Sonho
Maria desde pequena possuía uma notável sensitividade em relação ao oculto e sobrenatural. Desde o vislumbre do agrupamento de luzes no céu, à visões de aparições, inúmeros foram os casos observados por ela, geralmente desacreditados pelas pessoas ao seu redor, por se tratar de uma criança, e todos nós sabemos que crianças não mentem, mas são muito mentirosas de vez em quando.
Quando Maria já se encontrava como mãe de família, ela passou por algumas dificuldades de natureza financeira, daquele tipo que algumas famílias sempre passam. Foi em um dia normal como outro qualquer, após uma discussão com seu marido, que Maria foi dormir com uma angustia e uma sensação estranha dentro de si. Quando no meio da noite um frio inexplicável tomou conta do seu corpo, como se uma manta embebida em água gelada a cobrisse dos pés a cabeça. Ela tentou abrir os olhos num primeiro momento e prestar atenção nos sons a sua volta. Tudo que podia sentir era apenas uma presença, como se ela estivesse sobre uma maca hospitalar sendo observada por uma turma de estudantes de medicina. Aos poucos ela pôde abrir os olhos e o que viu em seguida fez seu estômago revirar e suas entranhas congelarem. Ao redor da maca onde ela se encontrava deitada estavam paradas quatro figuras observando-a. Seu primeiro pensamento foi gritar mas seu corpo não respondia aos seus comandos. Só lhe restava observar seus observadores de volta. As figuras não usavam roupas e sua pele tinha uma tonalidade pálida e acinzentada, suas mãos frias de dedos longos retiravam aquela espécie de cobertor que a cobria, como uma mãe que retira o lençol de um filho para acordá-lo. Aqueles seres convidaram-na para sentar-se na maca. Ela olhou ao redor para situar-se e viu que estava num lugar desconhecido, mal iluminado, como numa sala sem cantos. Sua atenção se voltou aos seres que falavam com ela sem emitir sons, como uma voz dentro da sua cabeça.
- Não tenha medo. Viemos levá-la.
- Por que eu?
- Você possui uma sensibilidade notável que a torna um ótimo exemplar da sua espécie.
- Para onde eu vou?
- Se vier conosco, todas as suas angústia, dores e dificuldades acabarão. Os que você deixar para trás não mais passarão por problemas e dificuldades.
- Eu posso vê-los?
Neste momento um dos seres sai da sala e retorna com uma espécie de bacia prateada e reluzente com um líquido viscoso de aparência metálica. Ao debruçar-se sobre a bacia, Maria pôde ver sua família. Seus dois filhos com o semblante de tristeza como quem tivesse chorado o dia inteiro, seu marido com aquela expressão de impotência diante de uma situação em que ele não poderia resolver.
- Mas eles estão tão tristes.
- A dor é inevitável, o sofrimento é opcional.
- Eu não quero ir... Eu quero voltar.
Como se um véu negro se estendesse diante dos seus olhos e lhe cobrisse o rosto, Maria torna a deitar e cai no sono como quem mergulha na escuridão de um buraco negro. O frio vai embora. Volta o calor. Já é dia.
No café da manhã Maria conta o sonho ao seu marido.
- Isso é o que dá assistir àqueles filmes de terror antes de dormir...
Neste momento, seu marido liga a televisão no instante em que passava um programa de entretenimento matutino e o convidado era um ufólogo.
"É muito comum pessoas que foram abduzidas não lembrarem do acontecido ou terem flashbacks em forma de sonhos. São inúmeros relatos de pessoas que se viram em lugares escuros sem cantos, sendo observados por pessoas. Se você já sonhou com algo desse tipo, ligue para nós e conte-nos a sua história..."
Maria e o seu marido olharam-se rapidamente quando ele lhe alertou:
- Nem invente de ligar...