O EREMITA
Quando chegou a noite (23 horas de escuridão de uma rotação de 46), os antárticos recolheram-se para jantar e descansar.
No iglu, tudo era atividade.
Os homens enfileiravam-se nus no chuveiro, entrando de três em três, já que o Mudo o modificara para economizar água e energia.
As mulheres ajudavam-se umas às outras com as botas e os trajes espaciais.
O cozinheiro servia os pratos fumegantes encima de uma asa de avião de reposição deitada sobre duas caixas de munição como mesa improvisada.
Após o banho colocavam roupa branca limpa e sentavam em caixas de munição ou sacos de farinha.
As divisórias tinham sido retiradas no inicio para fazer lugar ao material delicado que não podia ficar na intempérie e o iglu parecia um enorme galpão.
No meio daquela Babel em várias línguas, ouviu-se a voz de Inge; nua e pronta para o banho, com o braço entalado envolto num saco plástico:
–Onde estão Aldo e Boris?
–Saíram no Jeep – afirmou Regina, enrolada na toalha.
–Por favor, Konstantin – disse Inge – veja em quê andam esses dois, que eu vou entrar no banho. Diga-lhes que venham jantar.
–Vou tentar – disse o russo – o rádio deles é de curto alcance.
*******.
Dez minutos depois, Konstantin desistiu.
–Há outra solução – disse Inge, já de banho tomado, roupa limpa e uma toalha enrolada na cabeça, parecendo um Sikh paquistanês – O Jeep Lunar possui um emissor de sinal-código, um localizador automático... Eu o projetei.
–Não temos satélite lá encima como em Marte. O rádio não tem alcance aqui.
–Com um avião podemos localizá-los, Konstantin – rebateu Inge.
–Não precisa repetir, Mademoiselle – disse Ives, que acabara de jantar – sairei à sua procura assim que vista meu traje.
–Faça a gentileza – disse ela – Regina disse que foram para o sul.
–Já é um começo – disse o piloto francês.
–Vou junto – disse Konstantin.
–Não, camarada – disse Ives – seu jantar vai esfriar.
–Sim, Konstantin – disse Inge – vá jantar.
–De acordo – disse o russo, convencido de que seria de pouca ou nenhuma ajuda para Ives, um piloto experiente.
*******.
O sol ocultara-se.
Ganímedes e Calisto, em quarto minguante, ocultavam-se detrás das montanhas, Europa e Amaltea eram pontos diminutos. Júpiter dominava o céu, iluminando tudo. Ives foi atrás das marcas infravermelhas do jeep, voando baixo.
Logo ouviu o sinal código e a tela mostrou o veículo parado no meio da plantação. O CH-2 pairou baixo. Ives examinou freneticamente o local com o sensor. Percebeu as pegadas de Aldo e Boris afastando-se do carro e chegando junto das plantas...
–Mon Dieu! – exclamou – Vegetais quentes...?
Percebeu um terceiro par de pegadas que se juntavam às dos camaradas e depois os três iam até as marcas de um veículo que se afastou pelo lado oposto em direção a um passo entre montanhas.
Ives elevou-se e, ultrapassando as montanhas, chegou a um vale onde viu pontos luminosos numa parede rochosa e algumas construções de pedra.
Junto a elas, encontrava-se o maior veículo de seis rodas que ele vira em toda sua vida. Então se elevou até uma altura em que do acampamento o pudessem captar e radiou:
–Ives para Acampamento Muslimov!...
Após comunicar as novas, Ives pousou no vale com luz apagada e ficou de prontidão na cabine.
Em minutos chegaria reforço e não queria ser percebido por quem estivesse nas construções assentadas nas paredes de pedra que rodeavam o vale escondido a menos de trezentos metros do avião.
Na frente da maior das construções, onde viu o veículo de transporte, havia uma abertura. Com infravermelho, Ives viu dentro dela o que pareciam ser máquinas agrícolas e fardos de folhas; sem dúvida daqueles vegetais quentes.
Em uma das construções menores, havia uma janela redonda iluminada com luz mortiça; amarelada, e uma eclusa padrão como as das naves ranianas.
Ives fixou a vista nessa janela, sentado em silêncio apenas perturbado pela respiração no capacete.
Com uma mão no gatilho e outra no botão de partida, mantinha-se camuflado pela escuridão, radiando o sinal-código para os camaradas.
Passaram cinco minutos que pareciam horas; quando Tom Cikutovitch e Ivan Kowalsky; pousaram verticalmente ao lado dele, no maior silêncio. Antes do pó se assentar, chegou Jacques Cartier, que pousou à esquerda.
Em seguida abriram as cabines transparentes. Pilotos e passageiros pularam ao chão de areia grossa. Além dos pilotos; vinham Marnes, Simon e Wassermann, armados de fuzis e pistolas marcianas e logo tomaram posições de assalto.
Ives ouviu a voz de Marnes nos fones:
–Ives, fique em posição para nos proteger. Os outros, venham comigo!
