Bar espacial

- Vou logo avisando... esse lugar é um tremendo pé-sujo.

Entramos num salão enfumaçado e mergulhado na penumbra - provavelmente para que os frequentadores não pudessem julgar o aspecto da comida servida. Havia ali criaturas de meia Galáxia, de imensos zimmus peludos, até nokarianos cinzentos de meio metro de altura, passando por grupos de melkis esguias, em animada conversa feita por toques de suas longas antenas. Junto ao balcão, estavam alguns tipos humanoides e até mesmo um velho robô, aparentemente montado com peças sobressalentes.

- Se é tão ruim assim, o que estamos fazendo aqui? - Questionei.

- Esse é o último bar antes de Heelapahash. Vai ser uma longa travessia pelo hiperespaço... e o uísque daqui é legítimo.

Aproximamo-nos do balcão. Meu amigo pediu dois uísques ao barman, o dele sem gelo.

Ficamos por ali, bebericando, até que o robô aproximou-se de nós.

- Vi a sua nave no hangar J. Vocês vão para Heelapahash? - Indagou em voz baixa.

- Por que quer saber? - Retrucou meu amigo.

- Eu tenho uma encomenda para ser entregue em Tulah Centram. Pago metade agora e metade contra entrega, pelo destinatário.

- Nossa nave é particular, não fazemos serviço de entregas - foi a resposta seca do meu amigo.

- Pago 3000 créditos - disse o robô.

Entreolhamo-nos. Daria para cobrir as despesas alfandegárias em Heelapahash e ainda sobraria um troco para gastar com as garotas do Setor Nove.

- Do que se trata, afinal? - Indagou.

O robô abriu um escaninho no peito e dali extraiu um cubo de metal avermelhado, coberto de arabescos, com cerca de 5 cm de aresta. Colocou-o sobre o balcão.

- É uma unidade de gravação de dados harasi - explicou. - Precisa ser entregue ao destinatário para que um negócio importante seja fechado.

- O que lhe faz pensar que não vamos vender a sua peça em outro lugar, por preço melhor? - Questionei.

- Isso seria inútil - retorquiu o robô. - Este dispositivo só funciona na presença de sua outra metade, que está em Tulah Centram.

Dito isto, voltou a guardar o objeto no escaninho peitoral.

- Bem... - ponderou meu amigo. - Acho que poderemos lhe fazer esse favor.

- Ótimo! A que horas partem?

- É só o tempo de terminarmos os uísques e pagar a conta.

- Eu os encontro no hangar J para fazer a transferência - respondeu, afastando-se em direção a saída do bar.

O barman, que acompanhara a conversa à distância, aproximou-se.

- O robô tentou convencer vocês a levar uma encomenda até Tulah Centram?

- Sim - assentiu meu amigo. - Mas por que a pergunta?

- Esse robô tem problemas. - E bateu com o indicador na têmpora.

- O que quer dizer?

- Ele está nessa estação há mais de 100 anos. Aparentemente, alguém o deixou aqui para que ele entregasse uma encomenda a um portador que faria a parte final do serviço. Esse portador, todavia, nunca apareceu.

- E aí ele tenta concluir a tarefa, terceirizando-a?

O barman assentiu com a cabeça.

- Mas depois, parece lembrar-se de que não pode entregar a encomenda a qualquer pessoa, e desaparece. Não irão encontrá-lo no hangar J.

- Parecia bom demais para ser verdade - disse meu amigo, tomando o último gole de uísque.

Saímos do bar, na periferia do espaçoporto, e nos dirigimos para o local onde nossa nave estava pousada. Efetivamente, não havia qualquer sinal do robô.

- Fico pensando que negócio importante seria esse que deveria ter sido fechado 100 anos atrás - comentei.

- Certo mesmo é que alguém deve ter perdido muito mais do que 3000 créditos - respondeu meu amigo. - E, por estas alturas, certamente já estará morto e enterrado...

- Não se for um harasi - ponderei. - Eles podem viver mais de mil anos.

Entramos na nave. Se eu estivesse certo, aquela iria ser uma espera das mais longas. Mesmo para um robô.

- [22-07-2017]