A Estranha História de William Cobb
Parte I – A Chegada
Ele apareceu na pequena cidade assim sem mais nem menos. Do nada. Não falava coisa que fizesse sentido, embora tivesse jeito de gente inteligente. Tinha um sotaque estranho, um que eu nunca tinha ouvido antes. A roupa era daquelas que as pessoas usam em festas, embora atualmente possamos dizer que há pouca diferença entre as mesmas e as que as que se usam no dia a dia. Ele era a conversa da cidade. O boato era que um policial havia detido o estranho, mas achou que ele era meio louco e melhor seria deixar o assunto de lado. Sabe, essas coisas dão muito trabalho, papelada, promotor público, relatórios. A história das roupas eu já tinha desvendado por conta própria. Vi uma notícia no jornal local a respeito de um fulano nu que entrou numa loja de roupas especiais para bailes, juntou algumas peças e saiu correndo. Só podia ser ele. Mas por que estava nu? De onde surgira? Obviamente, com o susto, ninguém foi atrás dele. Mais tarde registraram o caso na polícia. Todos que tinham tido contato com ele – eu me incluo na lista - diziam que ele era calmo e não representava perigo.
William Cobb era seu nome. Pelo menos foi o que me disse quando falei com ele pela primeira vez. Cobb era educado, esperto, mas parecia assustado. Olhava tudo com muita atenção, como se tentasse reconhecer o ambiente. Com o tempo passamos a nos encontrar quase regularmente. Aos poucos fui me acostumando com seu jeito, com sua linguagem e tudo mais. Falava coisas desconexas. Aparentemente ele teve algum problema mental, talvez alguma experiência traumática. Nossa cidade, Alliance, Nebraska, ele conhecia de nome, mas ele “achava” que era de Lincoln, a capital. Não sabia como tinha vindo parar ali, a uma distância de quase 400 milhas. Pensei em levá-lo para lá e descobrir algo, mas ele se recusou, disse que não estava preparado, queria se lembrar melhor de tudo. Falou que todo dia novas imagens vinham a sua mente, às vezes simples palavras, as vezes figuras humanas. Algumas palavras ou frases vinham do nada e na maioria das vezes não tinham uma imagem correspondente, eram apenas um amontoado de sílabas.
Não sabia o que pensar da situação toda. No começo todas as pessoas – a cidade era muito pequena - estavam como eu, interessadas, curiosas, imaginando mil coisas. Dá para imaginar o que gente com pouca coisa para fazer, pode pensar. Mas depois vem a rotina. Cobb se incorporou à paisagem, era o “louquinho” da cidade, não fazia mal a ninguém, tudo bem. No entanto, para mim havia ali algo de especial. Conversava praticamente todos os dias com ele. Minha mulher concordou e oferecemos um quarto para ele usar até que se estabelecesse, mas ele recusou. Supostamente as coisas deveriam ir ficando mais claras conforme o tempo fosse passando, mas, ao contrário, mais perguntas iam surgindo das minhas conversas com Cobb. Uma vez me disse, por exemplo, que já tinha visto fotos de Alliance, agora se lembrava, mas eram muito diferentes do que estava vendo ali. O que estava presenciando, tudo, os objetos , as pessoas, os prédios, pareciam algo do passado, uma paisagem antiga.
Segundo ele, havia pelo menos uma via expressa e uma outra estrada bem larga que ali não estavam. Era como se ele fosse do futuro. Nas fotos que ele tinha visto, as pessoas usavam roupas completamente diferentes daquelas. Os carros, esses então, definitivamente nada tinham a ver com os carros das fotografias que vira. Mas ele reconhecia os mesmos por causa de filmes antigos que tinha assistido.
Era o ano de 1988. Muito do que vemos hoje, naquela época ainda podia ser considerada como pertencente ao reino da ficção científica. Por isso estranhei muito quando William um dia me falou de telefones enviando imagens instantâneas, de drones e muitas outras esquisitices. Ele me dizia que a data parecia correta – 1988 – mas tudo mais parecia ter voltado. Andou lendo material na biblioteca, jornais, revistas e ele praticamente sabia de tudo, mas as datas estavam embaralhadas. Achou que tinha definitivamente enlouquecido. Tudo que via e lia pareciam ter acontecido há 20 ou 30 anos atrás. O que para ele era atual havia desaparecido e as datas dos jornais e das revistas pareciam estar erradas.
