As Cobaias

Era um lugar de sonho, onde o impossível era possível e portas se abriam para onde seus sonhos o pudessem levar. Fora do tempo e dentro do tempo, o tempo realmente não era relevante, somente algo inventado por alguém do qual não tínhamos contato - O Original. De onde ele tinha surgido? Quem sabe. Não fomos criados para pensar sobre isso.

A vida em Lugar Nenhum era incrível. Podíamos experimentar outras realidades, viajar no tempo e ser quem quiséssemos ser, desde que em ambiente controlado e vigiado para que as percepções fossem reportadas ao Original – local de armazenamento e compartilhamento de saber. Tudo pertencia a todos. Éramos física e tecnologicamente mais avançados. Observadores curiosos daquilo que ainda não tínhamos pleno conhecimento e testadores de tudo que tivesse a mínima conexão. Não havia limite para a imaginação, disso hoje eu sei.

Ocultávamos-nos entre as nuvens e observávamos o comportamento daqueles que não sabiam de nossa existência. Distópicos da criação conhecida, funcionávamos como um laboratório do que futuramente seria o efetivo, portanto nossa perpetuação. Penso que o objetivo era identificar, solucionar e depois coexistir harmonicamente com o planeta, cada um conforme o que lhe despertasse real interesse: comunicação, biodiversidade, a evolução da tecnologia.

Acordei sozinho em uma bolha translúcida, minimalista e high tec. Senti que devia ser minha casa. Era um novato, recém-chegado da grande bolha.

Assim que abri os olhos, um frasco com um líquido espesso saiu de um dispositivo embutido na parede, com instruções por áudio para que eu o bebesse. Estava sonolento e letárgico, mas bebi imediatamente o conteúdo e senti uma imediata sensação de bem estar. Descobri mais tarde que seriam necessários quatro frascos diários para me manter ativo e saudável. Minhas percepções foram aumentando gradativamente e me deixando mais desperto para tudo que estava dentro e fora da bolha. Estava curioso com as emanações que vinham do lado de fora e saí para interagir. Encontrei um grande espaço aberto, pavimentado e harmonicamente incorporado a uma flora de cores tênues e aroma delicado. Outros na mesma condição iam aparecendo e deslumbrando-se com o cenário bucólico que nos rodeava. Creio que deviam estar tão intrigados quanto eu para descobrir a realidade que nos envolvia. Éramos de gêneros diferentes, fisicamente semelhantes, e todos tão estranhos quanto achávamos que parecíamos um ao outro.

Instintivamente, fomos atraídos à uma plataforma, enquanto orientações eram passadas telepaticamente aos grupos, que iam se dividindo conforme os dispositivos que estavam implantados nossos pulsos. Era tudo tão agradável! Creio que éramos bonitos, ao menos aos meus olhos que viam aquele esplendor pela primeira vez. Acho hoje, bem no fundo, que éramos o melhor resultado de alguma falha primordial.

Aos poucos, nossos predecessores iam se apresentando e nos orientando quanto ao que tínhamos que fazer para usufruir plenamente de nossos destinos. A comunicação seria essencialmente por emissões mentais e nos transportaríamos da mesma maneira. No início tudo foi um pouco difícil, até nos acostumarmos a nossos corpos e aos nossos pares, conforme as interações por similaridades cognitivas iam se estabelecendo. Nossa recarga diária não podia ser ignorada e, portanto, as ingestões seriam checadas. Recolheríamo-nos às nossas bolhas no fim de cada passagem solar, recebendo os últimos raios que nos manteria energizados até tomarmos novamente a substância.

Nos dias que se seguiram, mantive a rotina a medida que ia me familiarizando cada vez mais com os desígnios estabelecidos. Confraternizei com os demais recém-chegados e dentre todos, fui conectado por Lara. Identificamos-nos quase que imediatamente, e passamos a ir juntos para as observações. Em Lugar Nenhum, a cada ciclo lunar, os que conseguissem estabelecer uma boa conecção tinham mais chances de evoluir para etapas mais desafiadoras. Tivemos sorte.

