DEPOIS DO INCIDENTE

Pomona, 31 de Janeiro de 2014. (140131)

–Nunca tive tanta certeza, Herr Kapitan.

–É muito arriscado, ficará abandonado à sua sorte...

–Nada vai acontecer nesta rocha! Quero água, comida e ar para dois meses.

Aldo e von Kruger discutiam na bolha-laboratório ao dia seguinte dos terríveis acontecimentos. Lídia, Nahuátl e Jacques estavam presentes.

–Entenda professor. Concordo que Pomona deve ser pesquisado mais a fundo, que os tesouros arqueológicos que aqui estão devem ser catalogados; mas resisto à idéia de que fique abandonado como náufrago nesta... Nesta... Ilha espacial.

–O robô será uma ajuda inapreciável. Melhor do que um notebook.

–Se o capitão concordar, Isis e eu podemos ficar – disse Nahuátl – isto nos interessa mais a nós do que a vocês. Podem deixar o equipamento de processamento que desembarcamos da Analgopakin, o suporte de vida e alimentos para nós. Podem ficar também alguns dos meus tripulantes auxiliares.

–Concordo.

–Ótimo! Agora poderei preparar tudo para despertar o príncipe Angztlán e realizar outras coisas. É imprescindível que eu fique – disse o professor.

–Opino igual que o professor – disse Lídia.

–Eu não – interveio Jacques – pois assim a nave perderá seu primeiro cientista.

–Camarada Jacques! Considero-me suficientemente capacitada para assumir as funções do camarada von Kruger! – cuspiu a doutora com visível irritação.

–Ja! A doutora pode me substituir muito bem, Herr Jacques.

–Pardon madame – disse Jacques avermelhando sua face impecavelmente barbeada – Não foi minha intenção ofendê-la.

–Está desculpado Tovarich – e seus olhos cinzentos adoçaram-se ao dizer:

–E eu também peço desculpas pela minha grosseria.

Aldo, de braços cruzados, descruzou-os e levantou o olhar, até esse momento fixo nas botas de todos eles.

–Agora que os Herrs, Monsieurs e Tovarichs estão de acordo, vamos planejar os próximos passos – quatro pares de olhos encararam o capitão – não dá para atrasar mais nossa jornada. Fique, von Kruger, se assim é feliz...

–Claro que sou.

–E também Isis e Nahuátl. Deixarei homens de apoio e um avião para defesa.

–Não é preciso tanto, Herr Kapitan...

–É sim. Resolvi neste momento, deixar um rádio farol de orientação.

–Genial capitão! Esta rocha pode ser valiosa para os que nos sigam.

–Sim, doutora. Pomona pode vir a ser uma estação de refresco nos asteroides e devemos aproveitá-la ao máximo para que tenha valido a pena perder três homens.

–Quatro tripulantes humanos; senhor capitão – murmurou Nahuátl Ang com a pedra vermelha da testa brilhando como fogo.

Todos os olhares fixaram-se nele.

–Quatro?

–Há um espírito desencarnado em volta de nós. Vladimir Chekov acaba de morrer... Quê os deuses o acolham! Agora está em uma dimensão mais elevada!

*******.

Após designar os tripulantes que ficariam, organizou-se o Acampamento Von Kruger (AVK). Ficaria o professor, o casal de alienígenas, o tenente Adolphe D'Hastrel com o seu avião, o radio-operador Otelo Negro Báez, o eletricista Cables, o engenheiro Karapsias e o sobre cargo Martos.

Além do avião e do robô, dispunham de duas bolhas; uma delas para morar; água, ar, alimento humano para quatro meses e uma boa provisão de alimento raniano.

Aldo decidiu deixar os dois canhões restantes da vimana Analgopakin em duas fortificações estratégicas, para defender o AVK e o setor de produção onde ficariam vinte ranianos para manutenção dos processadores e geradores.

