Validade vencida
- Havia um parque de diversões por aqui - disse Walter, consultando um mapa rodoviário amassado, enquanto seguíamos pela interestadual esburacada no sentido sul.
- Não queremos ver um parque de diversões abandonado - retruquei, sem desviar os olhos da estrada para não acabar com um eixo quebrado. Peças de reposição andavam raras, e era improvável que houvesse alguma oficina mecânica naquele descampado.
- A Terra da Fantasia - comentou Diana, do banco traseiro. - Era bem famoso, esse parque. Depois, usaram o estacionamento como hospital de campanha durante a Epidemia...
- Hospital de campanha? - Indaguei, reduzindo a velocidade. - Talvez valha a pena dar uma olhada lá...
- Suprimentos médicos - antecipou Sheila, sentada ao lado de Diana, parecendo ler meus pensamentos.
Era muito mais difícil obter medicamentos do que peças de reposição para veículos; além disso, remédios, mesmo com validade vencida, sempre podiam ser trocados por alguma coisa útil. Entrei à direita, seguindo o caminho indicado numa placa enferrujada, por uma estrada onde o mato crescia entre as rachaduras do asfalto.
Pouco depois, as estruturas metálicas do antigo parque começaram a se mostrar acima das árvores às margens da estrada. Montanhas-russas desmoronadas, rodas-gigantes em ruínas, falsos castelos com a pintura desbotada por incontáveis verões. O estacionamento abriu-se então à nossa frente, antes dos portões do parque - que estavam fechados, aliás - e nele, efetivamente, havia sido montado um hospital de campanha pré-fabricado, já bastante desgastado por anos de desgaste e abandono. Parei o carro próximo à entrada de emergência, onde originalmente estacionavam as ambulâncias.
- Quem desce comigo? - Indaguei, pegando o revólver no porta-luvas.
- Eu vou! - Voluntariou-se Sheila.
Descemos. Arma em punho, entrei no hall de entrada, onde cadeiras de plástico alinhavam-se ordeiramente à frente de um balcão empoeirado. Dispersas pelo piso sintético, folhas de papel rasgadas e pegadas feitas com botas enlameadas.
- Alguém já passou por aqui antes de nós. Provavelmente, não deve haver mais nada de valor no almoxarifado - ponderei.
- Não custa ir conferir pessoalmente - insistiu Sheila.
Fomos. O almoxarifado era pequeno, e a porta havia sido arrombada há muito tempo, provavelmente com um pé de cabra. Entramos, e havia estantes metálicas derrubadas, caixas abertas com o conteúdo espalhado pelo chão.
- Não sei porque esses vândalos simplesmente não pegaram o que queriam e deixaram o restante no lugar - queixou-se Sheila.
- Se fizessem isso, não seriam vândalos - repliquei, abaixando-me para pegar uma das caixas abertas: máscaras cirúrgicas.
- Crê que isso ainda terá alguma utilidade? - Indaguei.
Ela deu de ombros.
- Podemos levar. Ainda deve haver médicos fazendo operações em algum lugar desse país.
Começou a recolher algumas caixas que ainda estavam lacradas.
- Para nós, elas não têm mais nenhuma serventia - retruquei, enquanto a ajudava na tarefa. - Afinal, estamos todos contaminados mesmo...
- [18-03-2020]