A essa altura eu estava certo de ele que precisava da ajuda de um psiquiatra. Antes de ver um médico para a cabeça, no entanto, achei que ele deveria ver um médico regular, pois as duas pequenas queimaduras, uma na testa e outra no pescoço, que tinha desde o primeiro dia, haviam aumentado bastante. Falei com ele sobre isto, mas ele não me respondeu. Seu pensamento estava distante. Algo estava mudando em sua mente, tinha certeza disso. Talvez a vida que ele estava levando, dormindo aqui e ali, em bancos de praças, no mato, comendo alimento que as pessoas lhe davam, estivesse mexendo com seu orgulho, talvez o que quer que seja que lhe tenha acontecido, agora estava realmente pesando. Não foi falta de convidar: várias vezes para passar uns dias em casa, para passar fim de semana, para jantar. Nunca aceitou, mas sempre agradeceu polidamente. Tinha deixado meu número de telefone com ele para alguma emergência, mas ele nunca ligava. Normalmente eu o encontrava no final do dia, no caminho de casa. Estava sentado em dos bancos da praça. Sempre passava algum tempo com ele, conversava. Mais de dois meses haviam se passado desde que ele “aparecera” na nossa comunidade.
Parte II – A Revelação
Assim foi que, naquela manhã de domingo, seu telefonema me surpreendeu. Para ele ligar, algo bem diferente deveria ter acontecido. Ele estava bastante alterado do outro lado da linha, quando o atendi. Falava rápido e um tanto descompassado. Perguntou-me se eu poderia vê-lo imediatamente. Tinha se lembrado de tudo e precisava falar comigo. Peguei o carro e em vinte minutos estava no lugar combinado. Pediu-me para levá-lo a um ponto nos arredores da cidade. Paramos ao longo de um grande terreno sem construção, com algumas pequenas árvores espalhadas lá e acolá. Antes de sair do carro, entretanto, contou-me a história mais fantástica que já tinha ouvido em minha vida. Seu pai era um professor de física, Robert Cobb, que trabalhava para o governo em um projeto secreto de física quântica, algo relacionado com teletransporte, viagem no tempo etc. Cheguei a pensar que estava brincando, mas não, estava falando sério, ou pelo menos ele achava que sim.
Ele era o chefe de pesquisas e trabalhava em Lincoln, capital do Nebraska. O ano? Pasmem, 2039! O pai tinha tanta certeza de que tinha conseguido descobrir algo fantástico que resolveu fazer um experimento com o próprio filho, William, que era solteiro e igualmente fascinado pelo assunto. O pai, físico de altíssima capacidade, era o único capaz de trazer “o viajante do tempo” de volta. Por isso precisava ficar para o caso de uma emergência, talvez para fazer uma operação de resgate de volta para 2039 se algo desse errado. Diante de minha incredulidade, Cobb me explicou que de 2033 até 2037, ocorreram (ou ocorrerão?) descobertas fantásticas, desencadeadas por inesperados eventos na história da ciência, eventos que normalmente só aconteceriam daqui a 200 anos. É difícil acreditar, ele repetia a toda hora, mas era verdade. Ele me explicou que era impossível viajar para o futuro, mas perfeitamente possível para o passado. Imagine, disse ele, você falar para um homem da Idade Média que o homem iria para a Lua em 1969! Você deve estar sentindo o mesmo, mas, garanto, é normal ou vai ser, ele repetia. Ele me disse que seu pai recomendou inúmeras vezes que, se ele acordasse ou aparecesse em algum lugar distante, para não se desesperar, para marcar bem o lugar. O aparelho de transporte “não viaja” – permanece exatamente no mesmo ponto - e ele não conseguiria vê-lo, embora estivesse ali – “numa outra época”. Não sabia explicar por que ele aparecera em Alliance e não em Lincoln: talvez um acidente quântico. Muitos fatos ainda não tinham explicação. William me explicou que, no entanto, ele teria de ficar dentro de uma área distante não mais de três metros do ponto aonde chegara para que o aparelho de 2039 o alcançasse de volta. O que aconteceu no entanto, foi que, alguma coisa afetou sua cabeça durante o evento e quando se deu conta, estava andando nu numa estrada de Alliance. Tudo mudara agora. Ele se lembrava do local exato, até de um arbusto com flores amarelas, que foi a primeira coisa que tinha visto por ocasião da chegada de sua jornada. Saiu então do carro e me pediu para acompanhá-lo. Mostrou-me o arbusto, e a pequena área que aparentemente havia sido “chamuscada” por algo. Tenho de ficar aqui, me disse ele. Meu pai deve estar tentando me trazer de volta. Ele só pode ligar a máquina durante meia hora por dia por motivos técnicos. Ele deve estar tentando, ele me disse, ofegante. Eu queria acreditar, desejava mesmo que fosse verdade, mas meu bom senso não me permitia. Pensei então que, definitivamente, William precisava de um tratamento psiquiátrico. Fui honesto com ele e disse o que pensava. Ele me falou então que sua memória estava prejudicada, mas havia fatos de que ele podia se lembrar de ter lido sobre os anos 90 e 91, que estavam por vir. Disse-me que a União Soviética iria desaparecer, e que haveria uma guerra no Iraque. Falou que talvez isso me ajudasse a acreditar nele depois que ele se fosse. Disse também que não sabia onde seu pai estava naquele momento do tempo, embora já tivesse nascido, mas talvez eu pudesse achá-lo. "Claro, ele não vai entender, porque tudo isso ainda não aconteceu, mas eu sei que agora ele já é um professor de física."