Enquanto as tripulações realizavam preparativos, Aldo e Nahuátl foram a

examinar a pirâmide por dentro. Na câmara mortuária, Aldo disse:

–Logo vou partir e os deixarei em paz, mas enquanto os motores esquentam, quero dar uma outra olhada por aqui.

–Nunca vi uma pirâmide por dentro, capitão, mas li sobre elas e eu sei que embaixo da urna deve haver uma sala de pertences.

–Vejamos – disse Aldo, afirmando-se e empurrando a urna de pedra.

A urna pesaria vinte toneladas, mas ali pesava apenas alguns quilos. Embaixo havia uma entrada retangular e uma escada que se perdia na escuridão.

Ligaram as luzes dos trajes. Ao fim da escada depararam-se com o maravilhoso espetáculo da sala de pertences do príncipe. Havia trajes luxuosos e multicoloridos, capas, armaduras de vôo e combate, armas, espadas de vários tipos...

–Espadas? – admirou-se Aldo.

–A arma dos cavaleiros. Era digno matar um inimigo que se podia tocar com a espada. Um cavaleiro tinha que matar um rival à distância do seu braço, capitão.

–Eram valentes. Veja a variedade de armas antigas que há aqui.

–Eram nobres. Conquistaram uma esfera com raio de 123 parsecs em volta e se hibernavam com tudo o que usaram na vida anterior.

–Não entendo essa forma de pensar – disse Aldo – Para que hibernar? Quê motivo tinha este ser para dormir... "Até depois do fim do mundo?”.

–Isso, capitão, nem imagino.

–Pensar que isto foi criado antes que minha espécie tivesse história escrita.

–Isto acabou há dois mil cento e oitenta ciclos, capitão – uns 10.400 ciclos dos seus. Foi o tempo que durou nossa viagem de ida e volta ao quadrante Delta...

–Conhece os objetos que há aqui?

–Quase todos. São velhos, mas não totalmente desconhecidos.

–E esse objeto tão grande... Como fizeram para colocá-lo aqui?

–Tele-transporte de matéria era bastante normal na época...

–Ah...! – os olhos de Aldo brilharam através do visor.

–Sinto muito. Não sei fabricá-lo, mas se vejo um, sei como operá-lo.

Não podia ver a face de Aldo, mas Nahuátl, por sua condição de alienígena não conheceria sua expressão de desconsolo. Porém o imaginou.

–Para alegrar seu espírito informo-lhe que esse objeto grande que lhe preocupa é um mini-explorador de caça e transporte para catorze pessoas.

–Maravilha. E como se sobe a bordo?

Não podia ver a face do raniano, mas, Aldo, por sua condição de humano, não conheceria sua expressão de riso. Porém o imaginou.

A nave retangular de 24 metros de longitude, largura de 14 e altura de cinco, era arredondada na proa, eriçada de sensores; com duas nacelas de 14 metros por um; tinha três patas redondas. A eclusa a estibordo tinha um fecho raniano padrão, como o da nave caída. Ao abrir, o ar de 10.400 anos saiu de repente.

–A bomba não funciona, mas há ar. Feche a porta para não perder o resto.

À luz das lanternas, passaram ao pequeno quarto de trajes e ferramentas. Daí passaram ao alojamento com quatro beliches. Duas portas indicavam a existência de sanitário à direita e despensa de comida à esquerda.

–Vamos à cabine – disse Nahuátl – é uma nave de combate super lumínica, rápida e quase invisível. Quatro pilotos e dez guerreiros podiam patrulhar as fronteiras muitos ciclos sem serem detectados e realizar ataques de surpresa ou espionagem.

–Pode pilotá-la?

–Posso, mas deve estar sem energia. Vamos lá atrás, aos motores.

O raniano examinou tudo à luz da lanterna e puxou seu pentacorder do cinto de utilidades. Após comprovar a ausência de radiação; abriu uma caixa oval, tirando de dentro uma barra metálica de corte quadrado.

