Oh, droga!

Quando recuperei os sentidos, estava de cabeça para baixo, preso pelo cinto de segurança do meu Ford Victoria 1958. O carro havia capotado de maneira espetacular, algo tão mais estranho pelo fato de não estar chovendo... e eu não ter batido em nada, numa estrada vazia no meio da noite no deserto do Colorado.

Aparentemente, eu não sofrera nenhum ferimento sério, fora a pancada na cabeça, que me deixara desacordado por um tempo que não deveria ter sido longo. Consegui achar o fecho do cinto, e com cuidado, o soltei. Me vi em seguida deitado no forro do teto do carro, e pude então perceber luzes brancas e brilhantes, como de holofotes, se aproximando. O resgate, muito provavelmente.

- Aqui! Aqui! - Exclamei.

As luzes vieram em minha direção. Daquela posição, meu ângulo de visão era limitado, mas pude ver dois vultos, um maior e um menor, varrendo o automóvel com os fachos de luz.

- Aqui dentro! Abram as portas, estão empenadas!

Ouvi que deram duas batidas na porta do lado do motorista, como que testando a resistência do metal. Depois, ouvi uma voz masculina falar algo numa língua que não compreendi. Parecia estar dando instruções para uma segunda pessoa. Finalmente, comecei a ouvir rangidos e o carro estremeceu: estavam tentando colocá-lo na posição correta.

Lá fora, além dos fachos de luz, estava escuro como breu, e pude apenas imaginar como dois homens iriam conseguir desvirar o carro no braço. Mas, preparei-me, me posicionando sobre o banco traseiro. Instantes depois, com mais alguns rangidos, o Victoria foi girado violentamente e voltou à posição normal. Apesar do susto, não me machuquei desta vez.

Os dois vultos estavam parados ao lado do automóvel, apontando-me as lanternas. Consegui destravar a porta do motorista e sair para o ar do deserto.

- Você está bem? - Perguntou o vulto menor, num inglês correto, mas com um sotaque estranho.

- Acho que sim... levei uma pancada na cabeça, mas não parece ter sido grave.

- Gostaríamos de nos desculpar pelo acidente - prosseguiu o homem. - Estávamos seguindo numa rota de reabastecimento e cruzamos o espaço sobre seu veículo. Você foi apanhado por nosso campo gravitacional e capotou.

- Quem são vocês? - Indaguei, intrigado.

- Eu sou um batedor, e este é o meu zimmu - respondeu meu interlocutor, fazendo um gesto com a lanterna, indicando o seu enorme parceiro. Muito provavelmente, fora o tal zimmu quem colocara o carro na posição certa, sozinho.

- Vocês vieram... da União Soviética?

- Não estou autorizado a lhe dizer nossa procedência. Na verdade, nem deveríamos estar tendo esta conversa, mas como provocamos inadvertidamente o acidente, creio que merecia alguma explicação. Assim que nos retirarmos, o seu veículo deverá funcionar normalmente.

Curvou-se e depositou alguma coisa no solo.

- Estou deixando aqui algo que deverá compensá-lo pelos prejuízos eventualmente causados. Olhe para a luz, por favor.

Houve um clarão, como um flash, e fiquei momentaneamente cego. Quando voltei a enxergar normalmente, os dois estranhos haviam desaparecido.

Voltei para o interior do carro e abri o porta-luvas. Retirei dali uma lanterna à pilha e iluminei o terreno ao redor do carro. Havia dois conjuntos de pegadas, com pés calçados em botas. Um deveria ser do meu interlocutor e o outro, do gigante zimmu.

E no chão, onde fora deixado pelo forasteiro, havia um pequeno cartão dourado, como um cartão de visitas. Nele, estava gravado em baixo relevo a seguinte inscrição em inglês:

"Pague-se ao portador deste a quantia de 500 créditos galáticos".

E em letras miúdas, logo abaixo:

"Válido somente fora do Sistema Solar".

- [03-07-2017]