Os últimos dias da Terra
Dover, Inglaterra, 16 horas e 42 minutos. O homem magro caminhou lentamente até a varanda, com passos cansados e vacilantes, e começou a observar a rua lá embaixo. Lixo espalhado por toda parte. Veículos abandonados. Animais circulando entre as casas. Enquanto uma lágrima rolava por sua face pálida, ele passou a recordar-se de como tudo havia começado.
Dois anos antes. Litoral da Iugoslávia, 22 horas e 13 minutos. Um grupo de turistas conversava animadamente. Alguns observavam as estrelas, quando perceberam um estranho brilho esverdeado no céu. Naquele momento, nenhum deles poderia prever as imensas consequências daquele fenômeno.
Quatro dias depois. Montreal, Canadá, 13 horas e 26 minutos. Num dia claro e sem nuvens, uma misteriosa tempestade, cheia de raios muito brilhantes começou de repente, durando apenas alguns minutos. Nos dias seguintes tempestades idênticas ocorreram em todas as partes do mundo, causando nas pessoas efeitos incomuns. Todos de repente se tornavam mais irritados e sensíveis. Então o caos começou. Sem nenhuma causa aparente, um mal devastador foi se abatendo sobre a Humanidade. Uma estranha depressão, um sentimento profundo de apatia e perda da vontade de viver começou a se apoderar de todos, produzindo um desastre de proporções jamais vistas, a princípio lentamente, depois num ritmo cada vez mais rápido. Indivíduos se suicidavam em suas casas e locais de trabalho. Motoristas lançavam seus veículos contra outros veículos e edifícios. Pilotos atiravam seus aviões contra os prédios. Outros simplesmente permaneciam em suas residências num estado de total letargia, até que a fome e a exaustão os consumisse completamente. E assim a sociedade começou a se desintegrar. O comércio entrou em colapso. As instituições começaram a desmoronar. As relações internacionais cessaram. Os grupos humanos foram ficando cada vez mais isolados. As viagens acabaram. O fluxo de idéias parou. Por todo o Planeta, quase não se viam mais pessoas nas ruas, pois todos estavam confinados no interior das construções. Os campos e cidades se tornaram desertos. Os serviços essenciais que ainda funcionavam, como saúde, distribuição de comida e energia desapareceram por completo. Reatores nucleares explodiam. Incêndios se espalhavam por grandes áreas.
Algumas organizações militares e governamentais, assim como a comunidade científica tentaram em vão encontrar uma solução. Ninguém foi poupado por aquele mal inexplicável. No princípio alguns indivíduos pareciam ser imunes, mas depois acabavam se entregando ao ímpeto de autodestruição.
Suicídios em massa agora eram cada vez mais comuns, começando com alguns grupos isolados e depois alcançando cidades e países inteiros. Nas mentes dos poucos que ainda guardavam algum grau de lucidez, uma certeza se tornava mais e mais nítida: a Humanidade entrara num caminho irreversível de aniquilação total. E dentro de alguns meses não sobraria mais ninguém...
Dover, 17 horas e 24 minutos. O homem magro, corroído em seu corpo e em sua alma pela exaustão e pela sensação de vazio contra a qual tentara lutar nas últimas semanas finalmente decidiu pôr um fim à sua dor, atirando-se da varanda.
O último homem da Terra acabara de pular para a morte.
Cidade do México, 6 horas e 37 minutos. Maria Huerta acordou agitada sob o efeito do estranho pesadelo que tivera. Levantou-se depressa e caminhou até a janela para observar o movimento que começava nas ruas, sentindo a necessidade de saber que o mundo ainda existia. Respirando aliviada, pensou consigo mesma que tudo felizmente não passara de um sonho ruim.
Mas seria apenas um sonho, ou uma premonição do que estaria por vir ?