Os pares terrenos, como os chamávamos, foram a categoria que mais nos atraiu. Observávamos sua rotina com estranheza, ainda mais entre aqueles que manifestavam gostos e aptidões tão diferentes daquilo que conhecíamos. Era evidente a assimilação do que havia dado de errado com aquela espécie tão singular. Manifestavam-se afetuosamente e reproduziam. Suas crias eram acompanhadas desde o nascimento, separando-se quando cresciam. Eram demasiadamente primitivos, falhos, dependentes, violentos, chorões, desorganizados e com tendências à autodestruição. Manifestações de afeto nos chocavam de tão intensas, para raramente serem conclusivas e exitosas. Lara eventualmente se frustrava com as fatalidades, e sua vontade de interferir era crescente. Percebia com certo desgosto que ela poderia vir a ser um impeditivo para que evoluíssemos, pois constantemente esquecia e pulava as recargas alimentares.

Nosso par de predecessores, mais experientes e encarregados de nosso lote, instruiu-nos que seriam necessários muitos ciclos lunares antes que adquiríssemos a maturidade necessária para observarmos mais de perto. Apenas casos extremos, e autorizados pelo Original, poderiam intervir.

Esperamos pacientemente por vários ciclos lunares, até que nossos relatórios traduzissem a segurança necessária para que nos fosse permitido transportar para aquele universo paralelo e sedutor. Durante esse período, escolhemos com cuidado nossas indumentárias, treinamos falas, expressões e nosso gestual. Só iríamos interagir se fosse estritamente necessário. Estávamos tão orgulhosos da confiança, que decidimos dormir em minha bolha para descemos aos primeiros raios do sol.

Nosso senso de direção ainda estava em desenvolvimento e ressurgimos a uma quadra de nosso destino. Os sons feriram nossos ouvidos. Nossos olhos arderam com a poluição e a agitação nos deixou um pouco inseguros, mas conseguimos chegar ao nosso destino. Eles não podiam nos ver, o que tornava tudo mais fácil e excitante.

A cobaia fêmea estava grávida pela segunda vez e prestes a expulsar a nova criatura, mas eles viviam com extrema precariedade. As dores e os gritos não me incomodavam, afinal estávamos lá apenas para observar mais de perto. Contudo, Lara parecia um tanto desconfortável e agitada.

- Você tomou sua dose?

Pela expressão dela, percebi que havia falhado mais uma vez e resolvi abortar a missão, mas seu toque em meu braço interrompeu o acionamento do dispositivo implantado em meu pulso e não foi apenas isso. O contato físico nunca tinha sido experimentado entre nós, e fiquei confuso. Aguardamos mais um pouco, fizemos nossas anotações e retornamos.

Lara estava fraca e a levei para minha bolha. Dividi minha dose com ela e dormimos. Estávamos liberados de nossas atividades curriculares até findarmos nossa experiência, portanto não teríamos que nos reportar.

Os raios de sol ainda não tinham surgido, mas acordei mesmo assim. Algo estranho estava acontecendo. Lara estava de pé ao lado da cabeceira e olhando fixamente para mim.

- Temos que voltar. Agora!

- Por quê?

- Eles são nossa responsabilidade. Se der algo errado com o novo espécime, não vou conseguir me conter.

Lara estava muito estranha e eu não compartilhava de seus pensamentos, mas tínhamos uma boa conexão e levaria tempo até me adaptar à outra parceria. Meu objetivo seria adiado.

- Tudo bem! Vou à sua bolha pegar suas doses. Espere-me aqui.

Sabia que, de alguma forma, estávamos burlando alguma regra, mas não era momento de recuar. Descemos tão logo ficamos fortalecidos, mas não encontramos ninguém na pequena casa. Nossos mapas não davam a localização e Lara apresentava sinais de esgotamento. Seus pensamentos invadiam minha cabeça com explosões de palavras que eu não conseguia discernir. O que estava acontecendo com ela?

