DOMINAÇÃO
Dominação.
18 de março de 2021 (210318).
...A nave troiana Wodan, comandada pelo capitão Regert, desceu no asteroide Ceres, onde estava estabelecida a colônia terrestre; o antigo Acampamento Fuchida, hoje a próspera Nova Tóquio.
A pouca distância ficou a enorme Vranara do milkaro Pru Atol 7752, numa pausa antes de prosseguir para a Terra na sua missão de busca.
Como passageiro na Wodan, ia o príncipe Angztlán de Ran, despertado logo após 10.400 anos de hibernação dentro da pirâmide truncada de Pomona.
Após entrar pelas enormes eclusas o príncipe deparou-se com um ambiente opressivo; esmagador. Os colonos pareciam comportar-se como zumbis.
Contudo, o viajante foi recebido com cortesia.
–Quero falar com o governador Fuchida – disse o príncipe.
–Há um guia à sua disposição – respondeu o funcionário da alfândega.
Angztlán foi conduzido pelos profundos corredores da agora enorme cidade subterrânea num veículo de antigravitação até o centro de Nova Tóquio.
*******.
Fuchida, já com seus cabelos branquíssimos, estava à sua espera, acompanhado de seu colaborador, o professor Cabot, marido da sua neta.
Após as apresentações, Angztlán disse, em espanhol, que já dominava:
–O capitão Aldo deverá ter-lhe informado que pretendo julgar o Décimo Terceiro Conselheiro Zvar, pelos crimes de alta traição ao Império Raniano. Crimes de traição, genocídio e também pela destruição do planeta Ran, há 10.400 dos seus anos.
–Estou ciente disso – respondeu Fuchida.
–Onde está ele?
–Numa cela especial recoberta com tela mental, construída pelo coronel Alan Claude Sarrazin, na sua visita, dois anos atrás, em 2019.
–Ele é perigoso, possui o poder de dominar mentes à sua volta.
–Já vimos seu poder em ação – interveio o professor Cabot.
–Como pretende julgá-lo? – perguntou Fuchida.
–Não aqui, porém em Titã; pelo Imperador Tao, o Impiedoso, descendente direto do último Imperador de Ran, Ramsés XVIII – disse o príncipe.
–É um pouco longe para transportar um ser tão perigoso...
–Também penso assim, governador. Mas o Imperador é a única autoridade no sistema solar com poder para administrar a justiça devida para este caso.
–Prepare o que for preciso para essa tarefa. Entretanto, podem ficar aqui um tempo, até sua nave ser reabastecida e a tripulação construir nela as instalações necessárias para o transporte do prisioneiro.
–Muito obrigado, governador.
–O professor Cabot tomará as providências.
*******.
Angztlán foi conduzido ao local onde era mantido o terrível prisioneiro. Junto dele, encontrava-se um menino de seis anos, de aparência meio japonesa, meio ocidental.
–Meu filho, Hadime – disse o professor.
–O quê essa criança está fazendo aqui? – disse o príncipe – Não sabe que é perigoso?
–Não há perigo nenhum – disse o garoto – o que não entendo é o que vocês pretendem com julgar este pobre ser, por uma coisa que aconteceu há tanto tempo.
O príncipe Angztlán, antigo herói, habituado a lutar corajosamente em batalhas espaciais, sentiu um estranho tremor no corpo ao ouvir as palavras do garoto. Algo não estava certo.
–Tem certeza, professor, que o equipamento está ligado e funcionando?
–Claro!
Angztlán pegou seu comunicador:
–Angztlán para Regert!
–Prossiga.
–Preciso de Pru na cela de Zvar, com um pentacorder milkaro.
–A caminho.
–Para que isso? – perguntou o professor.
–Zvar está dominando este garoto de uma forma que não consigo perceber.
–Ninguém está dominando-me! – protestou o menino ceresano – Apenas acho uma crueldade o que estão fazendo com ele!
–Você não entenderia meus motivos, menino – disse o raniano.
–Tente, pelo menos, explicá-los.
–Você sabe o que ele fez, não sabe?
–Vi o vídeo feito antes de eu nascer, com sua confissão para meu pai.
–Então não preciso explicar mais nada.
–O sistema de governo da época não mais existe, seu império é apenas uma vaga lembrança, o universo mudou, o que você quer não é justiça, apenas vingança, como foi feito na Terra no século passado, com outros casos parecidos. Estudei a História, forasteiro.
