O poeta e o robô
 
Era uma vez um poeta solitário. Morava no alto de uma colina. Sozinho. Não tinha parentes. Não tinha vizinhos. Não tinha amigos. Poetizava dia e noite. Fazia as mais belas poesias que eram levadas pelo vento todas as tardinhas para algum lugar.
 
Certo dia, alguém tocou a campainha da casa do poeta. Ora, quem poderia ser. Fazia anos que ninguém passava por ali. O poeta abriu a porta e tomou um susto! Era um robô com um manual de instruções. Quem o teria colocado ali? O poeta olhou para o lado esquerdo, para o lado direito, para a descida da colina e não viu ninguém.
 
O poeta colocou o robô para dentro de casa. Estava desligado. Leu o manual de instruções. Nele havia uma instrução muito estranha que dizia mais ou menos o seguinte: após ser ligado o robô poderá criar sentimentos bons ou ruins dependendo da pessoa com quem vier a conviver. Havia uma outra instrução interessante, também: caso ocorra algum problema fora do controle com o robô é só apertar o botão desligar e ele esquecerá tudo.
 
O poeta seguiu as instruções do manual e ligou o robô. A primeira palavra que ele lhe disse foi: - Olá!
 
Daí para frente o poeta e o robô tornaram-se amigos íntimos. O robô aprendia tudo com o poeta. Fazia os afazeres da casa e ainda escrevia a noite inteira enquanto o poeta descansava. O robô nunca descansava. Sempre estava fazendo alguma coisa. Para a inquietude do poeta que não o fazia ficar parado. Estava sempre limpando a casa, cuidando do jardim, preparando um prato diferente, lavando roupas, tirando a poeira dos móveis e escrevendo poesias.
 
Certo dia o robô ficou descontrolado. Começou a quebrar pratos, a correr de um lado para o outro, a confundir as palavras e o que foi mais sério deixou de conhecer seu amigo poeta.
 
O poeta ficou desesperado. Leu o manual de instruções umas cem mil vezes. No manual, a instrução que ele se negava a fazer: desligar. O botão desligar desprogramaria o robô. Ele esqueceria tudo. Voltaria a condição de antes. O manual também alertava de que o robô poderia não aprender as coisas do mesmo jeito que aprendera na primeira vez, ou pior ainda, poderia confundir um conceito com outro. E o poeta preocupou-se principalmente com o amor. Imaginem se o robô confundisse amor com ódio? O pobre poeta não sabia o que fazer. Desligar ou não?
 
Enquanto isso o robô pisava nas flores, rasgava as poesias, brigava com os pássaros, acendia e apagava as luzes da casa dezenas de vezes.
 
Ocorre que uma tarde o robô entrou no ateliê do poeta. Começou a mexer em tudo lá dentro. Encontrou uma lata cheia de tinta e derramou sobre o seu corpo. Parou. Quebrou-se.
 
Quando o poeta viu o robô todo vermelho parado no meio do ateliê ficou preocupado. Tentou falar com o robô. Ele não respondeu. Tentou mexer aqui e acolá. Nenhum sinal. Seus circuitos internos, suas peças, seus chips e seu processador estavam todos sujos de tinta.
 
O poeta levou o robô para a sua oficina. Deitou-o sob uma mesa. Era preciso desmontá-lo. Limpar peça por peça com todo o cuidado. E depois rezar para que ele funcionasse novamente. E assim foi limpando tudo passando graxa aqui e acolá.
 
Quando terminou de limpar montou o robô novamente. Peça por peça. Com todo o cuidado. E esperou. Esperou um, dois, três dias. Esperou um, dois, três meses. Esperou um, dois, três anos. Esperou uma, duas, três décadas. Já não tinha mais esperança de que seu robô viesse a funcionar.
 
Numa manhã em que os sabiás cantam nos galhos das árvores e as rosas perfumam a casa, o poeta ainda cochilava sob a poltrona com o manual de instruções nas mãos, já decidido a apertar o botão desligar do robô, quando ouviu uma vozinha conhecida dizer:
 
- Bom dia! Que horas são?
 
Era o robô! Estava funcionando novamente! Não demonstrava mais sinais de descontrole. Para espanto do poeta o robô contou-lhe que não sabia que estava parado, pois parecia que tinha viajado para um lugar belo com um lago azul, pintinhos brincando, uma casinha de sapê, um sol nem quente nem frio, um espantalho no meio de uma plantação de milho e que ele era um agricultor de macacão e chapéu de palha que trabalhava muito para manter umas pessoas que ele não sabia dizer quem eram, mas que eram menores do que ele e o chamavam de pai.
 
O poeta logo percebeu que o seu robô tinha passado todo aquele tempo dormindo, e o que mais espantava: tinha sonhado. Como tinha descansado por muito tempo estava consertado. O que ele precisava era somente de descanso. Assim como as pessoas que trabalham muito ficam cansadas e acabam tendo estresse ou problemas cardíacos as máquinas também podem parar de repente.
 
Mas o problema não estava resolvido. Era necessário descobrir como fazer o robô dormir todas as noites para poder descansar. Isso não tinha no manual de instruções.
 
Então o poeta decidiu fazer como as mães fazem com as crianças: colocá-lo para dormir contando-lhe uma história. E não é que deu certo! Todas as noites o poeta contava um conto de fadas para o robô que dormia e sonhava com príncipes e princesas.