Parte III – A Volta
Fiz de tudo para trazer William de volta para a cidade, mas ele estava obcecado e não queria sair dali. Passei algumas horas e depois desisti, precisava voltar para casa, pois minha família deveria estar preocupada. Eu me despedi e ele respondeu com um adeus que parecia sincero e definitivo. Me agradeceu com um ar de quem diz “um dia você vai entender”.
Foi a última vez que vi William Cobb. No dia seguinte, depois do trabalho não voltei para casa. Ao contrário me dirigi para o terreno onde o havia visto pela última vez. Para minha surpresa, suas roupas estavam lá no chão, vazias, camisa abotoada, como se ele tivesse “evaporado”. Olhei para todos os lados, andei pelo terreno todo e não achei o William. Fiquei em dúvida, mas acabei levando sua roupa para casa. Aparentemente na cidade ninguém se preocupou com o desaparecimento de William. Ele se foi como chegou: como um fantasma.
Procurei esquecer o assunto, mas nos meses seguintes sua imagem não me saía da cabeça. Resolvi então fazer o que deveria ser o óbvio: tentar achar o nome de “seu pai” na lista telefônica de Lincoln. Estava com dificuldade de aceitar a história de William ou talvez não quisesse participar de sua loucura e por isso demorei para tomar a decisão. Senti um calafrio quando descobri que existia sim um tal de Robert Cobb. Pensei muito antes de ligar, mas finalmente criei coragem. Inventei uma desculpa para iniciar o assunto. Havia conhecido uma pessoa com o mesmo sobrenome dele e queria saber se o conhecia, se era parente etc. Quando falei o nome “William Cobb”, ele riu do outro lado da linha. Perguntei por que estava rindo. Eu conheço sim, me disse ele, mas tenho certeza de que você não o encontrou. Ele ainda não nasceu, mas é o nome que pretendo dar para meu primeiro filho. Minha mulher e eu já combinamos. Gelei e perguntei se poderia vê-lo se passasse por Lincoln. Claro, quando quiser, mas vai ser mais fácil você me encontrar na Universidade. Antes de eu perguntar, ele me disse, com orgulho – podia sentir a vibração de sua voz – que era professor de física. Nunca tive coragem de encontrar o sr. Robert Cobb. Acho que ele, por mais que sua mente fosse aberta, iria rir da minha história.
Uma coisa é ler uma história de ficção científica e outra coisa é “viver” uma história dessas. O contato com uma experiência desse tipo é, embora fascinante, assustadora. De certa forma eu não queria acreditar nas “evidências”. Antes de escrever esta história – achei que tinha obrigação de fazê-lo – ainda passei por duas situações que me causaram arrepios. A primeira foi quando assistia a CNN em 18 de janeiro de 1991. As imagens da operação “Desert Storm” trouxeram-me imagens vivíssimas de William. Meses mais tarde, pela segunda vez, senti arrepios: uma grande manchete de um jornal local comunicava o colapso oficial da União Soviética. Era 26 de dezembro de 1991. Apesar do pavor que às vezes sinto, gostaria de viver até 2039 e talvez conhecer pela segunda vez William Cobb. Claro, depois de sua volta para o futuro...