Fui convencido a procurar o casal e a criança nas imediações e nos deparamos com um grande acidente. Nossas cobaias estavam mortas. Uma fatalidade. Teríamos que reiniciar o experimento. Falei com Lara para retornarmos imediatamente e reportar o fato aos nossos predecessores, mas ela não queria sair do lado dos cadáveres e eu não podia voltar sem ela. Estava preso a uma parceria fadada ao fracasso. Não haviam casos relatados de semelhante comportamento e, por mais que eu lamentasse, teria que me separar dela.

Voltamos com os últimos raios de sol e não permiti que ela passasse novamente outro período em minha bolha. Estava desconfortável e precisava meditar sobre tudo que eu tinha visto, ouvido e, sentido. Minha parceira tinha se tornado preciosa e eu não tinha ainda me dado conta de que não queria evoluir sem ela. Decidi que me empenharia mais para trazê-la de volta à normalidade e pediria a oportunidade de outro experimento para nós. Terminei meu relatório omitindo o comportamento de Lara e fui repousar. Assim que amanhecesse, tomaria as providências das quais ela não era capaz.

Aos primeiros raios de sol fui procurar nossos predecessores, Lara não precisaria estar junto, mas não os encontrei. Fui surpreendido com a notícia de que eles haviam evoluído e outro par seria escolhido para nos monitorar. Aquilo parecia estranho. Tudo sempre era previamente compartilhado para não gerar transtornos evitáveis e a atitude não era compatível com o que tínhamos aprendido até então.

Estava confuso e saí andando meio sem saber o que fazer, quando dei por mim, estava na frente da bolha de Lara. Não tínhamos trancas e, por isso, entrei. Ela não estava lá e também não tinha tomado sua dose. Um sentimento estranho de angústia me oprimiu o peito e meus olhos arderam. Meus pensamentos não a alcançavam e, pela primeira vez andei mais rápido, corri e me vi teletransportando para todos os lugares possíveis dentro de Lugar Nenhum. Ela não estava lá. Não havia motivos para que ela voltasse ao planeta, ainda mais sem mim, e eu não queria chamar mais a atenção do que já tinha feito. Fui checar os monitores. Lá estava ela, de volta à casa das cobaias. Mas por quê, se eles não estavam mais lá? Nem estavam mais vivos!?

Encontrei Lara fraca, vagando pelo pequeno espaço, tocando os objetos como que os reconhecendo com a ponta dos dedos, e me preocupei. Outro sentimento que não estava familiarizado.

- Lara, o que está fazendo aqui? Por quê veio sem mim?

Ela não se surpreendeu. Apenas se voltou lentamente para mim com os olhos úmidos de uma substância que provei e vi que era salgada. Ela estava doente. Era isso.

- Tome, trouxe sua dose. Acho que você está doente porque não se reabastece direito.

Lara caiu sobre meus braços desacordada. Uma agonia tomou conta de mim e não soube bem o que fazer além de me desesperar. A surpresa de seu toque foi outro sentimento a me esmagar o peito. Coloquei-a sobre a cama das cobaias e tentei fazer com que ela bebesse o máximo possível. Dei-lhe também minha dose, não importava que eu ficasse sem, desde que ela ficasse bem novamente.

Fiquei olhando para ela, monitorando sua condição vital e o dia se foi. Nunca havíamos ficado tanto tempo longe de nossas bolhas, porém, assim que ela abriu os olhos, uma sensação de bem estar tomou conta de mim, semelhante àquela que senti em meu primeiro dia em Lugar Nenhum. Acho que era o que as cobaias chamavam de felicidade.

Ela colocou os braços em volta do meu pescoço e muita água salgada saiu de seus olhos e eu beijei seus lábios, e a abracei bem forte contra mim.

Amanheceu e recolocamos nossas vestes. Nossa experiência foi muito intensa e compreendemos coisas que apenas observando as cobaias não dava a ideia de quão profundas poderiam ser. Acho que por isso nossos predecessores nos pediram mais tempo. Contudo, precisávamos retornar o mais rápido possível. As doses reservas haviam acabado e eu não queria ver Lara naquele estado novamente. Ela ainda estava estranha, mas parecia enfim ter aceitado o destino dos humanos. Eu, no entanto, tinha a forte sensação de que estávamos sendo observados, mas não identificava nenhuma energia próxima a nós. A casinha estava vazia.