–Não conheço a história da Terra, mas se não fosse a ordem do Imperador Tao, puxava agora mesmo a pistola e desintegrava esse miserável no ato, garoto.
–Para vingar-se?
–Não, para livrar o universo de um ser tão perverso. Os deuses sabem do que ele seria capaz se escapasse e tomasse posse de um planeta, dominando os habitantes.
–Claro, com todos querendo que ele morra, não me admira que ele procure salvar-se de qualquer maneira...
–Se ele fosse perdoado e solto, o quê você acha que ele faria primeiro?
O garoto ficou em silêncio, desviando o olhar do príncipe e dirigindo-o ao prisioneiro, que estava vendo-os através da fina malha de ouro eletrificado com táquions, que cobria sua cela de vitroplast transparente, agora sem disfarçar seu olhar de profundo ódio, o que fez Cabot tremer.
–Não sei – disse por fim o garoto – Talvez procurar sua princesa Biltis, que disse estar por aí, por esses espaços, congelada...
–Se ele escapasse – disse Angztlán – A primeira coisa seria matar todos nós, pegar uma nave, e fugir para um planeta bem povoado, onde possa controlar pessoas, para finalmente dominar o mundo todo e lançá-lo à conquista de outros. Tudo isso aproveitando seus poderes e seus conhecimentos, já que após a queda do Império Raniano, esta região do universo regrediu muito, em cultura e tecnologia. Não concorda, garoto?
–Sim, pode ser.
Nesse momento chegou o milkaro, recém-desembarcado, com seu pentacorder, acompanhado por um funcionário e um tripulante da Wodan.
–Está ligado – disse Pru, em seguida – um pouco fraco, mas ainda suficiente.
–Obrigado Pru.
–Não sei, não, Angztlán. Se eu fosse você, dava um tiro nele agora mesmo e terminava com o problema. Sabemos que desde a data estelar 890420, há uma diretriz do Departamento de Inteligência da Frota Estelar que classifica os seres parasitas da espécie Dominion como criaturas a serem mortas assim que percebidas dentro de todo o território da Suprema Confederação. E este sistema está dentro do território confederado, queiram os terrestres ou não.
–Não posso fazer isso e enfrentar o Imperador depois.
–Mas você já pensou o que este monstro solto em Taônia iria a fazer?
–Pensei e tento me conter.
Enquanto a Wodan estava sendo reabastecida, no seu porão foi construído um receptáculo para a cela eletromagnética, onde Zvar seria transportado.
Os tripulantes estranharam o fato de que os colonos não se mostrassem interessados em fazer uma festa para ouvir suas aventuras, coisa comum nas colônias.
Os colonos ceresanos; ao contrário dos vários milhares que habitavam luas, asteroides e planetas; pareciam sempre tristes, com olhares perdidos. Como zumbis.
*******.
O hangar era uma caverna natural, ampliada e fechada com eclusas.
O capitão Regert e o príncipe encontravam-se ao lado da escadinha da nave, quando um raniano inferior aproximou-se deles.
–Salve, príncipe Angztlán – disse na antiga língua raniana.
–Salve. Quem é você?
–Meu nome é Ikol Huaski, príncipe. Sou o mentor do pequeno Tadashi, irmão gêmeo de Hadime. Fui oficial de máquinas da belonave Analgopakin.
–Sabemos sua história. Há registros na Wodan sobre o que aconteceu. Você tinha sido dominado por Zvar, depois morreu, e finalmente reviveu,
quando Zvar foi para a cela especial.
–Sim.
–O que você quer?
–Algo terrível está acontecendo aqui, príncipe.
–Que coisa?
–Pessoas desaparecem, e aparecem depois com diferenças de caráter.
–Explique-se.
–Após minha... "Ressurreição"; logo que partiu o coronel Sarrazin, comecei a perceber que as pessoas não são mais as mesmas. Acho que tem a ver com Zvar.
–Ele não está bem seguro na cela de táquions?
–Pareceria que sim, mas ainda há algo acontecendo que não sei explicar. O menino Hadime está comportando-se de maneira estranha, logo após os eventos da visita do coronel Alan Claude. Meu protegido, Tadashi, já o percebeu.
–Você acha que Zvar está dominando-o?
–Tenho certeza.