–Sim. Liguem as câmeras dos capacetes, vou monitorá-los.
Pilotos e astronautas se aproximaram com cautela à construção iluminada. Ao comprovar que não havia ninguém do lado de fora, se concentraram na eclusa, mas antes Marnes deu uma olhada cautelosa na janela.
Dentro, Aldo e Boris conversavam animadamente ao redor de uma mesa com um indivíduo de longos cabelos e barba brancos; iluminados por uma lâmpada no teto, igual às da Analgopakin; sentados em rústicos bancos de madeira.
–Está pegando, Ives?
–Estou. Será que encontraram Santa Claus?
–Não creio – disse Marnes, aliviado – não vi as renas por aqui.
Dentro viu três capacetes em cabides na parede. Na mesma parede, apoiados junto das mochilas, dois fuzis de ameaçador aspecto. Na mesa, três canecos que o dono de casa, de costas à janela, enchia com um líquido fumegante, proveniente de um bule grande de aspecto singular.
–A reunião parece animada – disse Ives.
–Sim. O capitão já me viu – disse Marnes.
Aldo levantou a vista e viu o contramestre pela janela. Deu uma cotovelada em Boris, que identificou a bandeira confederada, pintada no capacete.
–O dono de casa não me viu, Ives.
–Acho bom entrar já, Mon ami.
–Também acho. Wassermann! Abra a eclusa com cuidado, pode ter armadilhas. Os pilotos entram depois. Simon e Wassermann entrem comigo!
Wassermann abriu a eclusa. Marnes fechou a porta externa e as válvulas funcionaram com surpreendente rapidez. A porta interior abriu-se e os três entraram com as armas engatilhadas.
Marnes foi dando ordens ao mesmo tempo em que fechava a eclusa interna para que os pilotos entrassem:
–Simon, veja os outros quartos! Wassermann; vigie este sujeito, que não faça o mais mínimo movimento!
–Será um prazer – disse Wassermann enfiando o cano preto do fuzil no meio dos olhos do homem de cabelo branco.
–Capitão! Comandante! Estão bem?
–Sim, Marnes. Não há perigo – respondeu Aldo.
–Contramestre! Há um monstro na cozinha! – gritou Simon.
–Não o matem! – disse Boris – não é perigoso.
–Félix es inofensivo! – disse o dono de casa.
O olhar dos recém chegados fixou-se nele, ainda com as mãos em alto e a boca do fuzil de Wassermann a milímetros do seu nariz. Falara em espanhol.
–É minha mascote ganimediana – acrescentou o homem velho, ao momento em que os pilotos entravam com as pistolas em punho.
Ao ouvir o dono, "Félix", como os ganimedianos, porém quadrúpede, deslizou como um cão com o rabo entre as patas até o cômodo principal com medo de ser castigado por esses seres grandes e rudes que invadiram seu lar.
O animal sentou-se sobre as patas traseiras e com as mãos de quatro dedos serviu-se alimento. Tinha pulmões grandes para respirar a rala atmosfera de Io e comportava-se como um cachorro treinado.
–Senhores – disse Aldo – agora que nosso anfitrião viu a eficiência da minha tripulação, abaixem as armas. Alguém pode se machucar.
–Não há perigo, rapazes – acrescentou Boris.
–São rápidos e eficientes – disse o velho com um suspiro de alívio quando Wassermann retirou o fuzil da sua face.
O dono da casa serviu canecas de café aos recém chegados, inclusive aos pilotos. Não havia cadeiras para todos, pelo que alguns ficaram em pé.
–Gosto muito quando recebo visitas, amigos.
–Recebe muitas visitas, presumo? – perguntou Marnes incrédulo.
–Quase não vem ninguém – respondeu o velho com tristeza – a última vez que veio alguém para me ver foi há dois anos... Ou foram quatro?... É tão difícil contar o tempo neste lugar, sem fazer inúmeras contas...!
–Quem veio lhe visitar? – interessou-se Ives, que entrara por último.
–Os colonos do outro lado da lua.
–Ah! Colonos... – disse Kowalsky, fazendo cara feia ao café.
–Como eu passara tempo sem aparecer, pensaram que tinha morrido...
Aldo colocou um comprimido amarelo no café de Kowalsky e disse baixinho:
–Mexa com a colher e experimente agora.
Ele bebeu um gole e disse no mesmo tom:
–Adoçou. Mas isto não pode ser café, capitão.
–E não é – concordou Aldo – isto é... Como é mesmo o nome?
–Akok – respondeu o velho – Um chá de Ganímedes.
–Ah! – exclamou Kowalsky – Logo percebi que este chá era de Ganímedes!
A risada foi geral, bem-vinda e relaxante. Quando se fez o silêncio, Aldo disse:
–Rapazes, vocês merecem um resumo do que acontece aqui.
Os olhos de todos dirigiram-se ao seu capitão.
–Nosso anfitrião chama-se Francisco Del Puerto, espanhol de Santander e chegou em 1946, com espanhóis e gente de outras nacionalidades.