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Parte I – A Chegada
Ele apareceu na pequena cidade assim sem mais nem menos. Do nada. Não falava coisa que fizesse sentido, embora tivesse jeito de gente inteligente. Tinha um sotaque estranho, um que eu nunca tinha ouvido antes. A roupa era daquelas que as pessoas usam em festas, embora atualmente possamos dizer que há pouca diferença entre as mesmas e as que as que se usam no dia a dia. Ele era a conversa da cidade. O boato era que um policial havia detido o estranho, mas achou que ele era meio louco e melhor seria deixar o assunto de lado. Sabe, essas coisas dão muito trabalho, papelada, promotor público, relatórios. A história das roupas eu já tinha desvendado por conta própria. Vi uma notícia no jornal local a respeito de um fulano nu que entrou numa loja de roupas especiais para bailes, juntou algumas peças e saiu correndo. Só podia ser ele. Mas por que estava nu? De onde surgira? Obviamente, com o susto, ninguém foi atrás dele. Mais tarde registraram o caso na polícia. Todos que tinham tido contato com ele – eu me incluo na lista - diziam que ele era calmo e não representava perigo.
William Cobb era seu nome. Pelo menos foi o que me disse quando falei com ele pela primeira vez. Cobb era educado, esperto, mas parecia assustado. Olhava tudo com muita atenção, como se tentasse reconhecer o ambiente. Com o tempo passamos a nos encontrar quase regularmente. Aos poucos fui me acostumando com seu jeito, com sua linguagem e tudo mais. Falava coisas desconexas. Aparentemente ele teve algum problema mental, talvez alguma experiência traumática. Nossa cidade, Alliance, Nebraska, ele conhecia de nome, mas ele “achava” que era de Lincoln, a capital. Não sabia como tinha vindo parar ali, a uma distância de quase 400 milhas. Pensei em levá-lo para lá e descobrir algo, mas ele se recusou, disse que não estava preparado, queria se lembrar melhor de tudo. Falou que todo dia novas imagens vinham a sua mente, às vezes simples palavras, as vezes figuras humanas. Algumas palavras ou frases vinham do nada e na maioria das vezes não tinham uma imagem correspondente, eram apenas um amontoado de sílabas.
Não sabia o que pensar da situação toda. No começo todas as pessoas – a cidade era muito pequena - estavam como eu, interessadas, curiosas, imaginando mil coisas. Dá para imaginar o que gente com pouca coisa para fazer, pode pensar. Mas depois vem a rotina. Cobb se incorporou à paisagem, era o “louquinho” da cidade, não fazia mal a ninguém, tudo bem. No entanto, para mim havia ali algo de especial. Conversava praticamente todos os dias com ele. Minha mulher concordou e oferecemos um quarto para ele usar até que se estabelecesse, mas ele recusou. Supostamente as coisas deveriam ir ficando mais claras conforme o tempo fosse passando, mas, ao contrário, mais perguntas iam surgindo das minhas conversas com Cobb. Uma vez me disse, por exemplo, que já tinha visto fotos de Alliance, agora se lembrava, mas eram muito diferentes do que estava vendo ali. O que estava presenciando, tudo, os objetos , as pessoas, os prédios, pareciam algo do passado, uma paisagem antiga.
Segundo ele, havia pelo menos uma via expressa e uma outra estrada bem larga que ali não estavam. Era como se ele fosse do futuro. Nas fotos que ele tinha visto, as pessoas usavam roupas completamente diferentes daquelas. Os carros, esses então, definitivamente nada tinham a ver com os carros das fotografias que vira. Mas ele reconhecia os mesmos por causa de filmes antigos que tinha assistido.
Era o ano de 1988. Muito do que vemos hoje, naquela época ainda podia ser considerada como pertencente ao reino da ficção científica. Por isso estranhei muito quando William um dia me falou de telefones enviando imagens instantâneas, de drones e muitas outras esquisitices. Ele me dizia que a data parecia correta – 1988 – mas tudo mais parecia ter voltado. Andou lendo material na biblioteca, jornais, revistas e ele praticamente sabia de tudo, mas as datas estavam embaralhadas. Achou que tinha definitivamente enlouquecido. Tudo que via e lia pareciam ter acontecido há 20 ou 30 anos atrás. O que para ele era atual havia desaparecido e as datas dos jornais e das revistas pareciam estar erradas.