–De que maneira? Segundo Pru, a cela chamada Chave de Milkar é bem segura, seu povo inventou isso para derrotar uma raça telepática; muitos milênios atrás, em Milkar, que os terrestres conhecem como Andrômeda...!
–Mas este ser é mais do que telepático, ele pode sair do seu corpo, viajar pelo espaço e entrar em outro, como fez comigo...
–Isso foi previsto também pelos milkaros.
–Talvez, mas se o menino não está dominado, está ao lado de Zvar. Ele insiste em ficar perto dele, sempre que pode...
–Percebi.
–Seria melhor matá-lo. Tentei faze-lo tempo atrás, mas ele não deixou.
–Ele quem?
–O governador Fuchida.
–Claro. Tinha que ser.
Nesse momento, o tenente Bachín apresentou-se com uma pistola na mão.
–Senhores – disse – estão presos.
–Como? Está fazendo uma dessas ridículas piadas terrestres?
–Por ordem do governador, vocês estão presos e sua nave confiscada.
–Você deve estar louco para vir aqui sozinho e dizer isso – disse o príncipe Angztlán, puxando sua pistola solar de ação dupla.
Bachín atirou com a pistola de balas, e o retrocesso jogou-o longe, em contra da parede do hangar, devido à infinitesimal gravitação.
Angztlán, habituado a lutar no espaço esquivou a bala de urânio e atirou.
Bachín desintegrou-se.
–Rápido, embarcar todos! – gritou Angztlán.
Os troianos estavam todos por perto e ouviram a ordem nos capacetes, correndo a embarcar na Wodan.
Quando houve embarcado o último, abriu-se a porta interior do hangar e apareceram os seguranças da colônia, atirando.
Na ponte, Regert disse:
–A eclusa está fechada, como sairemos?
–Dispare nela – disse Angztlán.
–Não perca tempo! – acrescenta Pru.
–Certo, lá vai! – disse Regert, convencido da sabedoria do conselho dos dois alienígenas, mais experimentados do que ele.
O canhão disparou, e a bala nuclear atravessou a porta sem explodir, fazendo um rombo pelo qual o ar começou a escapar, junto com objetos e pessoas.
–Pequeno demais – disse Pru – Não tem outro tipo de arma?
–O canhão marciano! – disse o piloto Petersen.
O canhão de Marte abriu um buraco tão grande, que a sucção do vácuo arrastou a Wodan para fora, junto com um grupo de soldados e objetos. Regert ligou os manobradores e a nave começou a afastar-se de Ceres. Os canhões de superfície começaram a disparar.
–Enlouqueceram de vez – disse Petersen.
–Não – disse Ikol, que embarcara com eles – Zvar dominou Fuchida, dominou todos de alguma forma que suspeito seja através do menino Hadime.
–Pode ser – disse Angztlán – Zvar é bem capaz de fazer isso.
–Como pegá-lo?
–Com todos protegendo-o será impossível – disse Regert.
–Alan Claude relatou que Zvar dominou o corpo de uma mulher para pegar carona com ele – disse Angztlán – e aqui há outra nave, a Analgopakin.
–Sim – disse Ikol – mas a nave nem está aqui. Está ancorada perto, usamos espaço motos para ir até lá, pensando nessa possibilidade.
–Ainda bem – disse o príncipe.
–Passamos a agir assim depois da visita de Alan Claude Sarrazin.
–Como sabemos que você não é cúmplice de Zvar, senão o próprio? – disse Angztlán repentinamente.
–Quanto a isso, só posso dar minha palavra, príncipe.
–Por enquanto vou acreditar em você – disse Angztlán, e encarando o capitão Regert, acrescentou:
–Vamos sair daqui antes que nos acertem com esses canhões.
A Wodan foi para o outro lado do asteroide, saindo da linha de tiro antiaéreo, enquanto Angztlán pensava numa estratégia.
–No espaço não podem nos atingir – disse – e não podemos pegar o maldito.
–Você devia tê-lo matado enquanto estávamos lá embaixo – disse Pru.
–Sim, você estava certo.
–Não creio que tivessem deixado vocês saírem vivos se o tivessem feito. Só não os atacaram antes porque esperavam que abastecessem a nave – disse Ikol.
–Sim. Pode ser. E agora?
–Vamos declarar Ceres em quarentena – disse Regert – Petersen, tente fazer contato com Marte ou com qualquer outro lugar perto daqui.