–Como o imaginei; a ist ranaeraclvuro a ist eraclklet... Não sei como dizê-lo em seu idioma... O metal pesado e radiativo, chamado ranaeraclvuro, transformou-se, com o passar do tempo, no metaloide pesado e inerte chamado eraclklet.

–O urânio transformou-se em chumbo. É mais ou menos isso. Entendi.

–Deve ser – concordou Nahuátl, analisando outros elementos – pelo menos o eraclxarn está intacto... Os antigos usavam muito isto.

–Mercúrio! – disse Aldo, ao identificar o elemento – Para quê serve?

–É um metal líquido para repelir a gravidade. Este sistema antigo é eficiente, as naves milkaras ainda o usam, aperfeiçoado. Nós usamos um sistema como o seu.

–Como funciona?

–Aqui há dois recipientes de eraclxarn. Quando o ranaeraclvuro, chega ao ponto crítico, o eraclxarn esquenta e gira velozmente dentro das bobinas, diminuindo o peso da nave.

–Mas como pode...?

–Não me pergunte a teoria. Posso fabricar um antigravitator experimental. É uma técnica antiga, mas, repito, não me faça teorizar, porque não sou técnico. Sei que funciona. Isto ainda se usa em alguns planetas do setor...

–E para alcançar as estrelas?

–Isto gera o plasma que circula pelas bobinas das nacelas, ativa a contenção da antimatéria que passa neste cristal de controle do injetor... Que por sinal está intacto...

–Para mim chega – disse Aldo – mais o menos como minha nave funciona; com energia obtida a partir da antimatéria em ínfima quantidade. Deixaremos tudo como está, Nahuátl. Você terá bastante tempo para examinar e catalogar tudo até a chegada da Vingador. Deixe a vimana como está, até minha volta... Talvez.

–Como fará para tirá-la daqui?

–Isso não é assunto para hoje, Nahuátl. Não me faça perguntas difíceis.

*******.

Pomona – 1º de fevereiro de 2014.

Após enterrar os mortos, Aldo foi a bordo da Analgopakin, para interrogar os Alfas; que estavam em estado lamentável. O contramestre raniano explicou que eles recusavam a comida comum e a das pequenas naves, tinha acabado. Sua comida era exclusivamente líquida e orgânica. Havia pedaços de carne dissolvidos.

–Vou drogá-los. Segundo a doutora, vão falar tudo o que quero saber.

–Como desejar.

–Aldo para Regina! Estás monitorando?

–Estou, querido. Prossiga.

Aldo tinha informações do século passado sobre os alienígenas cinzentos do tipo Alfa.

Além do mais, os ranianos da Analgopakin sabiam sua procedência: a estrela Barnard da constelação da Rede, vizinha à região de Doradus e seu planeta natal era Zeta Reticuli IV, a noventa anos luz da Terra.

Sabia sobre suas atividades secretas: abdução e experimentação com humanos, mutilação animal, programa de criação de híbridos humano-alienígenas, construção de bases subterrâneas em Porto Rico (Laguna Cartagena), sul dos Estados Unidos e Islândia.

Além das informações de domínio público: os corpos de quatro seres (um deles ainda vivo, naquele tempo) foram recuperados pela Força Aérea americana perto de Roswell, Novo México, em 1947, com a espaçonave danificada.

A "entidade biológica extraterrestre" (EBE) morreu em 1952.

Contatos subsequentes com esses alienígenas resultaram em um acordo, no qual os Estados Unidos permitiriam aos cinzentos abduzir humanos e animais em troca de tecnologia. Sua ciência trata de engenharia genética.

Eles supostamente tiveram parte na alteração da genética humana no decorrer dos últimos milhares de anos.

Parece que estão tentando um cruzamento entre eles e os humanos, para criar uma raça híbrida superior, o que lhes permitirá explorar a Terra como uma fazenda. Os cinzentos parecem não ter emoções e são cruéis com os humanos.

