Malditos humanitários
Todos ainda se lembram da comoção mundial quando eles chegaram. Três extraterrestres vindos não se sabe de onde, não se sabe por que e não se sabe como.
Apenas chegaram. Dois machos e uma femea. Galácticos, como o mundo os chamou.
Tudo que eles queriam era um lugar isolado. No Tibet. Até hoje ninguém ainda sabe porque quiseram o Monte Kailash. O local é considerado sagrado para os hindus que acreditam ser aí a morada da deusa Xiva.
O mundo uniu-se para convencer o Tibet a ceder a montanha sagrada. Houveram inúmeras compensações de ordem econômica, política e tudo mais que foi exigido pelo Tibet a ONU aceitou sem protestar. A dádiva que seria doada pelos galácticos dispensava questionamento. A cura de todas as doenças. E assim ocorreu.
A humanidade monitorou por satélite sua instalação na montanha e viu surgirem apenas duas construções humildes, uma no topo e outra no sopé. Não tinham mais de cem metros quadrados a do topo e da base apenas quarenta. A comunicação era sempre feita, quando os galácticos assim o permitiam, na casa da base. A casa era rústica, extremamente simples, quem entrava imaginava estar numa casa tibetana. Quando algum mensageiro da ONU lá chegava, esperava algumas horas na ante sala, e como por mágica um dos galácticos saia do quarto anteriormente vazio, pra recebe-lo. A hipótese mais razoável é que podiam se tele transportar por grandes distâncias. Eles solicitaram que não houvessem visitas de populares e a ONU, de acordo, montou um cerco a montanha.
Claro que sempre houveram os xenófobos e os arautos do apocalipse. Reacionários, contra qualquer mudança, que diante dos benefícios conquistados, eram classificados como maníacos alienados.
Até surgir o primeiro problema. Com a queda abrupta da mortalidade, em apenas dez anos começou a escassez de alimentos. Vinte bilhões de bocas para alimentar com a mesma produção agrícola. Os países mais pobres da África e Ásia foram os primeiros a terem mortes por inanição. Quando a fome e a escassez de alimentos atingiu a Europa e América do Norte, a situação tornou-se insustentável. Uma comissão da ONU solicitou aos galácticos uma solução e depois de alguns dias, foram entregues a humanidade algumas fórmulas de fertilizantes que possibilitaram o plantio em áreas áridas e de extrema variação de temperatura, tanto quente como fria. Logo todo o deserto do Saara, as estepes russas, o deserto australiano, polo norte e polo sul estavam cultivados. E tudo melhorou.
Até surgir o segundo problema. Com a alimentação e a longevidade, em apenas mais dez anos, a terra atingiu uma superpopulação. Não havia mais espaço para os cem bilhões de almas. E nova comissão da agora OMPU (organização mundial dos países unidos) foi ao monte Kailash. Novamente a solução foi-nos entregue. A exploração do fundo do mar. Cidades e campos de cultivo submarinos foram criados com as instruções dos viajantes do espaço. E tudo melhorou.
Até surgir o terceiro problema, que não era nada mais do que o segundo que retornava. Em mais dez anos, nem o fundo do mar suportava uma população de duzentos bilhões de pessoas. Novamente voltamos aos galácticos. E foi-nos prometido uma solução, porém, mais lenta segundo eles. Em dez anos a população caiu pela metade. Uma virose iniciada na Ásia tornara as mulheres inférteis. Apenas uma a cada dez mil mulheres permaneceu fértil, por ser imune ao novo vírus. A constatação real do fato ocorreu junto com a revolta. Finalmente chegou o tempo dos xenófobos. A desconfiança pelo isolacionismo dos galácticos veio à tona. Era inadmissível a interferência “desses ETs” em nossa civilização. A esterilização em massa foi considerada criminosa. A comoção mundial foi maior do que na época da chegada dos viajantes espaciais. Três meses após o corte de relações da humanidade com os galácticos, a OMPU projetava estudos sobre a contaminação radioativa de uma bomba atômica no Tibet.