*******.
A mensagem de Marte foi traduzida para Angztlán e Pru pelo capitão Regert:
“Por mim, vocês poderiam explodir em pedaços esse maldito asteroide, mas Fuchida é amigo de Valerión e Cabot é amigo de Aldo. Também não esqueçam que Ceres é agora uma colônia japonesa e o Japão Livre Imperial é o maior aliado terrestre contra nosso inimigo comum.”
“Não acho uma boa ideia, porém, permitir a saída de quem quer que seja, desse lugar.”
“Estou enviando uma frota para garantir um bloqueio seguro: uma nave da classe Hércules, duas da classe Antílope, algumas patrulheiras AR-I e caças CH-III devem ser suficientes."
"Um total de 25 naves. Duvido que Fuchida consiga furar esse bloqueio. Com isso teremos tempo para pensar no que fazer, até que Aldo apareça e tome alguma atitude”.
Elvis Santos
–O governador de Marte foi bem claro – disse Regert.
–Sugiro esperarmos por aqui até a frota chegar – disse Angztlán.
*******.
Alguns dias depois, a frota de Marte chegou para organizar o bloqueio. Os marcianos tomaram posse da Analgopakin e Ikol passou para a mesma, já que Regert opôs-se a levá-lo na Wodan por causa da desconfiança que despertou em toda a tripulação, de que pudesse estar sendo dominado sutilmente pelo poder do nefasto Décimo Terceiro Conselheiro Zvar Zyszhak de Ran.
–Nunca saberemos – disse Petersen – na dúvida é melhor deixá-lo aqui mesmo.
–Vamos para Marte, para completar o reabastecimento interrompido em Ceres, logo do qual, seguiremos para a Terra – disse Regert.
–Falta combustível para os manobradores – disse Schultz.
–E alimentos – disse Petersen.
–Até Marte podemos chegar – disse Regert.
Interessado em conhecer o planeta onde poderiam estar os restos do seu antepassado Pru Atol Numero Um, Pru disse:
–Voltarei para a Vranara. Vocês ficarão bem?
–Sim – disse Regert – Obrigado por tudo, capitão Pru.
E assim, a Wodan dirigiu-se ao planeta vermelho, onde a colônia terrestre prosperava, num sistema de governo livre da nefasta influência da Nova Ordem Mundial, do Grupo dos Treze, que tanto tinha feito sofrer a Humanidade, e que apesar de perder a guerra ainda tinha certo poder no hemisfério norte.
*******.
Nesse meio tempo, eles não sabiam detalhes do que estava acontecendo com Aldo Santos e Alan Claude Sarrazin fora do Sistema Solar; sendo ambos levados pelos alakranos para seu remoto mundo.
Apenas sabiam que Marte, Júpiter e Saturno estavam enviando material de guerra e soldados para Alfa Centauro em naves de formato sofisticado, capturadas pelos terrestres.
Mal sabiam os ocupantes da Wodan que, apenas chegassem ao planeta Marte, seriam impedidos de prosseguir para a Terra, devido a fatos que ainda estavam para acontecer.
Entre os asteroides, uma força maléfica reorganizava-se para partir para a desforra: os remanescentes dos piratas, escondidos nos asteroides.
Com poucas naves movidas a conversor cósmico, procuravam descobrir onde estava o conversor principal. Apesar de tê-lo usufruído por milhares de anos, nem mesmo eles sabiam sua localização.
Agora, desligado pelos terrestres; não conseguiriam nunca achá-lo, apesar de ter passado bem perto dele, nos asteroides Troianos.
De todas as maneiras, atacando esses asteroides, conseguiriam mantimentos como para manter-se roubando e assaltando naves mercantes.
E estavam pensando em voltar-se para um planeta civilizado e rico, como por exemplo, Marte.
*******.
Continua em: GUERRA CIVIL - OS RETARDATÁRIOS
*******.
O conto DOMINAÇÃO - forma parte integrante da saga inédita Mundos Paralelos ® – Fase II - Volume V, Capítulo 38; páginas 19 a 25; e cujo inicio pode ser encontrado no Blog Sarracênico - Ficção Científica e Relacionados:
http://sarracena.blogspot.com.br/2009/09/mundos-paralelos-uma-epopeia.html
O volume 1 da saga pode ser comprado em:
clubedeautores.com.br/book/127206--Mundos_Paralelos_volume_1