Pequenos, humanoides, altura entre 1m e 1,4m, corpos magros e frágeis, braços finos e desproporcionais em relação ao corpo, com quatro dedos na mão, unidos por membranas, cabeça grande, sem cabelo; olhos negros e enormes; narinas minúsculas e boca pequena.

Não têm orelhas, apenas o orifício. O sangue é amarelo pálido e se reproduzem por clonagem, ao que parece.

*******.

O Terror que se aproxima.

–Não há nada a conversar – disse em raniano vulgar com forte sotaque, o alien que parecia líder – não há nada para trocar que seja importante.

–Mentira! Vocês nos invadem impunemente há décadas. O quê vocês querem? Por quê nunca nos contataram? – perguntou Aldo, embora soubesse a resposta.

–Quem disse que não o fizemos? – o ser parecia rir com ironia, apesar de ter sido drogado com pentotal – Contatamos seu governo central há muitos ciclos.

–Então há troca. Sabemos que vocês estão em conluio com o governo mundial da Terra. Sabemos que abduzem pessoas e as matam ou as devolvem com doenças, sabemos que criaram doenças para nos matar aos poucos...

–Criamos novas doenças por ordem do seu governo central, para seus líderes lucrarem na venda de medicamentos e dominarem seu povo, eliminando os não produtivos das raças inferiores...

–Suspeitava algo assim! Então, há o que discutir.

–Não, não há. Menos agora, que vocês estão em expansão.

–Qual era sua missão? Resolveram mudar-se de vez para a Terra?Sabemos que tinham uma nave mãe e uma frota, quando o capitão Nahuátl Ang os derrotou...

O pequeno ser fez uma longa pausa, por fim disse, com os olhos vidrados:

–Devíamos impedi-los de expandir-se, mas o raniano nos deteve.

–Nos impedir? Como?

–Estávamos indo a invadir a Terra, para estabelecer-nos lá.

–E o governo da Nova Ordem Mundial sabia?

–Sabia. A condição era que destruíssemos os antárticos, ou seja, vocês. Eles nos dariam toda a América do Sul, Antártida, África e Ásia.

–Mas... O quê vocês têm contra nós?

–Vocês são perigosos, ressurgiram depois de muito tempo e se não forem detidos vão nos exterminar, como tentaram fazer há milhares de ciclos.

Era isso.

Os Alfas levaram a pior com os ranianos; que abortaram a invasão sem querer. Aldo devia uma a Nahuátl, mas este jamais saberia. Matara-lhe quarenta e tantos tripulantes, remorso que teria enquanto vivesse. Mas se recompôs e perguntou:

–O quê mais o governo mundial fazia por vocês?

–Nos autorizava a descer, colaborava com a pesquisa e fornecia alimento.

–Quê tipo de alimento? – gritou Aldo – A carne dos nossos compatriotas?

–Sim, é claro, dos seres dispensáveis das raças inferiores.

O horror o invadiu ao confirmar que se alimentavam de líquido corporal, como o monstro milkaro. A Nova Ordem Mundial aceitava isso em troca de tecnologia!

–Malditos vampiros! – gritou Aldo, perdendo a calma no cúmulo de sua indignação – Não sei se matá-los agora mesmo ou esperar que morram de fome. Mas o pior de tudo é o mil vezes maldito governo mundial, que os tolera!

–Vocês não estão livres de nós... Pode nos matar... Outros estão vindo...

–Veremos – disse Aldo – agora sei como derrotá-los.

–Sabe mesmo? – ironizou o pequeno ser – kholems mais poderosos estão a caminho com toda sua civilização para instalar-se na Terra e vão exterminar vocês como insetos para usar matéria prima, sol, água, ar, minério...

–De que planeta eles são? Qual a estrela?

–De muitos e nenhum, eles avançam, abandonam mundos esgotados e seguem em frente. Agora chegou a vez de vocês... Estudam este setor faz muito tempo.

–Como sabe disso? Vocês são aliados deles?