–Incluída Ana Sánchez, de Salamanca, que depois foi minha esposa – disse o velho, com um sorriso dos seus olhos azuis no rosto branco, demarcado pelo cabelo longo e sua barba bem aparada.
–Pessoas de outros países? – perguntou Karl Wassermann.
–Sim, amigos – afirmou o velho – da Alemanha, Finlândia, Itália, Portugal, Grécia, Turquia, Suécia, Noruega, Dinamarca, Islândia, Romênia...
–Mas... Como e por quê? – perguntou Jacques Cartier.
–É uma longa história – disse o velho – o capitão sabe a parte que eu não sei.
–Ah!... – exclamou Kowalsky em tom festivo – Uma parte ele não sabe...!
–Sim, rapazes – disse Aldo – Mas acho melhor avisar ao acampamento que está tudo bem por aqui, antes de continuar com a conversa.
–Eu faço isso, capitão – disse Ives, colocando o capacete – vou ligar do avião, não digam nem façam nada interessante até eu voltar, mes amis.
*******.
A Semente do Espaço.
Na frente de mais canecas quentes de chá estimulante, os homens de Antártica escutavam o relato do velho Eremita espanhol de Io:
–As luas habitadas por milkaros, eram assoladas por piratas. Na maior colônia agrícola milkara, Calisto; era preciso proteção contra os assaltos. Calisto e Ganímedes comerciam entre si legumes de silício e carbono e até transportam os produtos para o entreposto de Plutão, onde as belonaves estelares, os astro encouraçados da Suprema Confederação, costumam abastecer-se de comida, oxigênio e água.
–Suprema Confederação? – perguntou Tom Cikutovitch.
–A potência interestelar que domina todo este setor.
–Como assim... "Domina"? – perguntou Wassermann.
–Este setor – disse o espanhol – é só uma mordida da esfera confederada; uma colônia improdutiva. Um local, digamos; selvagem, como o interior de África para os europeus do século passado e anteriores.
–Um local de produtos exóticos e abastecimento de mantimentos, como uma ilha do Pacífico – aventurou Jacques, pensando nas ilhas de colonização francesa.
–A pirataria ameaçava acabar com esse comércio – disse o anfitrião após a interrupção – O governador milkaro de Calisto pensou que se implantasse uma raça guerreira nas luas, se poderia acabar com a pirataria em meio prazo, ou pelo menos combatê-la com sucesso.
–Mentalidade curiosa – murmurou Aldo.
–Pois é. Aconteceu que foi enviada uma expedição ao quarto planeta, onde ainda viviam em sua superfície os descendentes dos inferiores ranianos.
–Refere-se a Marte? – indagou Karl Wassermann.
–Claro! – respondeu o Eremita – Mas as coisas não seriam como o planejado porque ao chegar avistaram uma nave aproximando-se. Uma nave do mesmo modelo usado por Ran há dezenas de milênios... Uma nave proveniente do terceiro planeta.
–Da Terra! – exclamou Ives, entrando. Monitorava através do capacete de Jacques, que ficara em linha em cima da mesa – Não perdi nada, se querem saber!
–Em efeito – afirmou o velho. Mas essa parte, seu capitão a sabe melhor do que eu, porque em Marte viu relíquias da expedição da Haunebu-3.
–Mas você também sabe o que aconteceu, Francisco – disse Aldo.
–O que eu sei, capitão é sobre a minha viagem. O resto você deve de saber...
–Valerión mandou uma mensagem que eu não li para todo mundo no Ponto de Apoio, rapazes. Só mencionei o fato após descobrir as ruínas do Vallis Marineris...
–Ruínas? – perguntou Kowalsky.
–Sim, Ivan, ruínas terrestres em Marte. Um acampamento abandonado.
–Quer dizer que não fomos os primeiros?
–Infelizmente, Ivan – respondeu Aldo – ou felizmente, talvez. Isso é relativo.
–Conte capitão – disse Tom – quê gente foi essa?
–Em resumo, a coisa foi mais ou menos assim, rapazes: Em 1945, Alemanha estava em situação desesperada. Tentou algo fantástico, algo que não tinha sido previsto para ser realizado com tanta urgência, mas havia uma guerra onde o inimigo destruía cada centímetro quadrado do país com bombas, não importando se matavam civis ou não...
–Como a Nova Ordem Mundial, fez com Afeganistão, Iraque, Líbia, Ruanda, Etiópia, Congo, Angola, Eritreia, Senegal... – disse Marnes – com fome, doenças, gás venenoso, bombas...
–Sim, era uma guerra de extermínio total contra Alemanha...
–Como eles querem fazer conosco, mon capitaine! – disse Ives, sentindo-se imensamente antártico – querem nos exterminar, como fazem com as nações livres.
–Mais ou menos isso – concordou Aldo – e é por isso que naquele momento e lugar era prioritário encontrar uma solução, porque o mundo não seria mais o mesmo após a derrota. As pessoas suicidavam-se por não querer viver no mundo vindouro, decorrente de uma guerra perdida...
