O Enxame

- É o tipo de problema que vocês gostam de resolver - disse o supervisor Thàn Phuong à guisa de introdução. À frente dele, em sua sala na sede da companhia, estava a "dupla de manutenção mais rápida do Universo Conhecido" (palavras do próprio Thàn Phuong), Lam Phat e seu assistente habitual Vu Minh. Lam Phat não pareceu muito impressionado com a oferta.

- Como é que chamam essa nova ameaça... o Enxame?

- Insetos de novo? - Suspirou Vu Minh.

- Tecnicamente, não eram insetos em Rhogunna IV, mas nanomáquinas - corrigiu Thàn Phuong. - Não, não é nada parecido com o que enfrentaram lá... aliás, de modo brilhante, como sempre...

Phat e Minh apenas balançaram as cabeças, especulando qual seria a armadilha.

- O Enxame é um tipo de arma de destruição em massa - explicou o supervisor. - Foi criada há milhões de anos por uma civilização extinta, na galáxia M32, e fugiu ao controle dos seus criadores, que, aliás, acabaram sendo aniquilados por ela. Como está agora ameaçando as galáxias vizinhas, a Sociedade de Amigos e Residentes do Grupo Local nos contratou para resolver o problema antes que saia de controle.

- Como assim, "antes que saia de controle"? - Questionou Lam Phat, cenho franzido. - Acabou de dizer que o tal Enxame destruiu a própria civilização que o criou!

O supervisor deu de ombros.

- Até então, isso era um problema de M32 e seus habitantes. Mas como agora o Enxame está se dirigindo para Andrômeda, a coisa mudou de figura.

- Pobres suburbanos - comentou penalizado Vu Minh.

- Pensem que poderão estar ajudando ao povo de M32, aqueles que eventualmente sobreviveram - propôs Thàn Phuong - e também fazendo o seu trabalho. Bom karma!

- E o que dizem as letras miúdas do nosso contrato com a SARGL? - Inquiriu Lam Phat, braços cruzados.

- Vocês têm que deter o Enxame no espaço intergalático, ou não vão receber bônus extra - revelou o supervisor. - Vejam, essa cláusula foi imposta pela Sociedade, a companhia não teve nada que ver com ela.

Sem descruzar os braços, Lam Phat retrucou:

- Claro que acreditamos.

* * *

Dentro da bolha transparente que era a ponte de comando do cruzador da companhia, Lam Phat e Vu Minh pareciam flutuar em meio ao espaço intergalático, tendo abaixo deles o disco leitoso da galáxia de Andrômeda, e logo acima, o globo luminoso de M32.

- Como fazemos para deter o avanço do Enxame, Vu Minh? - Questionou Lam Phat, olhando para o alto.

- Espero que não esteja fazendo essa pergunta a sério, porque não tenho a mínima ideia - admitiu Vu Minh.

- Péssima resposta, Vu Minh, péssima resposta - replicou Lam Phat em tom zombeteiro. - Então, deixe-me reformular a pergunta: o que o Enxame faz, na prática?

Vu Minh concentrou-se por alguns instantes antes de responder:

- O Enxame utiliza toda a matéria ao redor de uma estrela para construir novas máquinas de demolição de planetas; quando a destruição de um sistema solar termina, eles partem para o próximo e repetem o ciclo. A cada ciclo, o Enxame aumenta.

- Não admira que seus próprios criadores não houvessem conseguido detê-los... - ponderou Lam Phat. - Então, do seu relato, podemos deduzir que o Enxame se orienta pela luz emitida pelas estrelas, e assim determinam onde será o próximo ataque, correto?

- Sim, é um método bastante cru e direto: analisar qual é a estrela mais próxima e navegar para lá - arguiu Vu Minh.

- E se estão agora a caminho de Andrômeda, o que é que não há entre as duas galáxias? - Inquiriu Lam Phat.

O assistente não precisou pensar muito.

- Estrelas!

- Muito bem, Vu Minh! - Aplaudiu Lam Phat. - Ou quase isso: sempre há uma ou outra estrela desgarrada no espaço intergalático, e é fazendo a ponte de estrela em estrela que eventualmente o Enxame chegará à Andrômeda... se não fizermos direito o nosso trabalho, claro.

- Bem... e o que faremos com base nessa informação? - Indagou Vu Minh.

- Nosso primeiro passo, é determinar qual é o infeliz sistema solar que está agora no caminho do Enxame. E torcer para que não seja habitado, o que seria realmente uma pena...

- Torcer para que o Enxame não vá destruí-lo? - Indagou confuso Vu Minh, tentando seguir o raciocínio do chefe.

- O Enxame ou nós, quem chegar primeiro - retrucou Lam Phat, preparando a nave para um salto hiperespacial.

* * *

A solitária gigante vermelha não tinha nome, e era duvidoso que qualquer explorador houvesse se dignado alguma vez a mapear seus domínios. O certo é que o Enxame chegaria até ela em poucas horas, e a meia dúzia de planetas calcinados que a orbitavam em sua longa queda em direção à Andrômeda, estavam fadados a virar material de construção de novas máquinas demolidoras. Exceto claro, se Lam Phat e Vu Minh não lançassem mão do seu arsenal de truques.

- Que sorte! Não é habitado! - Comemorou Lam Phat ao emergirem do hiperespaço. - Ninguém vai sentir a falta desses pedregulhos!

- Como vamos parar o Enxame? - Questionou novamente Vu Minh.

- Pense na estrela como a luz de uma lâmpada, atraindo revoadas de insetos no verão - explicou Lam Phat. - O que acontece com insetos que chegam muito perto da lâmpada?

- Morrem queimados - afirmou Vu Minh. - Mas a sua analogia não está muito correta, pois o Enxame nunca se aproxima muito de uma estrela para sofrer as consequências...

- Então, teremos que dar à ela uma pequena ajuda para que faça o seu trabalho... - replicou Lam Phat. - Prepare meia dúzia de bombas de antimatéria e assim que o Enxame der as caras, teleporte-as para o núcleo da estrela.

- Isso vai causar uma reação em cadeia que irá transformar a gigante vermelha em supernova - ponderou Vu Minh. - Excelente! Só espero que tenhamos tempo de sair de perto antes da explosão...

- Confio na sua agilidade - declarou solenemente Lam Phat.

* * *

Dias depois, já de volta à sala do supervisor, a dupla da manutenção teve que ouvir que não havia dado 100% de certeza de que o Enxame fora eliminado.

- Nesse caso, simplesmente não temos como dar garantias - admitiu Lam Phat. - Mas asseguramos que com a destruição da maior parte do Enxame, a SARGL terá tempo suficiente para caçar e destruir os remanescentes... ou pensar numa solução melhor do que a nossa.

- De quanto tempo estamos falando, exatamente? - Indagou Thàn Phuong.

- Oh... alguns milhões de anos - informou Lam Phat. - Nenhum de nós ou a companhia estarão mais por aqui, caso alguém neste futuro hipotético resolva fazer queixa pelo serviço inacabado.

- [26-11-2019]