–Derrotamos alguns batedores há muitos ciclos. Baixamos a base de dados e achamos vocês. Somos mais rápidos e chegamos antes... Eles agora estão vindo do sistema 819; que já esgotaram, a 74 parsecs daqui, no setor 0.19, marco 1.819.

–Regina?

–Estrela 819, setor 0.19, marco 1.819... Segundo o catálogo raniano; para nós é Bellatrix, Gamma Orion; distância, 242 anos luz; Aldo. Um bocado longe.

–Quando vão chegar?

–O autoplaneta deles alcança dobra dois – respondeu o Alfa Cinzento.

–Regina?

–Vinte e quatro anos, Aldo. Não há como saber quanto já percorreram.

–Daremos conta deles.

–Vocês não têm chance, eles são poderosos... Um autoplaneta com milhões deles...Armas vão incinerar suas cidades... Fizeram isso muitas vezes... Vocês todos vão morrer em um dia... Eles vão desembarcar e caçar os que restarem vivos...

–Veremos.

–Vocês serão exterminados – disse o pequeno ser parecendo rir – eles não são tão discretos como nós. Depois de esgotar a Terra vão partir para outra caçada.

–Não há forma de entendimento?

–Não estão interessados. Eles tomarão o que querem da Terra e seguirão em frente, para atacar os mundos mais fracos da Suprema Confederação.

–Não perde por esperar, maldito vampiro – disse Aldo, friamente. E saiu fora.

*******.

–Tenente Weiss, o contramestre Bachín será seu segundo. Seus auxiliares diretos serão Ruiz, Carlos de Paula e De Leon, como já foi estabelecido.

–De acordo, senhor. E os Alfas? O quê eu faço com eles?

–Leve-os para o Ponto de Apoio. Tenha cuidado, são traiçoeiros. Se algum deles sobreviver, entregue-o ao Dr. Klinger. Os mortos também. Precisamos saber como são por dentro. Diga ao doutor que preciso esses dados com urgência.

–E quanto às naves deles?

–Entregue-as ao pessoal da técnica para tentar duplicá-las e ver as limitações. Quero que baixem a base de dados e me enviem na próxima nave.

–Será feito, senhor.

–Outra coisa, Weiss: os tripulantes ranianos devem ser tratados como aliados. O capitão Nahuátl está dando instruções a eles sobre como devem comportar-se.

–Sim senhor. Mais alguma coisa?

–Entregue ao meu irmão esta unidade de dados com os diários de bordo

atualizados e toda a informação que extraí dos kholems. É informação vital, tenente; é importante que você a estude na viagem.

–Sim, senhor – disse Weiss colocando o diminuto pendrive no bolso interno da armadura – Até a volta, capitão... E desejo-lhe sorte lá em frente.

*******.

Após uma hora, as naves separavam-se em rumos opostos.

Com um atraso de noventa e seis horas, a Hércules adentrava-se mais no cinturão de asteróides. Na privacidade da sua cabine, Aldo lamentava-se amargamente com sua confidente e conselheira, pela morte dos ranianos que salvaram a Terra de ser invadida.

–Percebeste o que eu fiz, Regina?

–O que devias. Eles atiraram primeiro.

–Fui um carniceiro.

–Ces’t la guerre, querido. Lutaste bem.

–Tratei o nobre e educado capitão Nahuátl como um cachorro...

–Tinhas teus motivos.

–Mas eles salvaram a Terra.

–Nunca saberão. Queres que apague o registro da conversa com os Alfas?

–Não! Já está a caminho de Marte e da Terra. Elvis e Marcos precisam saber, a humanidade precisa saber da conspiração do governo com os Alfas... E eles têm que saber urgentemente do terror que se aproxima do espaço profundo.

–Fizeste tudo o que é certo. Agora não te martirizes, querido.

–Me sinto péssimo.

–Sei como te sentes, querido. Isso é natural.

–Preciso compensar Nahuátl, de alguma maneira...

–Não faltará oportunidade, meu querido. Agora chora bastante, chora tudo o mais que puderes, que a porta está trancada.