Levei Lara para minha bolha, ela estava fraca, pois sua estrutura era definitivamente mais frágil que a minha. Procurei por minha dose, mas não estava no lugar de costume. Fui apressado para a bolha dela. Minha vontade era correr, mas não queria chamar novamente a atenção, a sensação de estar sendo observado era ainda mais forte depois que voltamos. A dose de Lara também não estava onde deveria estar. Não havia ninguém no pátio e resolvi retornar.

- Preparem-se. Vocês vão para outro lugar!

Foi o que o novo par de predecessores nos disseram. Eles estavam um de cada lado de Lara que me olhava assustada.

- Eles disseram que estou grávida. – ela enfim falou.

- Gra... O quê? Como? – foi só o que consegui dizer.

Os dispositivos em nossos braços começaram a aquecer e fomos teletransportados para outro lugar. Era um grande espaço, todo branco, com teto alto e muitas portas de correr transparentes. Nossos predecessores nos acompanhavam, Lara a frente com uma semelhante e eu logo atrás com o meu. Estávamos fracos e acredito que tenha sido proposital, pois não conseguiríamos ter qualquer reação, mesmo que quiséssemos. Olhávamos pelas portas dispostas lado a lado, a medida que passávamos pelo grande corredor. Vimos outros pares de predecessores dos quais lembrava estarem no dia de minha chegada à Lugar Nenhum. Nunca mais os tinha visto e, sinceramente, nem dado falta. Nossos predecessores estavam na porta seguinte e comecei a desconfiar do que estava acontecendo.

- O que eles estão fazendo aqui? – apontei.

- Eles vão dar os novos espécimes para Lugar Nenhum – meu acompanhante respondeu.

- E para onde estão nos levando?

- Você já vai saber.

Tão logo ele falou, fomos conduzidos à uma porta, semelhante a tantas outras pelas quais passamos. Colocaram-nos em camas monitorizadas e injetaram substâncias em nossos braços. Um holograma mostrava o líquido percorrendo nossas veias, enquanto dados apareciam demonstrando seu efeito imediato em nossos corpos. Imaginava que estavam cuidando de nós. Enfim eu não tinha me equivocado quanto a estarmos sendo observados desde que os espécimes humanos tinham terminado sua função. Lara realmente precisava de cuidados e eu não tinha com o quê me preocupar. Acho.

Durante as semanas que se passaram eu ficava a maior parte do tempo entorpecido ou em estado de hibernação. Acordava esporadicamente quando higienizado ou alimentado por complexos injetados em mim. Invariavelmente ouvia gritos femininos e choro de recém-natos, mas não conseguia reagir. Lara... Como ela estaria?

Numa dessas vezes ouvi nitidamente Lara chamando meu nome. Era uma emanação fraca, mas insistente: “Faell...” Despertei quase que imediatamente, e vi que ela ainda estava ao meu lado. Seu abdome estava enorme, mas o dispositivo em meu braço dizia só ter passado dois ciclos lunares. O que eles estavam fazendo com ela? O que eu deixei que fizessem com ela?

Deviam estar certos de que eu não acordaria, porque nos deixaram sozinhos. Lara estava presa a vários tubos que injetavam substâncias coloridas e o holograma mostrava a vida dentro dela quase pronta. O que fariam depois que o novo ser nascesse? Certamente cuidariam até a adolescência, mas e depois? E conosco? Lara seria descartada? Nunca mais vi nossos predecessores e intuí que nossa evolução acabava nesse estágio. Deduzi que éramos apenas procriadores de uma raça sempre jovem, mas ainda não tinha concluído até que ponto nossa função seria necessária aos objetivos do grande Original. Quanto mais conjecturava, mais determinado estava a me soltar do que me mantinha preso àquela cama. Precisava sair dali e levar Lara comigo, mas um alarme soou tão logo me levantei.

Rostos desconhecidos me cercaram, e um espécime familiar estava entre eles, meu primeiro predecessor. Tentaram me prender novamente e, pela primeira vez em minha existência, reagi.

- Deixem que eu cuide dele. Ele confia em mim.