–O mundo dos vencedores – disse Ives.
–Sim. O Ministro da Propaganda pronunciou nesse dia seu último discurso, não lembro dele agora, mas está no meu computador de mão.
–Não importa, capitão, prossiga – suplicou Wassermann ansioso.
–Parece que os cientistas alemães, em previsão do fim e suas conseqüências, profetizados pelo Ministro, desenvolveram uma nave disco, baseados nos antigos escritos tibetanos, deixados pelos antigos deuses: a Haunebu-3.
–Pelos deuses?
–Claro, Simon, os deuses ranianos...! Uma gente que já conhecemos. Mas não entrarei em detalhes técnicos. A coisa é que essa travessia era arriscada demais e não oferecia possibilidade de retorno. Possibilidade que sempre tivemos em Marte. Mesmo assim levaram adiante o projeto em abril de 1945, após o Ministro pronunciar o último discurso, ainda sabendo que seria um ato de sacrifício.
–Uma aventura e tanto! – exclamou Simon Gart, sem perceber que ele mesmo fazia parte de uma, tanto ou mais emocionante do que aquela.
–Continua, Aldo – disse Boris.
–A Haunebu-3 era uma nave arca.
–Nave Arca – disse Kowalsky, tomando sua terceira caneca de chá.
–Sim. Sua jovem tripulação de astronautas de ambos sexos era a Semente do Espaço da Alemanha. Eles e seus mentores talvez tinham esperança de encontrar ajuda extraterrestre para terem alguma possibilidade de sobrevivência fora da Terra e poderem retornar posteriormente para derrotar seus inimigos.
–Como nós, neste momento e lugar – interrompeu Wassermann, pensando na situação atual de Antártica.
–Exato, Karl. Como em nosso caso. Quando chegamos à órbita de Marte na primeira viagem da Antílope; encontramos um pedaço da Haunebu-3; um tanque de água vazio, de aço, girando em torno ao planeta desde 1946. Ainda está lá.
–Deuses...! Eles tiveram dificuldades, então!
–Parece que sim, Tom. O pouco que sei; por documentos que os marcianos me mostraram em Angopak e Darnián; é que depois de decolar, a Haunebu-3 navegou oito meses e meio, alcançando Marte em meados de janeiro de 1946.
–Fascinante! – Kowalsky parecia uma criança ouvindo um conto de fadas.
–A navegação parece que foi quase perfeita e não houve maiores problemas, mas, a Haunebu-3, pousou em Marte com dificuldades; os propulsores esgotados e algumas partes da estrutura danificadas – disse Aldo.
–Caracoles! – disse o Eremita de Io – não sabia disso!
–Marte não parecia ser um planeta desabitado – prosseguiu Aldo, relembrando a mensagem do Doutor Valerión – Desceram numa região onde antigamente tinham vivido os antigos colonos ranianos; duzentos kms ao norte do Vallis Marineris.
–Sim – afirmou Boris – Sei o resto, os Angopakis os acolheram, depois
fizeram amizade com os darnianos e...
–Depois chegaram os milkaros – completou Aldo – a palavra é com Francisco.
O velho serviu-se mais chá. Era evidente que estava amando esse momento, e após beber teatralmente um longo trago, disse:
–Quando estavam bem instalados; quase adaptados e até começando a gostar do local, chegou a nave dos milkaros, que se apresentaram como amigos.
–Mas em que idiomas se comunicaram? – indagou Ives.
–Vocês não conhecem os milkaros – respondeu o Eremita – posso dizer-lhes que são como deuses, possuem aparelhos de tradução simultânea.
–Ah...!
–Após o Primeiro Contato, os milkaros foram informados que os terrestres fugiam de uma guerra perdida e que sem dúvida haveria outros na mesma condição.
–Fascinante – murmurou Marnes – Aí entram vocês, espanhóis e etc.
–Sim. Pru Atol 7751 o chefe dos Milkaros, chegou ao planeta Marte, em
perseguição aos piratas espaciais milkaros, que em sua maioria eram remanescentes de escaramuças com as naves da Suprema Confederação.
–Outra vez a Suprema Confederação... – murmurou Tom Cikutovitch.
–Aproveitando a rivalidade entre esta e o Tri-Estado; outra potência deste setor; os piratas vendiam-se ao melhor pagador, já que o comércio interno de ambas esferas era... Aliás, é muito intenso – disse o Eremita.
–Acho que vamos ouvir falar muito disso... – interveio Marnes.
–Sim, vão – afirmou o velho olhando-o de soslaio – Mas voltando a 1946, aí estavam os terrestres, exilados em Marte por uma guerra perdida.
–Parece um pouco com a nossa história – observou Jacques.
–Tem aquele sabor – acrescenta Ives.
–Bem parecida – concorda Wassermann.
–Sim. Quando os milkaros chegaram, os terrestres já estavam em contato com os nativos. O Líder Pru fez a Proposta ao comandante da Haunebu-3.