A essa altura eu estava certo de ele que precisava da ajuda de um psiquiatra. Antes de ver um médico para a cabeça, no entanto, achei que ele deveria ver um médico regular, pois as duas pequenas queimaduras, uma na testa e outra no pescoço, que tinha desde o primeiro dia, haviam aumentado bastante. Falei com ele sobre isto, mas ele não me respondeu. Seu pensamento estava distante. Algo estava mudando em sua mente, tinha certeza disso. Talvez a vida que ele estava levando, dormindo aqui e ali, em bancos de praças, no mato, comendo alimento que as pessoas lhe davam, estivesse mexendo com seu orgulho, talvez o que quer que seja que lhe tenha acontecido, agora estava realmente pesando. Não foi falta de convidar: várias vezes para passar uns dias em casa, para passar fim de semana, para jantar. Nunca aceitou, mas sempre agradeceu polidamente. Tinha deixado meu número de telefone com ele para alguma emergência, mas ele nunca ligava. Normalmente eu o encontrava no final do dia, no caminho de casa. Estava sentado em dos bancos da praça. Sempre passava algum tempo com ele, conversava. Mais de dois meses haviam se passado desde que ele “aparecera” na nossa comunidade.
Parte II – A Revelação
Assim foi que, naquela manhã de domingo, seu telefonema me surpreendeu. Para ele ligar, algo bem diferente deveria ter acontecido. Ele estava bastante alterado do outro lado da linha, quando o atendi. Falava rápido e um tanto descompassado. Perguntou-me se eu poderia vê-lo imediatamente. Tinha se lembrado de tudo e precisava falar comigo. Peguei o carro e em vinte minutos estava no lugar combinado. Pediu-me para levá-lo a um ponto nos arredores da cidade. Paramos ao longo de um grande terreno sem construção, com algumas pequenas árvores espalhadas lá e acolá. Antes de sair do carro, entretanto, contou-me a história mais fantástica que já tinha ouvido em minha vida. Seu pai era um professor de física, Robert Cobb, que trabalhava para o governo em um projeto secreto de física quântica, algo relacionado com teletransporte, viagem no tempo etc. Cheguei a pensar que estava brincando, mas não, estava falando sério, ou pelo menos ele achava que sim.
Ele era o chefe de pesquisas e trabalhava em Lincoln, capital do Nebraska. O ano? Pasmem, 2039! O pai tinha tanta certeza de que tinha conseguido descobrir algo fantástico que resolveu fazer um experimento com o próprio filho, William, que era solteiro e igualmente fascinado pelo assunto. O pai, físico de altíssima capacidade, era o único capaz de trazer “o viajante do tempo” de volta. Por isso precisava ficar para o caso de uma emergência, talvez para fazer uma operação de resgate de volta para 2039 se algo desse errado. Diante de minha incredulidade, Cobb me explicou que de 2033 até 2037, ocorreram (ou ocorrerão?) descobertas fantásticas, desencadeadas por inesperados eventos na história da ciência, eventos que normalmente só aconteceriam daqui a 200 anos. É difícil acreditar, ele repetia a toda hora, mas era verdade. Ele me explicou que era impossível viajar para o futuro, mas perfeitamente possível para o passado. Imagine, disse ele, você falar para um homem da Idade Média que o homem iria para a Lua em 1969! Você deve estar sentindo o mesmo, mas, garanto, é normal ou vai ser, ele repetia. Ele me disse que seu pai recomendou inúmeras vezes que, se ele acordasse ou aparecesse em algum lugar distante, para não se desesperar, para marcar bem o lugar. O aparelho de transporte “não viaja” – permanece exatamente no mesmo ponto - e ele não conseguiria vê-lo, embora estivesse ali – “numa outra época”. Não sabia explicar por que ele aparecera em Alliance e não em Lincoln: talvez um acidente quântico. Muitos fatos ainda não tinham explicação. William me explicou que, no entanto, ele teria de ficar dentro de uma área distante não mais de três metros do ponto aonde chegara para que o aparelho de 2039 o alcançasse de volta. O que aconteceu no entanto, foi que, alguma coisa afetou sua cabeça durante o evento e quando se deu conta, estava andando nu numa estrada de Alliance. Tudo mudara agora. Ele se lembrava do local exato, até de um arbusto com flores amarelas, que foi a primeira coisa que tinha visto por ocasião da chegada de sua jornada. Saiu então do carro e me pediu para acompanhá-lo. Mostrou-me o arbusto, e a pequena área que aparentemente havia sido “chamuscada” por algo. Tenho de ficar aqui, me disse ele. Meu pai deve estar tentando me trazer de volta. Ele só pode ligar a máquina durante meia hora por dia por motivos técnicos. Ele deve estar tentando, ele me disse, ofegante. Eu queria acreditar, desejava mesmo que fosse verdade, mas meu bom senso não me permitia. Pensei então que, definitivamente, William precisava de um tratamento psiquiátrico. Fui honesto com ele e disse o que pensava. Ele me falou então que sua memória estava prejudicada, mas havia fatos de que ele podia se lembrar de ter lido sobre os anos 90 e 91, que estavam por vir. Disse-me que a União Soviética iria desaparecer, e que haveria uma guerra no Iraque. Falou que talvez isso me ajudasse a acreditar nele depois que ele se fosse. Disse também que não sabia onde seu pai estava naquele momento do tempo, embora já tivesse nascido, mas talvez eu pudesse achá-lo. "Claro, ele não vai entender, porque tudo isso ainda não aconteceu, mas eu sei que agora ele já é um professor de física."
