STARMAN


A Lua estava Nova, por isso todos os painéis de recepção de fótons estavam ligados à toda para garantir o funcionamento dos equipamentos nas semanas escuras. Havia sempre muito trabalho na Lua Nova, grande parte do trabalho de manutenção deveria ser feito em pouco tempo. A poeira era a pior parte: grudava em tudo de um modo terrível. Os técnicos tinham que gastar grande tempo fazendo a deionização das peças antes de recolocá-las.

Mas havia uma parte boa da Lua Nova, que era poder ir caminhando até a fronteira luminosa e olhar lá para baixo: aquela pérola azul e branca solta no espaço. Nunca cansava de olhar lá para baixo, aquelas nuvens nunca eram as mesmas. Às vezes brincavam de roda, lentamente... Ele queria poder ter pincel e tela, e que a poeira não estragasse tudo, como sempre. Ele não se cansaria de pintá-la todos os dias... Mas enfim, não havia pincel e tela lá em cima. Só havia chips, metal e plástico impresso em todas as formas necessárias. Também não havia pintores, pintores são um desperdício de recurso inaceitável.

Ele gostava de ir lá e olhar, e imaginar como reagiriam lá embaixo se ele pudesse descer, se ele pudesse suportar toda aquela pressão e gravidade. Ele gostaria de descer e sentir a água, sentir-se desempoeirado pela primeira vez na vida. Gostaria de conversar e dizer que é extremamente solitário lá em cima. Ouvira dizer que lá embaixo as pessoas emitem som, e assim se comunicam. Ouvira dizer também que os músculos faciais se contraem quando estão felizes, e que água sai de seus olhos quando eles se sentem tristes. Algumas vezes se pegou tentando contrair os músculos da face, mas seu reflexo nos painéis de silício pareceu estranho e sem sentido.

Só a Terra era bela, somente ela fazia sentido. Todo resto era vazio e escuro. E ele estranhamente sentia falta de coisas que nunca tivera. Como um dos doze indivíduos projetados para a Estação Lunar, nunca estivera na Terra e chegara ali já totalmente constituído. Em seu bloco de dados ele sabia que, na Terra, não era assim: os seres não nasciam constituídos, eles nasciam diminutos e iam crescendo e assimilando dados: chamavam-se Crianças. Em seu bloco de dados havia imagens delas, brincando, crescendo... Havia uma sensação de cócegas dentro dele, uma sensação esquisita toda vez que ele revia o bloco de dados sobre os seres humanos diminutos. E então, sem que ele percebesse, alguns músculos de seu rosto se contraíam levemente...
Dara Pinheiro
Enviado por Dara Pinheiro em 11/08/2020
Reeditado em 23/08/2020
Código do texto: T7032877
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