–Quê proposta? – perguntou Simon Gart.
–A Proposta! – respondeu o velho teatralmente – Os terrestres pretendiam ficar, mas os milkaros lhes disseram que se ficassem por aí; nesse mundo árido, seco e hostil; provavelmente morreriam.
–Não deixavam de ter razão – concordou Boris.
–Marte não é para principiantes – acrescentou Kowalsky com autoridade.
–Claro – concordou o velho – Daí a Proposta.
–Mas quê proposta? – insistiu Simon Gart.
–Os milkaros propuseram-lhes um trato: se colaborassem com eles no combate aos piratas milkaros, humanos, kholems e diversas outras escorias deste setor que costumavam vir a perturbar as luas; ganhariam um mundo só para eles numa lua de Júpiter. Um local seguro com maiores comodidades do que Marte podia oferecer-lhes, e ainda; os milkaros forneceriam conhecimento, tecnologia e infraestrutura por um tempo razoável até que eles conseguissem se organizar.
–Proposta digna de nota – disse Kowalsky, servindo mais chá para todos.
*******.
Vallis Marineris – 25 de Julho de 1946
–Sem nativos?
A pergunta do comandante da Haunebu-3 foi traduzida prontamente pelo pequeno aparelho que parecia um fone de ouvido.
–Sim. Um local onde nunca terão problemas como os que poderão ter aqui com o tempo – respondeu o capitão Pru Atol 7751, fitando com suas pupilas negras e brilhantes os olhos azuis do terrestre que reluziam através do cristal do capacete.
–Vocês são nativos dessas luas?
–Nossa raça vem de Milkar, um mundo de outra galáxia, que governa um
grande império, mas não esta região. Aqui, apenas eu governo as luas do gigante gasoso, onde tenho cultivos, fábricas de produção de alimentos e mineração. Mas isso não interessa agora. Estou oferecendo uma lua desabitada a vocês.
–Mas assim, de graça? – O terrestre desconfiava, apesar da situação e do momento. Não que sua característica fosse essa, mas tinha suas razões.
O comandante da Haunebu-3 estava surpreso pela inesperada chance oferecida pelo ser alienígena e custava-lhe compreender os motivos desta oferta. Por fim o ser de Milkar, entendendo as motivações do outro, disse:
–Terão um lar em troca de protegerem o sistema das luas dos ataques dos nossos inimigos, os piratas, alguns dos quais são da nossa própria raça...
–Mas com a Haunebu-3? – perguntou o terrestre olhando de soslaio à sua valente nave; que atravessara o cosmos carregada de esperança.
–Forneceremos algumas naves de cabotagem e toda a infraestrutura que for necessária, para que vocês possam construir quantas naves queiram, dos tipos e tamanhos que desejarem.
–Somos poucos. Apesar de que nossas mulheres estão grávidas, isso levará muito tempo. Se tivéssemos ajuda dos nossos camaradas que ficaram na Terra...
–E quê sugere?
–Trazê-los aqui. Seria possível isso? Sua nave é grande como uma cidade...
*******.
–Chegou-se a um acordo – disse o Eremita de Io – os milkaros fariam uma expedição à Terra para resgatar quantos pudessem, na sua enorme nave.
–Fantástico! – exclamou Ivan Kowalsky.
–A viagem à Terra com alguns líderes terrestres; foi de horas.
–E o mundo não ficou sabendo disso...! – exclamou Jacques.
–Os milkaros ligaram a camuflagem e desceram com naves de cabotagem.
–Claro, claro, que estupidez a minha! Desculpe, Monsieur.
–E ao chegar? – perguntou Kowalsky.
–Isso foi triste, amigos. O amargo espetáculo de sua Pátria destruída, derrotada e humilhada os abalou – disse o Eremita, e acrescentou:
–Estava bem diferente após mais de um ano de ausência. O frio, a fome e as doenças tinham exterminado mais da metade da população... Isso sem contar com as atrocidades dos vencedores prepotentes contra o povo indefeso; os bárbaros depredavam escolas, monumentos, hospitais, museus, teatros; estupravam mulheres e crianças inocentes; matavam pessoas a esmo; espancavam velhos, torturavam e degolavam meninos; destruíam a pouca comida; ocupavam residências e chutavam os moradores para as ruas cobertas de neve naquele inverno terrível de 1945-46.
–Mon Dieu!
–Sim, amigo Jacques. Foram contatados ex-líderes na clandestinidade; não só de Alemanha, mas também de Espanha, Portugal, Grécia, Turquia, Finlândia e Escandinávia, gente que pensava diferente dos vencedores da guerra.
–Como você.
–Sim, capitão. Como meus pais e eu. Foi por isso que embarquei com meus pais na nave do capitão milkaro Pru Atol 7751.
–E aqui está.
–Estou sim, capitão. Os terrestres foram repartidos pelos milkaros nas luas de Júpiter, e nos Asteroides Troianos.
