mais precisará sujar as mãos em troca de ninharias.
Um último trabalho desonesto, pensou Jo Mara; e depois, apenas trabalho decente e bem remunerado. Poderia até comprar uma astronave bem equipada para seus deslocamentos pela Galáxia, em vez de viajar em naves alugadas...
- Quero 25 mil adiantados - disse ela por fim.
- Você entende bem rápido - aprovou Tahr, com um sorriso.
[Continua]
- [23-12-2020]