O curioso relato de uma ovelha

É certo de que eles eram um pouco estranhos em seus hábitos e aparências e se diferenciavam dos homens em pouco aspectos. Mas de certa forma tinham braços, pernas e uma cabeça. Não eram como nós que temos quatro patas. Eram o que se chamam de humanoides. A mim isso na verdade pouco importava. O homem, o senhor, entrava durante o dia, fazia algumas limpezas e deixava a comida em ordem e isso significava paz.

É certo de que as vezes éramos maltratadas e não muito raro o senhor da casa junto de outro homem pegava uma de nós e levavam e nunca mais se sabia qualquer notícia, a não ser o semblante de felicidade de nosso mantenedor.

Já esses outros um pouco mais estranhos vinham a noite, quando não havia nenhum humano por perto. Chegavam cercados de muita luz, era como um dos veículos da fazenda, mas esse vinha dos céus. Se eu pudesse curvar minha cabeça gostaria de ver o ponto de onde vinham. Será que há um outro mundo acima de minha cabeça?

Pois bem, de modo estranho esses seres saiam e andavam pela propriedade e tocavam os animais. Assim como os donos aplicavam coisas em nossa pele. Eram estranhos, mas não nos causavam medo, afinal já estávamos acostumados com os homens e seus hábitos. Será que esses ao menos nos dariam um novo tipo de comida, ou a liberdade.

Contava-se entre nós que estes não nos levavam, mas nos feriam às vezes a frente uma das outras. Constrangidas não emitíamos sons porque poderíamos ser as próximas. Após alguns dias éramos surpreendidas com a cara de espanto de nosso dono às marcas que tínhamos ou mesmo a morte de animais.

Mas de modo geral não havia diferença, afinal sempre víamos galinhas sendo mortas no quintal num ritual brutal que consistia em quebrar seus pescoços. Um dia a galinha era tratada docilmente com o milho e no outro era vítima. As vezes era mais de uma.

A galinha depois de torcido seu pescoço cai no solo e inicia sua dança macabra. Se contorce de um lado para o outro e isso muito rápido até que os movimentos perdem força e ela está pronta para a panela. Quando matam mais de uma, elas parecem estar num espetáculo de dança. Sei de outros métodos, mas me dão medo. Corta-se o pescoço.

Era o genocídio de galinhas. Disfarçávamos, pois é preciso viver.

Então penso que esses seres estranhos oferecem a nós um cenário menos estranho. Um deles, por exemplo, tocou sexo numa dessas visitas, analisou também minhas mamas com extrema curiosidade e fui tomada de pudor, mas resisti.

Os olhos eram negros e profundos, faziam me ver um mundo novo. Fiquei paralisada. A pele branca de tom acinzentado, pequenos orifícios, o nariz, e sem pelagem alguma. Alguns visitantes da fazenda até poderiam se passar por algum deles, afinal há humanos sem pelagem na cabeça.

As visitas tornaram se constante e sempre do mesmo modo. Aquele sol invadia o quintal de madrugada e lá vinham eles. Estranhamente nunca tentaram contato com o senhor e sua família. Já rondaram a casa e até os vi próximo a uma janela. Será que visitavam também os senhores como faziam conosco?

Não trazem animais consigo. Lembro sempre da rudeza dos cães da casa quando adentram minha casa. Sempre repugnantes e querendo se mostrar aos seus donos. Os cães são verdadeiros puxa-sacos dos senhores. Mas me espanta que os seres não venham acompanhados de um animal equivalente ou de um outro qualquer.

Devem ser solitários esses homens que veem de longe e têm gostos peculiares e por isso pegam pedrinhas do chão com extrema curiosidade.

Como seriam seus animais. Haveria lá um equivalente a nós, as ovelhas? Como elas seriam?