Tenham suas armas prontas
"Come my tan-faced children,
Follow well in order, get your weapons ready,
Have you your pistols? have you your sharp-edged axes?
Pioneers! O pioneers!"
- "Pioneers! O pioneers!", Walt Whitman.
Ele podia ouvir tudo, mas não ousou abrir os olhos até que todo o movimento cessasse. Quando a cápsula finalmente parou de rolar alucinadamente sobre o próprio eixo e bateu contra algo que a freou, uma cacofonia de alarmes fez com que finalmente olhasse ao redor para avaliar a extensão do estrago. A cabine apertada estava mergulhada numa luz sangrenta, onde lâmpadas piloto piscavam desordenadamente em painéis avariados. Ergueu o braço e começou a desligar vários circuitos usados em navegação orbital e agora perfeitamente inúteis sobre a superfície do planeta. Em seguida, apanhou o microfone do transceptor e chamou o controle de solo:
- Pioner-I para base! Pioner-I para base! Major Ippolit Tikhonovich chamando!
Pelo alto-falante do painel, apenas estática. O cosmonauta moveu o botão do dial para a esquerda e para a direita, mas não conseguiu captar sequer uma única estação de rádio. Devia ter caído em algum lugar extremamente remoto, era sua única explicação. Onde, exatamente, era algo que ainda teria que determinar tão logo saísse da cápsula espacial; tudo o que lembrava era de estar em órbita sobre o Pacífico Norte e ter sido abalroado por... alguma coisa. Não parecia ter sido um meteoroide; a sensação no momento do impacto é que batera numa cama elástica, e em seguida, todos os instrumentos apagaram-se por um breve instante. Quando voltaram a funcionar, ele já estava caindo velozmente num ângulo que o levaria a ser incinerado na reentrada. Teve pouquíssimo tempo ao corrigir a trajetória com os propulsores de manobra, para permitir um pouso de emergência.
Pelas últimas coordenadas registradas antes do impacto, deveria estar em algum ponto do norte da América, presumivelmente no Canadá. Não era exatamente o melhor lugar para o piloto de uma missão secreta da União Soviética desembarcar, mas ele não tivera muita escolha, conformou-se. Pior seria se houvesse caído no mar; a cápsula Pioner, como suas predecessoras Vostok e Voskhod, não estava preparada para amerissagem.
Decidido a descobrir exatamente onde estava, Ippolit Tikhonovich soltou-se do cinto de segurança, apanhou o kit de sobrevivência e abriu ligeiramente a escotilha da cápsula espacial. Aspirou profundamente o ar que entrou na cabine antes de ampliar a abertura: cheirava a mato, pinheiro; decididamente, caíra numa floresta. Suas suspeitas foram confirmadas quando finalmente atreveu-se a girar completamente a escotilha sobre os gonzos e emergiu sob uma luz dourada de fim de tarde. Um freixo, quase arrancado pela raiz, fora quem detivera a trajetória da cápsula, após esta ter aberto uma trilha de destruição com cerca de 100 metros de comprimento em meio às árvores.
Uma floresta remota como aquela provavelmente deveria ter ursos vagando por ali, avaliou. O major recolheu-se ao interior da cápsula, colocou o carregador na pistola Makarov de serviço, ajustou a bússola de pulso e finalmente atreveu-se a pisar pela primeira vez em terra firme.
- Tomo posse oficialmente destas terras em nome da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas! - Declarou em voz alta para sua própria diversão. Quando virou-se para apreciar a avenida aberta entre as árvores pela cápsula Pioner, percebeu que tinha companhia. À cerca de trinta metros de distância, estavam seis homens altos e morenos vestidos de peles, ostentando apenas um tufo de cabelos decorado com penas no alto da cabeça. Ippolit Tikhonovich abriu um sorriso e saudou-os em inglês:
- Olá! Vocês são moicanos? Só vi esses penteados em filmes de faroeste...
Os índios entreolharam-se e começaram a discutir em voz baixa, ocasionalmente lançando olhares desconfiados para ele. Finalmente, um guerreiro com o rosto marcado por uma cicatriz na face esquerda aproximou-se e parou a cerca de dez passos de distância.
- Me comprenez-vous? - Indagou ele.
- [09-09-2020]