–Troianos – disse Boris – dois grandes grupos de asteroides que triangulam a órbita de Júpiter.
–Si, comandante – concordou o Eremita – Nos Anteriores estão os italianos e portugueses, e nos Posteriores moram os finlandeses, turcos e escandinavos.
–Isto está povoado demais! – exclamou Ives – nas nossas barbas desde 1946...!
–Há muitas coisas que vocês não sabem – afirmou o velho Eremita de Io.
–E os Alemães? – perguntou Wassermann.
–Estão na lua Europa. Aqui em Io, estamos só parte dos espanhóis. A maioria preferiu Calisto, base das fábricas milkaras e dos milkaros independentes, que são os donos destas luas, menos Europa, que pertence aos Hiperbóreos.
–Hiperbóreos – murmurou Wassermann interessado.
–Sim. Ao chegar; os alemães fundaram sua primeira colônia denominada
Germânia III, que ainda existe, depois, segundo me consta, no ano 43 do calendário deles, terminaram de construir uma bonita capital que denominaram Hiperbórea.
–Nome sugestivo – murmurou Wassermann – Você a conhece?
–Só quando estava em construção. Há um monumento a Pru Atol 7751.
–Eles habitam apenas a lua Europa? – perguntou Ives.
–Não. Em Ganímedes há uma colônia de hiperbóreos de Europa e outra bem pequena de gregos, junto aos milkaros e donarrianos.
–Donarrianos?
–Sim, capitão Aldo. São seres centauróides...
–Sei, entrei em contato com eles quando estive em Ganímedes.
–Não são nativos daqui, senão de Donarr, um planeta da esfera milkara.
–Também sabia disso.
–E o que fazem atualmente os alemães...? Digo; hiperbóreos? – perguntou Wassermann – Imagino que devem ser bem poderosos...
–São a maior defesa contra os piratas milkaros vindos de fora do sistema e alguns que estão enquistados em Amaltea, como por exemplo, alguns renegados terrestres, diversos renegados confederados, e alguns kholems...
–Também está aqui essa praga? – Aldo ficou possesso.
–Vejo que os conhece.
–Demais. E você disse que os alemães os enfrentam?
–Sim. Mas nós chamamos de Hiperbóreos aos alemães. Apenas os muito velhos; nascidos na Alemanha, é que ainda merecem a denominação de alemães...
–E aquela nave em forma de disco que atacou minha nave?
–Deve ser sem dúvida uma nave pirata...
–Agora pirateiam no inferno – afirmou Tom.
–Vocês podem derrotá-los, ao que vejo. Como os hiperbóreos...
–Mas por quê nos atacaram, se nem sabiam quem somos? – perguntou Aldo.
–Confundiram-nos com hiperbóreos. Qual a aparência da sua nave?
–Aparência de foguete.
–Como as naves de cabotagem dos hiperbóreos e troianos. Também têm
aviões de caça. Fabricam-nos em Europa e Calisto e vendem-nos aos colonos e descendentes que moram nas luas e nos asteroides troianos. A principal tecnologia destas luas é deles. O resto é importado de Milkar ou da Suprema Confederação.
–Mas você fala como se tivesse viajado por todas estas luas...
–Sim, capitão. Percorri as luas e o sistema trabalhando para os senhores de Calisto. Quando parei, premiaram-me com esta fazenda de legumes e frutas de silício e carbono para abastecer Calisto e trocar o excedente. Comerciamos uns com outros.
–E quais são os objetos de troca? – quis saber Ives.
–Apenas o trivial; água, oxigênio, mantimentos, comida, combustível, armas, munição, veículos, material de construção de moradias, veículos aéreos...
–Deve ser bom morar nestas luas... – murmurou Aldo.
–Vivemos em paz entre nós. Apesar de termos a praga dos piratas, que atacam e roubam de tanto em tanto. Mas os milkaros afirmam que antes era pior. Eles não sabiam como proceder porque são pacifistas desde a última guerra entre ranianos e alakranos, e também parece que seu império, lá longe, está meio decadente...
–Por isso os milkaros trouxeram vocês...
–Sim, capitão. Os hiperbóreos têm feito um bom trabalho, nesses anos todos. Os piratas os odeiam e já não se atrevem a atacar Europa, como no início...
–Essas potências galácticas; a Suprema Confederação, o Império Milkaro, e outros... Não aparecem por aqui às vezes para fazer uma demonstração de força?
–Boa pergunta, comandante Boris.
–Sim, eu sei que é boa.
–Este sistema é uma espécie de reserva, como eu já disse, e por isso este setor, uma pequena parte da esfera confederada, é considerado um local histórico e quase tabu. Foi aqui o berço do grande Império Raniano, do qual somos descendentes...
–Soubemos algo disso em Marte – disse Aldo.
–A Júpiter as potências não se aproximam. Todos têm raízes neste sistema.
–Entendo – disse Aldo lembrando os ensinamentos do eminente Sinh-Praa, na cidade subterrânea de Angopak em Marte.
