Um passeio no fim do mundo

Então um deles parou e apontou para baixo.

- O que são essas coisas? - perguntou o de macacão Prata.

O outro, de macacão Azul, que havia lido com atenção a Enciclopédia Terráquea antes da viagem, respondeu faceiro que era um toco.

- Toco? - perguntou o Prata.

- O que sobrou de uma árvore - esclareceu o Azul.

O Prata franziu as sobrancelhas sem entender.

- Árvores, - seguiu o Azul, em tom professoral - formas de vida que cresciam do solo, na vertical, buscando o sol.

- Sol? - duvidou o Prata.

E ambos olharam aquele céu embatumado, cinza e espesso, tão escuro que era preciso usar lanterna.

- Bem, parece que um dia houve sol - justificou o Azul.

- E por que as árvores agora são tocos?

- Existem teorias fascinantes! Li um artigo sobre a mitologia terráquea baseado em alguns achados arqueológicos. Parece que cultuavam uma entidade chamada Soja, que demandava sacrifícios de recursos sem-fim em sua devoção. Legal, né?

- Mas ouvi dizer que eles adoravam um tal de Grande Boi.

- Sim! - se animou o Azul - Eles adoravam também! Há teorias que dizem que o Cataclismo veio justamente dessa guerra de fé entre sojistas e bovinos, os dois lados se atracando para ver quem sacrificava mais e melhor. Nisso as árvores viraram tocos, ou nada.

O Prata ergueu as sobrancelhas, descrente naquela mitologia absurda. E ainda tinha dúvidas.

- Tá, e as árvores cresciam pra cima e tal. E daí? Pra que serviam?

- Eram um treco bem louco. Pesquisas indicam que elas renovavam o ar, um negócio mágico assim, ainda não sabemos direito.

- Ué, mas e eles não precisavam do ar, os sojistas e todo o resto? E aí acabaram com todas elas?

E ambos olharam para o descampado seco, um horizonte feito só de terra, cheio de tocos ralos, nenhuma árvore até onde a vista alcançava... Na falta de explicação, deram de ombros.

- Vamos, ainda quero ver onde ficavam os mares.

- Mares? - duvidou o Prata.

- Sim. Há indícios de que o planeta tinha água pacas.

Diante do absurdo, que só podia ser piada, o Prata riu. E rindo seguiu o colega até a nave.