Aldo ocultou seu rosto no peito da psicóloga e chorou como uma criança.

No corredor, os tripulantes iam e vinham atarefados; sem saber o quanto seu capitão estava sofrendo na sua cabine.

E nunca saberiam.

*******.

Cinturão de Asteróides – 7 de fevereiro de 2014

Ontem, a Hércules retomou sua jornada com 19 tripulantes a bordo.

"–... Ele não tinha a culpa de ser como era. Seu instinto ordenava-lhe

sobreviver... Saiu do ovo e procurou alimento. Quem pode culpá-lo?...”.

Tais eram os dizeres da vitrine onde estava o pequeno monstro empalhado que Lídia tirara do ovo antes de nascer. Ficava inaugurado o mini-museu da Hércules.

–Como o chamaremos? – perguntou Inge – Acho que Monstro Sintético Para Guerra Biológica é muita coisa.

–Ao que sabemos, procede de um lugar chamado Milkar – disse Regina.

–Alien, de Milkar? – aventurou Inge.

–Konstantin estudou os mapas ranianos; melhores que os nossos, e acha que Milkar deve ser um lugar na galáxia espiral M-31, amigas – disse Lídia.

–A galáxia de Andrômeda – observou Regina, após consultar rapidamente o terminal do sistema – talvez isso...

–Não se fala mais: Vampiro de Andrômeda – disse Inge.

–Adequado – disse Lídia – Soltavam milhões deles para matar a população de um planeta, até não sobrar seres vivos. Logo os bichos se comiam uns a outros, o que acontecia rápido, visto o acelerado metabolismo que possuem; e sobrava um só; que morria logo de fome e o planeta estava pronto para ser ocupado.

–Bem prático – comentou Regina.

–E cruel – acrescentou Inge.

–A guerra é cruel, amigas – retrucou Lídia Maximova.

Chegando a um acordo, as três mulheres da Hércules, terminaram de organizar o mini-museu, que entre outras coisas incluía o holo diário da nave raniana do passado; alguns objetos da Analgopakin; da pirâmide truncada; e muitas fotos, enquanto a nave prosseguia velozmente em inércia para Júpiter.

*******.

–Estamos atrasados – disse Aldo.

–Onze dias, capitão – disse Jacques – com todas as paradas, as desacelerações e acelerações, vamos chegar pelo nove ou dez de março.

–A Vingador já terá partido – disse Boris.

–Acho que fará uma parada demorada em Pomona – concluiu Aldo.

–Fiquei bem intrigado com esse tal de príncipe Angztlán Pachacuti – disse Jacques, pensativo – Um aventureiro, guerreiro, príncipe e conquistador de planetas; terminar daquele jeito, esquecido, numa pirâmide semidestruída, num pedaço do que foi seu mundo... Dormido por milênios na beira da eternidade...!

–...E que o acaso colocou no nosso caminho – completou Regina, que entrava nesse momento na ponte e pegara a conversa no meio.

–Foi completada a tradução do diário? – perguntou Aldo.

–Sim, querido. O sistema serve para mais do que te derrotar sempre no xadrez.

–Cuidado que não te escute – disse Boris – já sabes como são hoje em dia os computadores. Lembra o HAL-9000 do filme que...

–O computador é um queridinho, agora que é meio positrônico – disse Regina, sorridente – Boris, meu amor, vamos enviar à Antártica um informe monstruoso.

–Não pronuncies essa palavra na minha frente.

–Desculpa, Aldo. Mas se Erich von Däniken estivesse aqui, ficaria estarrecido.

–Quem é esse?

–Um escritor suíço do século XX, que afirmou serem os deuses astronautas.

–Parece que estava certo – disse Boris.

–Estava, querido. Ridicularizado e abafado pela ciência oficial, ele tinha razão.

–Imagino que suas obras não existirão mais à venda – disse Aldo – e se ele era tão esclarecido como afirmas, a ditadura deve tê-lo mandado matar...