–As naves de guerra da Suprema Confederação ocasionalmente aparecem por aqui, para monitorar o sistema em previsão de incursões de potências não amigas, mas nunca chegam aquém de Plutão, onde os esperamos com mercadoria. Antes que me pergunte direi que é oxigênio, água, alimentos, minério, e objetos diversos, que eles trocam por coisas que necessitamos, como armamento, veículos e equipamentos, que eles não mais usam e antes de jogar fora, descarregam em Plutão.
–E como vocês vão a Plutão? – perguntou Aldo.
–Há uma nave milkara de carga, que faz a linha periodicamente.
–Então, além de Plutão há um tráfego dos infernos? – perguntou Boris.
–Bem... Sim. Como eu já disse, isto aqui foi o berço da civilização raniana, humana, como a conhecemos. A raça humana branca não se originou na Terra, senão em Aldebaran, de onde veio para Ran, um planeta grande e frio, longe do Sol.
–Tem sentido – concordou Aldo – o Sol na Terra produz câncer, escurece a pele e o cabelo, provoca cataratas em pessoas de olhos claros...
–E o excesso de oxigênio encurta a vida, capitão Aldo – disse o Eremita – em Ran não havia tanto oxigênio como vocês têm lá, na Terra. O sangue raniano era azul, como hoje é o meu sangue e o dos hiperbóreos... Por isso bebemos este chá.
–Claro, com menos oxigênio, o sangue fica azul – disse Wassermann, cada vez mais interessado.
–E Milkar? – perguntou Aldo.
–Milkar Prime; planeta da alucinante Andrômeda, um império maior e mais antigo do que Ran. São como deuses – disse o velho – eles são os donos destas luas.
–Fale dos inimigos de Ran – disse Ives.
–Ah, Alakros... – O velho eremita fez uma longa e teatral pausa antes de prosseguir, bebendo um gole de chá. Por fim disse:
–Era um império bárbaro de seres de carbono, porém incompatíveis conosco, caçadores, guerreiros, fortes e corajosos, prezavam honra e valor. Sua esfera tinha ou ainda tem, segundo lendas; 50.000 anos luz de diâmetro, e sua fronteira mais próxima a nós, era ou ainda é, Antares Escorpião, sol com sete planetas colonizados, apenas a 159 parsecs e meio daqui. Quando Ran caiu, Alakros perdeu milhões de naves, e Milkar, que na época ainda era um povo conquistador e guerreiro, uniu-se aos ranianos remanescentes e empurraram os bárbaros de volta a suas fronteiras.
–Deuses! – exclamou Aldo.
–Sim, deuses. Foram batalhas terríveis, batalhas entre deuses. Não podemos nem imaginá-las sequer, capitão. Os milkaros e as legiões ranianas usaram armas que destruíam planetas, sóis, sistemas estelares completos... Mas se bem conseguiram retirar do espaço aos alakranos, pagaram um preço alto demais. Todos eles.
–Como assim?
–Sitiaram o próprio planeta Alakros, mas não conseguiram destruí-lo. Alakros destruiu os sitiadores, apesar do seu poder. Então estourou a revolução em milhares de colônias, e isso ocorreu em ambos lados. Alakros perdeu sua influência neste quadrante. Quando as colônias ranianas souberam da destruição do planeta Ran e da caída do império, revoltaram-se e se independizaram, após algumas guerras. Aí foi que se criaram os novos impérios.
–Tem sentido.
–A frota alakrana foi destruída, assim como a frota milkara. Passaram séculos, mas também as legiões ranianas que perambulavam sem planeta, num momento determinado pararam e ocuparam alguns planetas da esfera original e estabeleceram-se como mundos novos... Ran já não existia, nem como mundo nem como império...
–Era muito grande a esfera raniana? – perguntou Aldo.
–Oitocentos anos luz de diâmetro... Apenas uma lasca neste quadrante.
A esfera alakrana no Quadrante Delta era bem maior. E os milkaros ocupavam uma galáxia inteira, era o maior império do universo na época... E acho que ainda é.
–Qual é a situação atual? – perguntou Aldo.
–Bem. Como sabe, nosso vizinho mais próximo e poderoso é a Suprema Confederação, a capital é D’Har-Minh. Gira ao redor de Procyon, Alfa do Cão Menor. Sua esfera é de 30 anos luz de raio. Estamos compreendidos dentro dela.
–Quer dizer que somos tutelados? – perguntou Boris.
–Somos uma reserva dos Grandes Galácticos, uma colônia quase improdutiva, um local, digamos, exótico, selvagem, talvez turístico. Como era África para os europeus dos séculos anteriores...
–Disse que havia vizinhos mais poderosos...
–O mais antigo é o Tri-Estado, capitão, cuja capital é a estrela Betelgeuse Orion com uma esfera de cento e cinqüenta anos luz de raio. Odeiam a Suprema Confederação. Foi formado há mais de cinco mil anos por ranianos e outras raças clientes, como os Greennes e os Kholems.
