Aos pés do Kilimanjaro - Parte II
Bom dia Linnus…
Ouço essa voz suave todas as manhãs nos últimos dez anos.
Bom dia Sara Norfolk…
É Sara O’Brian!
Sara… você é tão romântica, quase boba… Como uma engenheira espacial pode ser tão ortodoxa?
Sr. Linnus, saiba que estou com você porque quero, e mesmo não sendo mais admitido o sobrenome por alteração de status civil, eu sempre quis ter o seu nome, acho bonito… E eu quero assim.
Uma coisa que aprendi logo cedo, desde que comecei a viver com Sara é que, depois de decidido algo por ela, a possibilidade de fazê-la mudar de ideia beira o zero.
Contemplei aqueles olhos cinzas e ajustei a imagem para luz natural, para poder me perder naquele mar…
Despertar numa barraca de acampamento era algo que a quase totalidade dos Redentores sequer ousara pensar. Até mesmo Sara pensou um pouco quando propus fazer o caminho do Kilimanjaro sem trajes hidropressurizados. Mas aquele olhar matreiro logo assentiu para a aventura.
Eu ainda fico impressionado que você tenha se adaptado em apenas uma semana na gravidade da terra, Sara.
Meu bem, você na verdade já está adaptado, mas sua regulagem fisiológica de percepção… como você é teimoso!
Não brigue comigo, Sarinha! Você sabe que pedi essa regulagem pro meu trabalho.
Eu assumo que tenho o maior orgulho do seu trabalho, Sr. Novo Manet, mas eu me preocupo porque você tem que ficar sentindo dor para se “inspirar” na suas obras. Seria tão mais simples reverter o protocolo fisiológico, mas até resfriados e rinites você usa para inspirações, e elas só se curam porque você não tem escolha.
Ok Sara, não vamos mais falar disso, vamos lá fora tomar nosso café da manhã.
Sara usava protocolo de regeneração pleno, dizia não gostar de sentir dor nenhuma. Como moça das exatas, ela era humanamente sensível, mas avessa à dor.
Nosso acampamento era bem simples: duas barracas coligadas, uma separada para higienização (banhos, etc.), cercados por uma rede neuro iônica para evitar insetos e demais animais nocivos. No nosso passeio usamos um colar iônico que tem a mesma função. No dia anterior pudemos aproveitar a mata aos pés da montanha brilhante, e também pudemos tomar banho nus em uma cachoeira mais escondida da rota.
Recusamos o guia humano, pois queríamos privacidade e optamos por um androide aranha e uma nuvem nano protetora para nos acompanhar.
Após nosso desejum, repleto de frutas nativas e cápsulas alimentares, nos preparamos para avançar, seria um dia longo até chegar à base da escalada.
Manet: Pintor realista