–Também achei. Pelo menos até 2008 ainda estava vivo. Pesquisei no sistema e descobri obras dele em alemão, inglês, português e espanhol, que consultei enquanto vocês; homens belos, valentes, aguerridos, corajosos e muito machos; faziam coisas rudes e horrorosas, como explorar pirâmides, abrir sarcófagos, fabricar combustível, interrogar alienígenas safados e matar monstros... Ah...! Desculpa Aldo...!

–Tudo bem. Lídia enterrou os ovos em Pomona, em local seguro e secreto.

–Foi melhor assim. Se essas coisas caírem em mãos erradas...

–Seria um desastre, Regina. Lídia descobriu que esses bichos; além de clones são hermafroditas que se autofecundam e botam ovos ao ficar adultos... O que não demora muito em... Ah...! Quero esquecer!

–Desculpa, Aldo. Mas voltando ao assunto: com o que temos e a base de dados dos ranianos, que baixamos para o sistema; Inge fez um programa que inclui tudo que sabemos. Tiramos conclusões incríveis; parece que os egípcios, maias, astecas, incas e outros, são descendentes dos... Digamos, escravos da Atlântida, e o mais interessante é que os atlantes sobreviventes foram para terra seca, no deserto de Gobi, onde se misturaram com os arianos e daí surgem os chamados godos ou góticos, que depois invadiram o norte da Europa. Gregos e romanos são de outra rama da raça ariana. Podemos reconstruir a História do mundo dentro desta nave, Aldo.

–Não duvido madame – interveio Jacques – A História do mundo nunca foi bem contada. Meu pai lecionava História na Sorbonne e ao advir o... Ah... Essa merde toda que aí está, foi preso e desapareceu... Eles não poderiam deixá-lo lecionar.

–Sei bem como se sente, Jacques – disse Aldo, lembrando do seu pai, um conceituado cientista, professor de história e político, que sofreu o mesmo destino horrível.

E foi sincero quando disse, com um suspiro, quase um soluço:

–Sinto muito!

–Professores de História e de filosofia foram os primeiros a cair, após o golpe, antes ainda do que os militares dissidentes... – disse o francês.

Regina lembrou de seus pais assassinados e ficou sombria. Jacques o percebeu:

–Ma petite madame; vamos acabar com todos esses malditos parasitas, vamos vingar nossos mortos queridos e vamos ressuscitar os livros antigos!

–Pois é, Jacques – disse Regina, mais animada – queria falar sobre isso.

–Fala, querida, tua voz é música para nossos ouvidos – disse Aldo.

–Bobão! Os livros antigos, Vedas, Mahabharatta, Samarangana Sutradhara, Nihongi e Popol Vuh; que Inge lançou na base de dados deram um milk-shake de matar, Aldo. Todos esses livros são verdadeiros em sustância.

–Valerión ia gostar de saber disso.

–Saberá. Inge está digitalizando e enviando para Marte nossas conclusões.

–Ótimo. Só queria possuir mais conhecimentos do assunto e tempo para me dedicar a esses estudos, Regina.

–Sei que gostarias. Mas há outra coisa, queridos amigos; há todo um universo concorrido, congestionado em volta de nós, que quase não somos visitados pelos grandes viajantes do cosmos.

–É bem possível – concordou Aldo – A não ser pelos pequenos vampiros que estão em conluio com o governo mundial.

–A conclusão do sistema da Hércules, é que somos uma reserva...

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Continua em: OS CENTAUROIDES

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O conto DEPOIS DO INCIDENTE - forma parte integrante da saga inédita Mundos Paralelos ® – Fase I - Volume II, Capítulo 13; Páginas 48 a 56, e cujo inicio pode ser encontrado no Blog Sarracênico - Ficção Científica e Relacionados:

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O volume 1 da saga pode ser comprado em:

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Gabriel Solís
Enviado por Gabriel Solís em 07/11/2016
Reeditado em 08/11/2016
Código do texto: T5816035
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