Um lugar melhor

As batidas na porta às 5 da manhã só poderiam significar uma coisa. Thiên An Chung sentou-se sobressaltado na cama, sua esposa Linh Nguyên acompanhando seu movimento, olhos arregalados.

- Abram! É a Polícia Psíquica! - Gritou uma voz autoritária.

- As crianças... - murmurou Thiên An para a esposa. - Fique com as crianças.

Pulou da cama, passando a mão pelos cabelos em desalinho.

- Estou indo! - Gritou.

Enquanto a mulher corria para o quarto onde dormiam os filhos do casal, Ánh Mai, de 6 anos, e o caçula Duy Khánh, de 5, Thiên An abriu a porta do apartamento. À sua frente, estavam três policiais com o uniforme preto da Polícia Psíquica. O do meio segurava um documento impresso.

- Você é Thiên An Chung? - Indagou o policial, lendo o nome no papel.

- Sim, sou eu... mas o que querem?

- Parabéns, Chung - replicou o policial com um sorriso sardônico. - Você e sua família acabam de ganhar uma realocação permanente.

O trio entrou na sala, enquanto Thiên An recuava.

- Qual é a acusação? - Indagou ele.

- Livre pensamento - replicou o policial com o mandado.

* * *

A família Chung, a qual havia sido autorizada unicamente a trocar pijamas e camisolas por roupas formais e nada levar, sequer objetos pessoais, foi embarcada na traseira de um utilitário negro da Polícia Psíquica, estacionado em frente ao bloco de apartamentos onde viviam, sob os olhares depreciativos ou hostis dos vizinhos que saíam para o trabalho ou escola.

- Sempre desconfiei deles - comentou uma vizinha ao passar pelo veículo.

- Estão por toda parte... onde menos se espera - concordou outro.

Dois policiais sentaram-se junto às portas traseiras do utilitário, enquanto o que havia apresentado o mandado seguiu na frente ao lado do motorista. Parecia que temiam que a família tentasse a fuga, o que obviamente era improvável.

- Para onde estão nos levando? - Indagou Thiên An.

Silêncio.

Após rodarem por um período que pareceu extremamente longo aos prisioneiros, mas que não durou mais de 30 minutos, foram desembarcados no que deveria ser um estacionamento subterrâneo de alguma instalação governamental. Escoltados pelos guardas, os Chung entraram em um elevador e desceram num andar que lembrava um grande laboratório, com técnicos de jaleco branco e roupas escuras operando terminais de computador e complexa instrumentação eletrônica. Foram conduzidos até uma sala isolada, no fim de um corredor, onde meia dúzia de técnicos os aguardavam.

- Bem-vindo, senhor Chung - saudou-o o técnico mais velho, um homem de cabelos grisalhos. - Eu sou o Dr. Long Hòa Sái, diretor deste departamento. Pedimos suas desculpas pelo tratamento inconveniente...

E virando-se para os guardas:

- Estão dispensados, assumimos daqui.

- Estaremos no corredor, caso alguém precise de um incentivo - replicou em tom ameaçador o policial do mandado, antes de sair com seus companheiros.

- Posso contar com sua cooperação, senhor Chung? - Indagou o cientista.

Thiên An olhou para sua família, que estava aterrorizada, e balançou a cabeça.

- Sim. Sim.

- Muito bem - disse o doutor Sái. - Vamos passar para a próxima sala. Vocês irão fazer alguns testes, inofensivos...

Na sala, branca e nua, exceto por um banco comprido de madeira e uma pesada porta de aço com uma escotilha de vidro grosso, foi ordenado aos Chung que se despissem.

- Mas aqui... na frente de vocês? Por quê? - Tentou objetar Thiên An.

Um dos técnicos abriu a porta de aço, revelando um compartimento cinza, de não mais de 2 X 2 m.

- Precisamos verificar alguns dados biométricos de vocês, nesta câmara. Só vai levar uns instantes - prometeu o Dr. Sái.

Envergonhados, os Chung tiraram suas roupas e entraram na câmara, que foi fechada atrás deles. Em seguida, ouviram o ruído de um exaustor sendo acionado.

* * *

A primeira coisa que os Chung perceberam, é que havia uma claridade cegante sobre eles, fazendo com que protegessem os olhos com os braços e mãos. E também que um vento fresco soprava sobre seus corpos nus.

- O que houve... que lugar é esse? - Indagou Linh Nguyên, atônita.

- Eu não sei... - murmurou Thiên An. - A câmara blindada desapareceu...

Aos poucos, a visão do grupo entrou em foco. Estavam numa clareira arenosa em meio a um bosque de árvores novas, e o sol brilhava forte em meio às copas ralas das árvores. Cerca de dois metros à frente deles, havia uma mesa rústica, construída com galhos de árvores e amarrada com embiras. Sobre a mesa, peças de roupa, igualmente grosseiras, empilhadas por tamanho, de forma organizada. Os Chung aproximaram-se, e começaram a procurar peças que lhes servissem. Quando acabaram de vestir-se, perceberam que duas pessoas vinham aproximando-se, por uma trilha da floresta: um homem e uma mulher, jovens, vestidos com as mesmas roupas grosseiras que eles.

- Olá! - Saudou a mulher, erguendo a mão direita espalmada. - Bem-vindos à Colônia!

[Conclui em "Santuário"]

- [22-02-2019]