Parte III – A Volta
Fiz de tudo para trazer William de volta para a cidade, mas ele estava obcecado e não queria sair dali. Passei algumas horas e depois desisti, precisava voltar para casa, pois minha família deveria estar preocupada. Eu me despedi e ele respondeu com um adeus que parecia sincero e definitivo. Me agradeceu com um ar de quem diz “um dia você vai entender”.
Foi a última vez que vi William Cobb. No dia seguinte, depois do trabalho não voltei para casa. Ao contrário me dirigi para o terreno onde o havia visto pela última vez. Para minha surpresa, suas roupas estavam lá no chão, vazias, camisa abotoada, como se ele tivesse “evaporado”. Olhei para todos os lados, andei pelo terreno todo e não achei o William. Fiquei em dúvida, mas acabei levando sua roupa para casa. Aparentemente na cidade ninguém se preocupou com o desaparecimento de William. Ele se foi como chegou: como um fantasma.
Procurei esquecer o assunto, mas nos meses seguintes sua imagem não me saía da cabeça. Resolvi então fazer o que deveria ser o óbvio: tentar achar o nome de “seu pai” na lista telefônica de Lincoln. Estava com dificuldade de aceitar a história de William ou talvez não quisesse participar de sua loucura e por isso demorei para tomar a decisão. Senti um calafrio quando descobri que existia sim um tal de Robert Cobb. Pensei muito antes de ligar, mas finalmente criei coragem. Inventei uma desculpa para iniciar o assunto. Havia conhecido uma pessoa com o mesmo sobrenome dele e queria saber se o conhecia, se era parente etc. Quando falei o nome “William Cobb”, ele riu do outro lado da linha. Perguntei por que estava rindo. Eu conheço sim, me disse ele, mas tenho certeza de que você não o encontrou. Ele ainda não nasceu, mas é o nome que pretendo dar para meu primeiro filho. Minha mulher e eu já combinamos. Gelei e perguntei se poderia vê-lo se passasse por Lincoln. Claro, quando quiser, mas vai ser mais fácil você me encontrar na Universidade. Antes de eu perguntar, ele me disse, com orgulho – podia sentir a vibração de sua voz – que era professor de física. Nunca tive coragem de encontrar o sr. Robert Cobb. Acho que ele, por mais que sua mente fosse aberta, iria rir da minha história.
Uma coisa é ler uma história de ficção científica e outra coisa é “viver” uma história dessas. O contato com uma experiência desse tipo é, embora fascinante, assustadora. De certa forma eu não queria acreditar nas “evidências”. Antes de escrever esta história – achei que tinha obrigação de fazê-lo – ainda passei por duas situações que me causaram arrepios. A primeira foi quando assistia a CNN em 18 de janeiro de 1991. As imagens da operação “Desert Storm” trouxeram-me imagens vivíssimas de William. Meses mais tarde, pela segunda vez, senti arrepios: uma grande manchete de um jornal local comunicava o colapso oficial da União Soviética. Era 26 de dezembro de 1991. Apesar do pavor que às vezes sinto, gostaria de viver até 2039 e talvez conhecer pela segunda vez William Cobb. Claro, depois de sua volta para o futuro...
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