A Garota na Vitrine

O Distrito era um museu a céu aberto. À noite, pelas ruas estreitas margeadas por casario antigo, em cujas fachadas viam-se grandes janelas de vidro blindado, iluminadas por letreiros de neon e luzes que piscavam, marchavam legiões de turistas; alguns, ostensivamente com câmeras em punho, o que teria sido expressamente proibido em outros tempos. Mas aquele lugar era agora, como vários transeuntes lembravam alegremente, um grande museu a céu aberto. E, ao ver um sujeito parar em frente à uma das janelas, e depois entrar rapidamente por uma porta ao lado da mesma, lembrei-me de que os negócios que haviam dado fama ao Distrito, ainda continuavam a ser feitos; só que de forma bem mais sofisticada.

Caminhei sem pressa pela calçada de uma ruela paralela ao canal, afastando-me do fluxo principal de turistas. Ali, as janelas iluminadas eram mais espaçadas, e algumas, apagadas, ostentavam uma placa de "Te Huur" ("Aluga-se", em neerlandês). Perguntei-me se as placas eram verdadeiras ou simplesmente a representação de um fenômeno que por vezes ocorrera quando o lugar ainda mantinha o seu espírito original, mas começara a ceder sua primazia para transações fechadas via internet. Nas janelas ainda iluminadas, garotas bonitas, seminuas, requebravam sensualmente, e sorriam e acenavam ao me ver passar. Segui adiante.

Antes da próxima esquina, havia uma última janela iluminada, e por trás do vidro, uma loura bronzeada, de rabo de cavalo, com botas vermelhas de salto alto e um biquíni branco mínimo. Parei; não pelo fato de que ela fosse mais atraente do que as outras que eu vira no caminho até ali, mas porque estava com um celular na mão, olhando para a tela com ar entediado.

- Olá - saudei-a, acenando com a mão direita.

Ela ergueu os olhos do celular e encarou-me com ar analítico.

- Olá. Você quer entrar?

- Não sei... - repliquei. - Mas você me parece... diferente das suas colegas. Entediada, eu diria.

- E estou - admitiu ela. E, com uma franqueza estudada:

- É solitário e chato ficar exposta nesta janela, requebrando para turistas idiotas que só querem saber de tirar fotos.

- Pelo menos, aí dentro está quente - ponderei.

- Então, você quer entrar - avaliou ela com um olhar matreiro, abaixando a mão com o celular. - São 100 euros a hora.

- Acho que vai valer a pena - redargui.

Ela saiu da vitrine. Pouco depois, abriu a porta ao lado da mesma. Entrei. Ela subiu para a plataforma em frente à janela, e baixou a cortina. Ficamos frente a frente, e ela me estendeu a mão, espalmada.

- Pagamento adiantado.

- Aceita cartão? - Indaguei, retirando o cartão do bolso traseiro das calças.

- Claro que sim. Tenho a maquininha...

- Maquininha? - Repliquei intrigado. - Você não vai simplesmente passar a mão por cima do cartão para registrar a transação?

A garota pôs as mãos nas cadeiras, cenho franzido.

- O que você achou que eu fosse? Um desses robôs sexuais que enfeitam o museu do Distrito?

E perante a minha expressão de surpresa, que deveria ser realmente cômica, ela me estendeu um leitor de cartões e indagou, com a presteza de uma vendedora de loja de souvenirs:

- Débito ou crédito?

- [09-08-2019]