Prevalência
À noite, Nora me informou que o pedido havia sido negado.
- Deram alguma justificativa, pelo menos? - Indaguei, me sentindo mais ou menos conformado. Eu sabia que uma resposta diferente teria sido obra de milagre.
- O Ministério possui uma resposta padrão para estes casos: o orçamento é limitado, e eles têm que priorizar as doenças mais comuns. Infelizmente, doenças raras, como a do seu filho, exigem recursos que poriam em risco o tratamento de centenas de outros pacientes.
- Eu entendo a lógica por trás dessa justificativa - acedi. - Todavia, é a vida de uma criança que está em jogo. Em outros tempos, creio que você poderia entrar com uma liminar, um mandado de segurança, para garantir o tratamento...
Ela me encarou, penalizada.
- Sim, George. Outros tempos. Hoje, há pouca coisa que um advogado possa fazer. Os casos para os quais se pode entrar com um recurso junto ao Ministério, são limitados, e dependem de uma série de pré-condições. Lamentavelmente, você não se enquadra nelas. Entretanto...
- Entretanto? - Indaguei, com uma ponta de esperança.
Agora, Nora pareceu-me constrangida.
- Há um programa experimental voltado para pesquisa em doenças raras, que atinjam familiares do Círculo Supremo. Eu descobri que estão procurando voluntários justamente para o problema genético que atinge o seu filho.
Ela parou de falar e ficou me olhando, ansiosa.
- Você quer dizer... estão procurando cobaias para tentar achar uma cura para essa doença? - Questionei.
- Os voluntários terão o tratamento mais avançado existente... embora ele seja todo experimental, e potencialmente arriscado.
- Tudo isso porque alguém no Círculo Supremo possui essa moléstia - refleti.
- Sim! - Admitiu ela.
- E para isso, eles têm orçamento...
- É experimental. Talvez não cure seu filho, mas poderá lhe dar uma sobrevida.
Balancei a cabeça, lentamente.
- Há um tratamento, talvez não tão eficiente, mas caro, pelos padrões do Ministério... e eles o negam, para que pessoas desesperadas como eu tenham que se submeter a uma técnica nova, e que pode bem ser um placebo.
- Eu não sei! - Exclamou ela. - Mas você queria alguma resposta positiva de mim... estou lhe dando uma!
- Sim, não deixa de ser... quanto lhe pagaram, Nora?
Ela me virou as costas, e saiu sem se despedir.
- [01-09-2019]