–Outra vez essa praga!
–Os Xawareks dominam seu sistema; Sírio, do Cão Major; 8,4 anos luz daqui; dentro da esfera da Suprema Confederação; e mais algumas estrelas próximas.
–Xawarek... – disse Aldo – Onde ouvi antes essa palavra?
–São independentes – disse o velho a despeito da interrupção – 10.400 anos atrás foram raça-cliente de Alakros. Como eles, guerreiros e caçadores, prezam a honra e o valor em combate... Mas ainda assim não gosto deles.
–A quarta potência galáctica – disse o velho, após beber outro gole da bebida quente – é um conglomerado de raças cujo centro é Castor Gemini, sol sêxtuplo, com uma esfera de quarenta anos luz. Chamam-se Império Éden. A quinta potência; com trinta anos luz de esfera é o Império Zigueliano, cujo centro é a estrela Capella Alfa Auriga. Sua capital é um planeta chamado Ziguel, duas vezes maior do que a Terra. O sexto é o mais poderoso e neutro de todos: a Separação Ayar. Estão por todos lados, são demasiado alienígenas para termos coisas em comum com eles.
–De quê tipo?
–Respiradores de hidrogênio. Vão ocupando gigantes gasosos; tipo Júpiter ou Saturno, único meio onde podem sobreviver, já que não são de carbono como nós, e nem de silício como os milkaros. Sua capital é Ayar Prime, na estrela Tau Ceti, bem perto daqui. Eles existiam bem antes dos ranianos aparecerem no universo.
–Relativamente perto – concordou Aldo – 11,8 anos luz.
–Sim. Por último, a estrela Aldebaran Alfa Taurus; a 65 anos luz. A capital é Nirvana Prime, berço dos ariones ou ranianos puros, o império chama-se Asgarth.
–Sete impérios galácticos bem nas nossas barbas! – exclamou Ives.
–Mesma coisa diria um índio americano, quando ficaram sabendo da existência dos países europeus, senhores... – disse o Eremita de Io.
–Está boa a conversa e sua hospitalidade – disse Aldo – mas devemos voltar.
–É cedo – o velho queria que ficassem mais. Devia ser terrível morar sozinho.
–Sei disso, Don Francisco, mas precisamos dormir. Você devia nos visitar.
–Posso? – seus olhos claros iluminaram-se de repente – Você é muito gentil capitão. Irei, assim que terminar a colheita... Faltam quatro ciclos... Ou serão cinco?
–Sua forma de medir o tempo é bem confusa, Francisco.
–Claro, como eu já disse antes, me perco nas contas...
O velho ficou em silêncio, em seguida seu rosto iluminou-se:
–Isso me lembra uma cosa, capitão... Quê dia é hoje na Terra?
–Hoje? – Aldo consultou seu relógio – 18 de março, já amanhecendo...
–Mas que desastre! – exclamou o velho – realmente me perdi nas contas, eu tinha certeza que hoje devia ser entre 20 e 25 de dezembro, talvez Natal...
–Suas contas são um desastre – disse Boris.
–Sim, mas no ano não errei, não?
–Você não disse o ano. Em que ano você pensa que está?
–Em 1997... Ou não?
Fez-se um silêncio opressivo.
–Errei por muito? – perguntou o velho timidamente.
–Hoje é 18 de março de 2014.
O rosto do velho ficou tão branco como as paredes do seu alojamento.
–Não sei o quê usa para medir o tempo – disse Boris – mas está estragado.
–Errou por 17 anos – disse Marnes.
–Devia prestar atenção ao meu filho. Sempre diz para ouvir o rádio da Terra...
–E você pode fazer isso?
–Claro que posso; capitão! Tenho um trambolho milkaro no outro quarto, com o qual posso escutar as luas e poderia ouvir a Terra...
–E por quê não o faz? – perguntou Aldo escandalizado.
–Não posso perder tempo ouvindo rádio. Nas folgas do trabalho durmo ou leio livros... Mas conte-me como está a Terra – disse o Eremita muito contrariado.
–Está uma droga – disse Ives laconicamente.
–Você está melhor e mais feliz aqui, nesta lua solitária – acrescentou Jacques.
O Eremita silenciou um instante. Então disse com tristeza:
–O pior de tudo isto, amigos, é que se estamos em 2014, já se passaram 68 anos desde que saí da Terra...
–É isso aí – concordou Wassermann.
Os olhos do Eremita abriram-se quase até saírem das suas órbitas:
–Então eu devo ter 84 anos!... – exclamou.
Ele olhou-se as rugas nas viseiras dos capacetes pendurados:
–Já sou um velho, um maldito velho!...
E seu pesar era sincero quando exclamou:
–Quê droga...!
*******. Continua em: A FÊNIX.
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O conto O EREMITA forma parte integrante da saga inédita Mundos
Paralelos ® – Fase I - Volume II, Capítulo 15, Páginas 94 a 105, e seu inicio pode ser encontrado no Blog
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