O Vazio de Boötes
- Prioridade Zero? Sério? - Inquiriu Vu Minh para Lam Phat, ao ser desembarcado de pijamas no cruzador da companhia que aguardava em órbita, pronto para partir.
- Nunca tivemos um chamado tão sério quanto esse: é uma ameaça que pode destruir todo o universo - redarguiu o colega, acionando a sequência de decolagem no painel holográfico à sua frente.
- Mas não me deram tempo sequer para trocar de roupa! - Protestou Vu Minh.
- Você vai ter tempo para colocar o uniforme quando entrarmos no hiperespaço - retrucou Lam Phat. - Eu mesmo estava na piscina de casa, e cheguei aqui de calções.
O cruzador saiu de órbita instantes depois, e após vestir-se adequadamente, Vu Minh foi posto a par do problema que teriam que resolver.
- Suponho que já tenha ouvido falar nos geradores de bolhas quânticas produzidos pela companhia - principiou Lam Phat.
- Sim... são usados por laboratórios de grande complexidade para testes de falso vácuo e constantes universais, se não me falha a memória - replicou Vu Minh. E, testa franzida:
- Essas coisas são perigosas!
- Muito perigosas - acedeu Lam Phat. - Tanto, que só são liberadas para uso no espaço intergalático... que é exatamente para onde estamos indo.
- Defeito? - Questionou Vu Minh.
- Mau uso; pelo menos, essa é a versão oficial da companhia. Tudo aconteceu tão rápido, que quando o alarme soou... bom, já não havia mais nada para periciar.
- E... o que a companhia fez, exatamente? - Indagou Vu Minh.
- O que determina a lei: emitiu um alerta de evacuação imediata num raio de dez anos-luz... e nos mandou tapar o vazamento, se posso usar essa expressão.
- Quanto tempo temos?
- Cerca de 15 h; e terá que funcionar de primeira, ou talvez não dê para tentar de novo - admitiu Lam Phat.
- Você já encarou uma situação dessas? - Indagou Vu Minh preocupado.
- Sempre há uma primeira vez - filosofou Lam Phat. - Esperemos que não seja também a última.
* * *
O cruzador emergiu do hiperespaço em meio ao vácuo intergalático, onde as únicas luzes visíveis assinalavam a presença de galáxias distantes. Lam Phat consultou os sensores de longo alcance e fez uma rápida avaliação da situação.
- A bolha de vácuo quântico está com um dia-luz de diâmetro, e continua crescendo, à velocidade da luz - declarou. - Vamos posicionar os implosores no hiperespaço, à uma distância onde seriam atingidos em 30 minutos, e detonar remotamente.
- Estamos à um mês-luz de distância do epicentro da bolha... crê que é longe o suficiente? - Vu Minh não parecia convencido.
- Teoricamente, é longe o suficiente - redarguiu Lam Phat. - Já vamos saber em breve. Pronto?
- Pronto - resignou-se Vu Minh, programando o curso dos implosores em nove dimensões.
- É bom que isso dê certo... - suspirou Lam Phat, dando uma última olhada nos sensores de longo alcance. Finalmente, acionou o detonador.
Por um instante, nada pareceu ter acontecido. Em seguida, o cruzador girou loucamente sobre seu eixo, como se fosse um barco atingido por um tsunami, fazendo com que seus ocupantes perdessem momentaneamente a consciência. Quando voltaram à si, a primeira coisa que Lam Phat fez, foi consultar os sensores de longo alcance. Abriu um sorriso.
- Ei! Funcionou... mandamos a bolha para fora desse universo!
- Sempre pensei que os implosores serviam para destruir uma bolha de vácuo - comentou Vu Minh, ainda sentindo a cabeça rodar.
- Essas coisas não podem ser destruídas, - retrucou Lam Phat - apenas mandadas para outro lugar. Que este outro lugar seja fora do nosso universo, já é bom o suficiente.
- Vamos supor que esse outro lugar não tenha a nossa tecnologia de eliminação de bolhas de vácuo, o que acha que irá acontecer? - Questionou Vu Minh.
Lam Phat lançou-lhe um olhar torto.
- Preocupe-se com quem paga o seu salário, meu caro.
E deu por encerrada a conversa.
- [22-01-2019]