Não, eu não confiava, mas dentre todos que estavam ali com expressões pouco amigáveis, ele foi o que me pareceu menos hostil. Várias sensações novas, mas não desconhecidas, invadiram meu cérebro, causando do tremor involuntário à tensão muscular. O tempo passado observando as cobaias humanas e suas reações aos mais variados estímulos, enfim faziam algum sentido. Frustração era uma delas.

- Não temos muito tempo, por isso preste bem atenção.

- O quê está acontecendo com a gente?

- Você foi um dos melhores e mais perceptivos que já tive, mas cometeu o mesmo erro que eu, o de se apaixonar. Também estive onde você está agora, mas não resta mais nada pra mim além de me sujeitar à eles para poder acompanhar meu filho.

- E a mãe dele, onde está?

- Ela não suportou a aceleração. Só conseguiram salvar o feto.

Não tive tempo para lástimas, só conseguia pensar em Lara. Ela estava hibernando, mas visivelmente debilitada. Sua natureza tão sensível não suportaria mais tempo.

- Preste atenção, preciso que confie em mim e não faça nenhuma besteira.

Não sei por que, mas algo nele me fazia acreditar. Eu não tinha para onde ir, ainda mais com Lara naquele estado. Prestei atenção.

- Lara foi um caso raro. Ela encontrou os pais dela e a conexão foi quase que imediata, por isso ficou tão confusa e abatida.

- Nossas cobaias? Então eles...

- Sim. A dose diária que nos faziam tomar não eram simples alimentos, mas um composto vitamínico que além de nos nutrir, ampliava nossos sentidos e nos tornava extremamente férteis. Assim que os casais se formavam aqui em Lugar Nenhum, tudo era uma questão de tempo. Nossa liberdade sempre foi induzida, calculada e monitorada. Quando procriamos, somos separados dos nascidos e enviados sem memória à Terra, de onde não podemos mais voltar. Os poucos que se lembram enlouquecem, se deprimem ou vivem uma vida com a sensação de não pertencimento, de que perderam algo muito importante que daria significado às suas miseráveis vidas.

- Mas, qual o objetivo disso tudo?

- Eliminar as variantes e dominar quando formos um número expressivo. Mas, não percamos tempo com os detalhes. Lara está prestes a expelir, mas está muito fraca. Tão logo vocês se tornem pais, os enviarei para fora da área de vigilância extrema. Você apenas terá que extrair o dispositivo implantado no braço de vocês.

- Por quê está ajudando a gente?

- Quero que consigam o que não consegui. Quem sabe um dia poderão fazer algo por mim, ou pelo meu descendente, se um dia for descartado para a Terra.

Ele era mais experiente do que eu, mas fiquei preocupado com o destino dele.

Em poucos dias experimentei todas as sensações que desprezava nos humanos. Acho que porque descobri que eu não tinha nada de especial, era um deles também, só que melhorado. Meu predecessor cumpriu o prometido, se encarregando de nosso cuidado e, na ingenuidade da falha de segurança, nos libertou daquele inferno tecnológico.

O primeiro lugar que fomos foi à casa dos pais de Lara, ela precisava se despedir do passado. Pegamos coisas que nos seriam úteis nessa nova vida e partimos para bem longe, como orientado. Assim que retirei nossos dispositivos, percebemos que nossas habilidades foram gradativamente desaparecendo, mas também percebemos que outras conexões, bem mais fortes e isentas de artificialidades, foram se solidificando. Ainda temos lembranças da beleza, da organização e da sensação de plenitude que nossa ingenuidade conferia à Lugar Nenhum.

Às vezes conversamos sobre os ideais daquele lugar; de que o princípio poderia ter sido bom em algum momento, que o planeta talvez fosse um lugar melhor se tudo tivesse dado certo. Passamos por momentos difíceis e algumas vezes até pensamos na possibilidade de um dia poder voltar, mas nada poderia substituir o prazer de podermos nos amar e ver nosso Lafell crescer livre.

Fim

por: Rose Paz

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Rose Paz
Enviado por Rose Paz em 30/06/2019
Reeditado em 31/01/2020
Código do texto: T6685041
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